Declaração de diretor da base do Flamengo sobre jogadores da África gera críticas; dirigente se retrata e nega discriminação

Uma declaração de Alfredo Almeida, novo diretor da base do Flamengo, vem gerando críticas por parte de torcedores. Em sua coletiva de apresentação, nesta segunda-feira, o português insinuou que jogadores da África têm "valências físicas" como sua principal característica, enquanto atletas da Europa e de outras partes do mundo se destacam pela "parte mental". Em nota ao GLOBO (veja no final da matéria) , ele se retratou, afirmou que a fala foi tirada de contexto e que "não houve a menor intenção de soar discriminatório".

O dirigente foi perguntado sobre uma declaração de José Boto a respeito da formação de jogadores no Brasil, e uma suposta perda de talento em detrimento de tentar copiar o modelo praticado na Europa. Almeida respondeu como via esse processo e deu a declaração:

— Quando Boto passou essa informação, eu assino embaixo. O que o atleta brasileiro tem, provavelmente não há em mais nenhuma parte do mundo. Tem a ver com o dom, a magia, a irreverência, a relação com a bola. Isso não existe em quase nenhuma parte do mundo. Depois, existem outras zonas do globo que têm outras valências — disse Almeida em coletiva.

— Por exemplo, a África tem valências físicas como em quase nenhuma parte do mundo. Na parte mental, temos que ir a outras zonas da Europa e do globo. E há uma realidade do Brasil em que pensaram que o europeu vinha ao Brasil comprar força, atletas altos, grandes, fortões. Se formos a realidade do Brasil, existe regra e exceção. Exceção nós temos o Ronaldo Fenômeno, que tinha tudo. Mas a regra é termos os Neymares da vida. Jogadores franzinos, mas que a bola faz parte do corpo, que descobrem soluções em campo como ninguém — prosseguiu.

Depois, o português, que foi trazido ao Flamengo por Boto, desenvolveu mais sua visão sobre a formação de jogadores no Brasil. Para ele, a magia tem se perdido ao colocar adolescente muito nas academias.

— Os brasileiros passaram a dar ênfase à parte física, a querer jogadores muito fortes, rápidos, pulsantes. A Europa não pede isso do brasileiro. Pede o que não tem lá, essa magia. Muitas vezes, ao trabalhar aos 12, 13, 14 (anos) em uma academia... desculpem a expressão, para mim, é até crime... não só estamos a prejudicar o que ele tem de bom, como estamos a tirar a magia. O mundo mudou mais nos últimos dez anos do que nos últimos 50. Hoje, se um menino de 14 anos tirar uma selfie na frente do espelho, cheio de volume, vai ter muitos seguidores. Esse menino, se não tivesse esse volume, teria mais agilidade, ia para cima dos adversários, com rapidez. Aquele atleta brasileiro que nos habituamos a ver. Deixou-se de fazer isso para transformar meninos, adolescentes, em robôs, nas academia. Isso que o Boto quis explicar. A Europa não vem procurar isso no Brasil, vem procurar talento, magia, irreverência. Não pago ingresso para ir ao estádio ver um fortão e grandão, mas para ver algo diferente. Queremos resgatar isso e podemos ser pioneiros nisso no maior clube no Brasil — concluiu Almeida.

Após a publicação, o GLOBO procurou a assessoria do Flamengo sobre a declaração de Alfredo Almeida que gerou polêmica, e o português se retratou. Segundo ele, tentou fazer uma explanação "sobre os diferentes perfis de atletas ao redor do mundo e as valências que costumam ser observadas por clubes no processo de formação e recrutamento."

"Um trecho específico da minha fala, isolado do contexto geral, acabou gerando interpretações que em nada refletem meu pensamento. Por isso, peço desculpas se a forma como me expressei causou qualquer desconforto. Não houve, em momento algum, a menor intenção de soar discriminatório", afirmou o diretor da base do Flamengo.

Veja o esclarecimento de Alfredo Almeida:

"Durante a entrevista coletiva de minha apresentação como diretor da base do Flamengo, fiz uma explanação mais ampla sobre os diferentes perfis de atletas ao redor do mundo e as valências que costumam ser observadas por clubes no processo de formação e recrutamento.

Um trecho específico da minha fala, isolado do contexto geral, acabou gerando interpretações que em nada refletem meu pensamento. Por isso, peço desculpas se a forma como me expressei causou qualquer desconforto. Não houve, em momento algum, a menor intenção de soar discriminatório.

Tenho total consciência de que há atletas com grande capacidade tática no futebol africano, assim como existem jogadores europeus com enorme talento criativo e brasileiros com impressionante força física. As características dos jogadores não se limitam à sua origem geográfica.

Reforço meu respeito a todas as culturas, povos e escolas do futebol. Sigo comprometido com o trabalho de formação no Flamengo, pautado por valores como inclusão, diversidade, ética e desenvolvimento integral dos nossos atletas."

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Fonte: O Globo
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