Torcedor e conhecedor da história do Flamengo , Filipe Luís manteve o compromisso com o DNA do clube de não abdicar da busca pelo gol adversário do início ao fim. Na vitória por 2 a 0 sobre o Bahia, o Rubro-Negro voltou a mostrar um problema de falta de efetividade, o que o fez correr riscos de ser vazado aos 48 minutos do segundo tempo, por exemplo. Mas volta de Salvador repleto de sinais positivos de que o trabalho do treinador de 39 anos é muito promissor.
Na entrevista coletiva, Filipe definiu o "DNA Flamengo " como "um jogo muito perigoso, é um jogo muito vertical, de pressão" e que requer riscos. Disse ele, aliás, que aceita se arriscar para ser protagonista do jogo por entender que tem condições para isso. Prometeu e cumpriu.
Com encaixes individuais e marcando o Bahia em seu campo de defesa, o Flamengo começou "pressionante", do jeito que Filipe queria. Com cinco minutos, Gabigol perdeu chance incrível após grande passe de Gerson, maestro do time e figura maior do jogo.
A pressão lá em cima continuou surtindo efeito. É verdade que o Flamengo esbarrava em algumas tomadas de decisão erradas, mas é fato também que assustava o Bahia, um time acostumado a ter a bola e que mandou no meio-campo na maioria dos outros três jogos realizados contra os cariocas em 2024. O maior reflexo de quanto o rival a mudança de característica do Fla sentiu foi uma bola em que o goleiro Marcos Felipe, atordoado dentro de sua pequena área, coloca para escanteio, tamanho o abafa que sofria àquela altura.
Pela primeira vez na temporada, o Rubro-Negro dominou o time de Rogério Ceni, tanto territorialmente quanto em criação de chances .
E o primeiro gol reflete bem o que Filipe quer de sua equipe (veja no vídeo abaixo) . Quando Arrascaeta cobra a falta que ele mesmo sofrera próximo ao círculo central - agarrado por Caio Alexandre -, aos 34 minutos e oito segundos de jogo, os zagueiros Léo Pereira e Léo Ortiz e o volante Erick Pulgar atravessam a linha do meio-campo. Nesse momento, os 10 jogadores de linha do Flamengo estão no campo de defesa do Bahia.
Léo Pereira, em vez de optar pelo passe curto em De la Cruz ou Pulgar, decide abrir o campo, invertendo a bola para Ortiz, que estava do outro lado. O camisa 3 estica na ponta para Wesley com um lindo passe de trivela e quebra as linhas. O lateral perde a posse parcialmente, mas a recupera e devolve a Ortiz.
O zagueiro aciona Arrascaeta, que, livre na ponta direita, abre o espaço para Wesley invadir a defesa adversária pela ponta direita. É aí que o Flamengo faz o que Filipe queria: atacar a área com pelo menos três jogadores. Na jogada em questão, eram quatro: Wesley, que cruza a bola; Gabigol, Bruno Henrique, que finaliza, e Ayrton Lucas, que pega o rebote e empurra para a rede.
Futebol total: dos 11 de linha, entre 34min8s, momento em que Arrasca bate a falta para Pulgar, e os 34min41s, quando Ayrton marca o gol, Gabigol foi o único a não tocar na bola. Apesar disso, o ataque de Gabriel Barbosa ao espaço abriu brecha para BH surgir limpo para chutar e o lateral-esquerdo surgir livre para concluir com sucesso a ótima trama ofensiva.
O Bahia teve uma chance solitária no primeiro tempo, com Thaciano, que desperdiçou na pequena área, mas o Flamengo teve supremacia nos 45 minutos iniciais contra um time que preza pelo predomínio territorial e se destaca pelo gosto pela bola.
O Flamengo repetiu contra o Bahia a falta de efetividade demonstrada contra Corinthians e Vasco, mas esteve longe do arame liso que irritou a torcida especialmente nos jogos com o Peñarol, ainda sob orientação de Tite.
Sob a batuta de um inspirado maestro Gerson, o Flamengo ocupou o campo de defesa do Bahia (veja abaixo nos mapas disponibilizados pelo site Footstats) . Ayrton Lucas, Bruno Henrique, Arrascaeta e o próprio Gerson apareceram com perigo por inúmeras vezes. Tabelas apareceram, e as transições ofensivas do Rubro-Negro foram feitas em velocidade. A letargia que dominava o Fla nos últimos jogos sumiu.
Alcaraz, Michael e Plata entraram bem, em especial o argentino, que participou muito bem do combate. Prova maior de que o Flamengo não abdicaria de atacar até o fim foi dada aos 47 minutos. Pulgar, em mais uma ótima jornada, apareceu para pressionar a saída do Bahia lá em cima e roubou bola. Alcaraz aproveitou e, mesmo destro, acertou um chute de esquerda muito bonito e parou em defesa de Marcos Felipe e no travessão.
De tanto querer o segundo gol e não deixar o campo de defesa adversário, aos 48 o time se desconcentrou e, como disse Filipe Luís, correu o tal risco de sofrer o empate. Luciano Juba apareceu sozinho para cabecear, mas perdeu.
Quando o Bahia tentava o último abafa, Gerson, o craque do jogo, chamou para si a responsabilidade de apagar a chama do adversário. Aos 51, recebeu na ponta, cortou para fora e tomou uma pancada. Ganhou tempo.
Aos 52, após pegar uma rebatida, tirou um coelho da cartola. Com um passe de chaleira, venceu a marcação, tabelou com Plata e surgiu na ponta direita para cruzar de três dedos. A jogada foi premiada com o pênalti infantil de Árias, que deu um soco em Michael dentro da área.
Ciente de que o jogo estava finalizado, o capitão teve atitude de líder e, em vez de pegar a bola e bater o pênalti que o consagraria como homem do jogo, entregou-a a Alcaraz, que entrara muito bem e ainda não havia marcado gols pelo Flamengo .
O argentino aceitou a gentileza e agradeceu a Gerson com uma ótima batida.
O Flamengo correu riscos, sim, mas não renunciou à característica que a torcida mais cobra: atacou o tempo todo. De DNA rubro-negro, Filipe Luís cumpriu a expectativa de entender o que muitos treinadores não conseguiram nos últimos anos, em especial nos últimos meses. O 1 a 0 sem riscos, o jogo que prioriza a segurança em detrimento ao ataque não serve para o Flamengo . O Flamengo precisa atacar e pressionar. Sempre.
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