O que vale mais: a decisão da Justiça Desportiva de não adiar a partida entre Flamengo e Palmeiras ou a decisão da Justiça do Trabalho de adiar o confronto? Se o jogo é em São Paulo, o TRT do Rio de Janeiro tem competência para adiar a partida? Como funciona o plantão judiciário? A quem a CBF pode recorrer para tentar cassar a decisão que adiou a partida? O ge responde essas e outras questões na visão de advogados especialistas em direito esportivo.
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Allianz Parque, palco do duelo entre Palmeiras e Flamengo, caso o jogo seja mantido — Foto: Marcos Ribolli
Antes, um resumo da situação: o jogo entre Palmeiras e Flamengo, marcado para as 16h deste domingo, foi suspenso devido a uma liminar concedida pelo Tribunal de Trabalho do Rio de Janeiro, que acatou uma ação impetrada pelo Sindeclubes, sindicato que representa funcionários de clubes do Rio, alegando "risco elevado de contágio" de coronavírus. A CBF tenta recorrer da decisão.
Em paralelo a isso, o STJD negou o pedido do Flamengo para adiar a partida. Na noite de sábado, o órgão voltou a se posicionar após o clube solicitar revisão da decisão, e manteve a postura de que deve haver jogo.
Confira as principais questões:
Qual decisão vale mais para realização do jogo, a do TRT ou a do STJD?
Embora não haja uma definição clara, o entendimento é de que a decisão do Tribunal Regional do Trabalho se sobrepõe.
- Teoricamente, no papel, a Justiça do Trabalho vale mais porque é um órgão de verdade do poder Judiciário, está prevista na Constituição. A Justiça Desportiva é uma justiça administrativa que cuida de questões de organização, competição e disciplina esportiva. Não vale para nada que não seja competição desportiva. Só vale para competição esportiva do futebol. Se tiver uma decisão da Justiça do Trabalho falando para não ter jogo, a ordem judicial é para cumprir, se não cumprir sofre algumas punições - explicou o advogado Luiz Roberto Martins Castro.
- A primeira questão a analisar é se o Sindeclubes tem legitimidade para propor uma ação desta natureza. Eu diria que é bastante discutível, no mínimo. Agora, na medida que existe uma decisão judicial, ela se sobrepõe às decisões esportivas - opinou o advogado Eduardo Carlezzo.
O TRT do Rio de Janeiro tem competência para suspender a partida em São Paulo?
- Como regra geral o foro competente é o foro do réu, portanto, em princípio, faz sentido a proposição da ação no Rio - explicou Carlezzo.
É possível que esta decisão seja derrubada?
A CBF vai recorrer da decisão. O caminho ainda é pelo Tribunal Regional do Trabalho. Em caso de mantida a liminar, a entidade pode recorrer ao Tribunal Superior do Trabalho.
- Esta sequência é obrigatória pelo código de processo. Se errar a sequência, pode-se ter a maior razão do mundo, mas o processo não anda - avaliou Luiz Roberto Martins Castro.
Há uma discussão no meio jurídico sobre qual TRT deveria apreciar o tema: o de São Paulo, palco do jogo, ou o do Rio, mas a tendência é que o processo se desenrole em solo carioca.
Como funciona o plantão judiciário?
Em tempos de Covid-19, o pessoal disponível nos fóruns é ainda mais reduzido. Em tese, o plantão só deve ser usado para analisar casos de extrema urgência. Um juiz continua à disposição em sua casa para as decisões, mas os funcionários precisam ir ao fórum para dar andamento ao processo.
O Flamengo pode ser punido pelo STJD se não entrar em campo?
O artigo 231 do Código Brasileiro de Justiça Desportiva diz o seguinte:
"Pleitear, antes de esgotadas todas as instâncias da Justiça Desportiva, matéria referente à disciplina e competições perante o Poder Judiciário, ou beneficiar-se de medidas obtidas pelos mesmos meios por terceiro. PENA: exclusão do campeonato ou torneio que estiver disputando e multa de R$ 100,00 (cem reais) a R$ 100.000,00 (cem mil reais)."
Mas a discussão é grande. O Sindeclubes, responsável pela ação, é presidido por José Pinheiro dos Santos, funcionário da segurança do Flamengo. Segundo ele, o movimento partiu de um pedido dos próprios funcionários do clube. O Flamengo é, inclusive, réu, na ação, e pode alegar isso para rechaçar a acusação de ter se beneficiado de medidas obtidas por terceiros.
Ainda assim, a tendência é de que o caso seja investigado pelo STJD.
- Se descobrirem que o Flamengo está por trás direta ou indiretamente, o Flamengo pode ser punido na Justiça Desportiva, inclusive por suspensão. Pode ser instaurado um inquérito na Justiça Desportiva para avaliar a ligação entre esse presidente do sindicato, tentar verificar se houve alguma conversa prévia tentando estimular o sindicato a entrar. Se isso ficar provado, o Flamengo pode ser punido - analisou Luiz Roberto Martins Castro.
E o Palmeiras, o que deve fazer?
O clube paulista já se manifestou favorável à realização da partida. Entretanto, como não é parte da ação movida pelo Sindeclubes, a expectativa é de que proceda normalmente, como se houvesse jogo.
- O Palmeiras precisa ir para o estádio, a não ser que a CBF comunique formalmente que o jogo está adiado. O Palmeiras não é parte da ação, precisa ser comunicado oficialmente pela Justiça do Trabalho ou pelo Flamengo ou pela CBF - disse o advogado Luiz Roberto Martins Castro.
Se a liminar cair, e o Flamengo não entrar em campo, o que acontece?
Caso a CBF consiga um mandado de segurança para garantir a realização da partida, o Flamengo precisa jogar. Se não entrar em campo, é punido com WO e será julgado no STJD, que pode aplicar punições como multa, perda de pontos e, em último caso, suspensão.
Se a decisão for mantida e houver jogo, o que acontece?
Caso a CBF e o Flamengo, réus no processo do Sindeclubes, descumpram a ordem do TRT, está estabelecida uma multa de R$ 2 milhões a ser paga, destinada ao combate à Covid-19. Em tese, CBF e Flamengo teriam de dividir o pagamento do valor.