Léo Ortiz tem apenas sete meses de Flamengo , mas o curto período já o colocou diante de jornadas festivas, com Maracanã lotado, e também em situações de cobrança em CT e aeroportos. Depois de passagens por Internacional, Sport e Bragantino, não tem dúvidas de que o Rubro-Negro é o maior desafio da carreira. A exigência, garante ele, não o incomoda. Com citação ao tenista Novak Djokovic, afirmou ser um privilegiado.
- É o maior clube da América, então a exigência é total. Além de ganhar, você tem que jogar bem porque a longo prazo não dá certo se você não performa bem. É um clube que a pressão é muito grande, mas a gente até estava conversando esses dias sobre uma frase do Djokovic que é "a pressão é um privilégio" .
- Então é um privilégio estar aqui, e você tem que colocar no mais alto nível para corresponder todo esse amor que se tem quando se vence e quando se conquista um título. E quando as coisas não dão certo a pressão é do tamanho disso - afirmou Ortiz, em entrevista exclusiva ao ge .
Nas graças da torcida desde que começou a jogar pela qualidade técnica e o passe refinado, Ortiz tem uma tatuagem inspirada na música Stronger, do rapper Kayne West, que prega o seguinte: "Faça-nos mais firmes, melhores, mais rápidos e mais fortes. Trabalhe duro, faça melhor".
- Eu peguei esse recorte da música para sempre buscar evoluir e sempre poder fazer melhor, independentemente de você estar num nível acima.
Para crescer dentro do Flamengo , Ortiz sabe que é preciso ser campeão. Até conquistou o Carioca, que hoje tem um peso menor, mas levantou a taça sem jogar - foi contratado antes das semifinais e não saiu do banco nos quatro jogos finais. Por isso, passar pelo Corinthians, adversário deste domingo, na Neo Química Arena, e chegar à decisão da Copa do Brasil é um objetivo do qual não abre mão.
- É mais (se o Flamengo é tudo o que ele esperava), e acredito que possa ser maior ainda. Quando você aqui, você realmente passa a ter a noção do que é ser Flamengo e da grandiosidade do clube. Do dia a dia de você sempre passar por alguém com a camisa do Flamengo em qualquer lugar, seja na rua, no shopping ou na praia. Sempre tem alguém.
- Em todo jogo, onde for, seja no Maracanã lotado, no Norte, no Sul, no Nordeste, no Centro Oeste. Sempre temos muitos fãs e torcedores acompanhando. Acredito que eu vá ter mais noção ainda quando eu levantar um troféu. Vou ter marcado meu nome na história do clube e ter noção da história grandiosa.
Em entrevista com duração de aproximadamente 50 minutos, o zagueiro contou sobre a troca diária que tem com o pai, Ortiz, uma das lendas do futsal brasileiro , revelou quais são seus ídolos, abordou o duelo com o Corinthians. Confira tudo abaixo.
O apelido "camisa 10 da zaga", criado pelo analista Victor Nicolau Falso 9, pegou com os torcedores na internet. Você gosta?
- Acho que não tenho essa propriedade para me colocar como esse camisa 10 da zaga, mas fico muito feliz e levo como elogio à minha características de construir o jogo desde trás. Tento tirar para esse lado e não realmente ser um camisa 10, um Arrascaeta que joga na zaga, porque acho que a qualidade desses caras que usam a camisa 10 e que jogam mais à frente é diferente.
- Fico feliz pelo elogio, acho que é um elogio ao meu jeito de jogar. Sou um cara que gosto de jogar desde trás, saindo controlando a bola, conduzindo, achando passes e lançamentos. Fico muito feliz pelos elogios e pelo carinho da torcida.
Talvez o seu passe que mais lembrou um camisa 10 tenha sido aquele para o Bruno Henrique contra o Botafogo. Apesar da derrota, acredita que foi uma achada especial que só os meias fazem?
- Acho que foi a jogada mais impactante desde que cheguei, principalmente como volante, que era uma posição na qual eu não estava acostumado a jogar. Foi realmente um passe muito bonito, ficou marcado. Infelizmente não foi num jogo tão bom para nós, mas realmente foi um passe diferente que consegui achar. E o Bruno é acostumado a fazer aquele movimento e, com a finalização dele, deixou tudo mais bonito ainda.
- É uma característica que trago de volante, sempre gostei de dar esses passes como zagueiro. Mas acho que como zagueiro os meus passes vão mais para os meias e para algum ponta. Eventualmente vai ser para o 9, mas é mais difícil por ser uma distância mais longa. Como volante, eu estava tendo essa facilidade de não só achar os meias, mas também achar os atacantes.
- Achei contra o Botafogo, contra o Bahia em alguns momentos, contra o Athletico-PR deixei o Lorran duas vezes na frente do goleiro. Ficava mais perto para fazer esse passe para o gol. Como zagueiro é mais fazer uma pré-assistência, achando o camisa 10 e o 8, e eles fazendo esse passe mais terminal. Característica que trago de volante da base, e essa qualidade com a bola que me fez ser esse zagueiro mais construtor
- Talvez nessa época (de criança) eu nem entendesse a dimensão que ele tinha para o futsal, lógico que sabia que ele fazia muitos gols. Profissionalismo, exemplo cuidado e responsabilidade foram coisas que meu pai sempre prezou com a gente desde criança, independentemente do que fosse fazer. Fico muito feliz que eu tenha conseguido seguir. Seguir na profissão é um prazer para mim e para ele.
Léo Ortiz nunca quis ser jogador de futebol de campo
- Na verdade eu sempre relutei muito em mudar para o campo, sempre foi meu objetivo ser jogador de futsal. Por acompanhar meu pai e sempre por gostar muito de jogar futsal. Eu optei porque houve um momento no futsal em que os times de Porto Alegre meio que não disputavam mais campeonatos estaduais e nacionais. Então não tinha mais sentido voltar para uma escolinha com 14 ou 15 anos. E aí surgiu essa possibilidade.
- O André Jardine, que foi meu primeiro treinador na parte competitiva do futsal, trabalhava na base do Inter como treinador do sub-20. Eu era sub-16 ou sub-17, e ele me indicou para eu fazer um teste no campo, falou que eu deveria tentar e que era uma oportunidade única na minha vida. E que depois eu poderia me arrepender de não ter tentado.
- Abriu-se essa possibilidade, encarei, e o primeiro ano é sempre mais difícil. Tem toda a adaptação, eu nunca tinha tido uma experiência de muito tempo no campo, jogava um jogo ou outro com os amigos, mas mais por diversão do que em competição. Conforme o tempo passou, fui evoluindo, entendendo e conseguindo usar também minhas características do futsal no campo.
Esforço para jogar no Flamengo quando o Bragantino dificultava o negócio
- Tem muito do sonho que eu tinha de jogar aqui e também do momento que vivia na carreira. Eu sentia que precisava desse desafio realmente grandioso que está sendo vestir a camisa do Flamengo . Acho que é um pouco tudo disso que me fez ter esse esforço (para se transferir para o Flamengo ), sempre com muito respeito ao Bragantino, que foi o clube que me projetou no cenário nacional. Mas era uma oportunidade única. Alguns anos atrás já tinha surgido essa possibilidade, mas não foi tão clara, foi mais uma sondagem e não se concretizou.
- Anos depois ela bateu de vez de uma forma realmente concreta, e a gente conversou e falou que era o momento. E talvez eu estivesse mais preparado do que alguns anos atrás para eu poder performar.
Fase em que se dividiu entre volante e zagueiro
- Fico feliz por voltar a jogar de zagueiro e por estar jogando como titular na zaga, mas sempre falei que estaria à disposição, independentemente da posição.
- Pude me reinventar mesmo com 28 anos, voltar a jogar numa posição em que comecei na base do Inter, que era volante. E poder performar bem, poder performar em alto nível. Isso me deixou muito feliz de saber que eu posso corresponder à altura nessa posição, mas óbvio que fico mais confortável na minha posição de origem, que é zagueiro.
Início com mais jogos como volante no Flamengo
- Para mim, sempre foi muito tranquilo. No começo, era uma questão de adaptação. Felizmente desde o início consegui corresponder bem, acho que não da maneira que eu queria, mas as pessoas internamente e externamente sempre me elogiaram pela disponibilidade. No começo foi uma questão de necessidade por conta da Copa América e por conta de outros atletas lesionados. Depois acabou sendo opção pelo estilo de jogo que precisava para cada partida.
- Sempre busquei evoluir como volante para que eu me sentisse mais confortável. No começo, estava um pouco desconfortável, achando meu lugar e às vezes não participando tanto quanto eu queria ajudar o clube. Acho que depois eu já estava mais confortável e até sentindo mais feliz e com mais prazer para jogar de volante.
Os conselhos e as raras cornetas do pai
- Desde quando comecei a jogar futsal, quando moleque, meu pai sempre teve uma participação muito grande no dia a dia. De ir ver meus jogos e dar sempre alguma dica no pós-jogo. Isso seguiu na base e até hoje no profissional é assim. Sempre admirei muito, peguei o final da carreira dele, mas pude aprender muitas coisas, principalmente de responsabilidade, exemplo e caráter.
- A gente tem funções distintas de posição no futsal e no campo, mas há coisas de campo que ele pode me passar até por ele ter enfrentado muitos zagueiros e poder falar as dificuldades que ele tinha como atacante. E eu conversar com ele para saber como o atacante pode atacar essas dificuldades.
- Quando era mais novo, ele já falava. Hoje em dia a gente tem uma relação de troca. Ele vem e diz: "O que você pensou nesse lance? Você poderia ter feito de outra forma". E ele tenta também me escutar e ver o meu lado, porque hoje ele sabe que você tem que fazer a escolha muito rapidamente. É uma troca sempre muito boa, a relação é muito boa com ele.
- Normalmente mando meus vídeos que recebo dos pós-jogo para que ele olhe e mande as perguntas que ele tem. É uma troca muito boa e que me ajuda a evoluir até hoje. Hoje ele elogia mais, mas antigamente cornetava mais.
Lição das derrotas e dos jogos ruins
- Eu lido na boa com a corneta. Quando era moleque, eu era mais difícil. Pegava um jogo que a gente vencia, que eu ia bem, e eu perguntava: "E aí como eu fui?". Vinha elogio. Quando perdia, e eu não ia tão bem, às vezes eu voltava no carro e não falava nada. Aí chegou um dia, e ele falou: "Quando perde você não me pergunta". Aí deu uma esfriada na nossa relação pós-jogo.
- Mas depois de um tempo eu pude entender o que ele quis dizer. Nesses momentos de derrotas e em que você não vai tão bem, é um momento que ele pode agregar mais ainda e que me falar coisas que eu posso evoluir. Hoje em dia tem uma corneta aqui ou ali, mas eu lido de boa. A gente sempre sai com coisas para evoluir e numa conversa muito boa.
Como ter a própria trajetória sem estar sempre atrelado ao pai?
- Eu nunca me preocupei muito com isso. Desde que cresci junto com ele, sempre se falava muito nisso especialmente lá no Sul, onde ele tem uma dimensão muito maior. Todo mundo falava: "É o filho do Ortiz". Mas ele sempre falou: "Cara, você vai construir sua história, mas não se preocupe com isso. O que já fiz ficou para trás, já está na história, agora é o teu momento de construir a sua". Sempre vai ser falado que o Léo Ortiz é o filho do Ortiz do futsal, campeão do mundo.
- Mas sempre me preocupei em construir a minha história. Estou construindo de uma forma muito boa, principalmente deixando meu pai orgulhoso, não o Ortiz do futsal, mas o Luiz Fernando (nome do pai) feliz por tudo que venho construindo. E acho que quando ele vem aqui para acompanhar os meus jogos no Maracanã ou onde for, ele sempre sai muito orgulhoso.
- Ele fica muito nervoso ainda, fala que ser pai de zagueiro é muito difícil. Ele consegue acompanhar bem, no cantinho dele, às vezes um pouco mais afastado da família porque minha mãe, minha irmã e minha namorada são muito da emoção, e ele é um cara de sempre acompanhar o jogo na razão e de entender o que está acontecendo.
Ídolos: o pai, Maldini e Kobe Bryant
- No futebol, o principal sempre foi meu pai, óbvio que por acompanhá-lo desde pequeno. Na zaga, eu acompanhava muito o Maldini, sempre foi um cara que gostei muito. Gostava muito de futebol europeu e sempre via os jogos. O Juan (ex- Flamengo ) pude acompanhar de perto no Inter, subi para treinar algumas vezes quando ele estava lá. Tem outros jogadores, como de basquete, que é o Kobe Bryant. Acompanho muito pela mentalidade, já li o livro dele, vi vários vídeos e documentários sobre ele pela ética de trabalho. São caras que pego mais pela mentalidade, os jogadores de futebol pelas característica de jogo e dos jogadores de outros esportes para entender a mentalidade e a ética de trabalho deles para fazer para a minha realidade.
- Curto muitos esportes americanos, sou vidrado. Você acompanha a rotina deles e a ética de trabalho.
Por que você demorou tanto tempo para explodir e atuar com destaque num clube grande somente aos 28 anos, embora muitas pessoas já conhecessem sua qualidade do Bragantino?
- Acho que aconteceram algumas vezes sondagens e possibilidades para sair para outros clubes, mas sempre acreditei muito no processo e numa evolução minha que eu vinha tendo lá, num ambiente que estava sendo muito bom para mim. Era sair no momento certo. E esse momento certo chegou com a possibilidade de vir para o Flamengo . Já tinham acontecido sondagens atrás, mas talvez não fosse o momento certo. Já tinha sido convocado quando jogava no Braga, muitas pessoas já tinham reparado no que eu vinha construindo lá e às vezes até se perguntava por que eu não saía.
- Sempre acreditei no clube (Bragantino) que me deu a oportunidade, e foram poucos clubes que me deram. Saí de um empréstimo para o Sport, e eles apostaram em mim e me desenvolveram para me tornar o jogador que me tornei. E surgiu a oportunidade no momento certo para eu dar esse grande passo na carreira para chegar no Flamengo e chegar bem.
Apesar de ter jogado numa equipe que não é do mesmo escalão do Flamengo , você conseguiu chegar à seleção brasileira. Mantém esse sonho agora dentro do Rubro-Negro?
- Sobre Seleção, óbvio que quando começa um novo ciclo você sempre cria expectativas, mas esse foi meu primeiro ano de Flamengo num ambiente de adaptação, felizmente conseguindo performar bem. Meu foco é sempre no clube. A convocação é um prêmio no que você faz nos jogos pelo seu clube. Meu foco é sempre aqui e, se existir oportunidade no futuro, vai ser muito gratificante voltar a jogar e performar pela seleção brasileira.
- Estou muito feliz e muito realizado com o que vem acontecendo. É de uma importância conquistar um título, para isso que vim. Desde que cheguei foi o principal motivo que me fez vir para cá. Fico muito feliz por estar crescendo muito aqui dentro e por minha adaptação rápida a um clube desse tamanho. A adaptação veio de saber o momento de as coisas acontecerem. Estou muito feliz com o ambiente, me dou bem com todo mundo e realmente estou me divertindo muito de fazer parte desse clube tão grande.
Decidir a vaga contra o Corinthians fora de casa é mais difícil?
- Jogo muito difícil, jogo muito grande e um jogo em que, se você não entra no seu máximo, ele pode virar para o outro lado. Acredito que a gente tem que imprimir o mesmo ritmo que imprimiu em casa. Sabemos que eles vão vir para cima quando jogam em casa, assim como é a característica do Flamengo no Maracanã.
- Infelizmente a gente não conseguiu uma vantagem maior que poderia dar uma tranquilidade para esse jogo de volta, mas ainda assim é uma vantagem. Eles vão ter buscar o gol, e a gente não pode ir para lá e não jogar. Temos que buscar o jogo e os gols porque que aí as coisas vão virar para o nosso lado, e a gente vai tentar buscar essa classificação sempre num lugar muito difícil de se jogar.
Assista: tudo sobre o Flamengo no ge, na Globo e no sportv