‘A mentalidade de quem está de fora é diferente’

Hugo Souza foi de quarto goleiro para o coração da torcida do Flamengo em pouquíssimo tempo e obviamente não foi por acaso. Aos 22 anos, ele tem no currículo profissional 30 partidas, 17 vitórias, apenas 6 derrotas e passou 9 jogos sem sofrer gols. Números que ajudaram o Flamengo a se tornar campeão Brasileiro em 2020 e fizeram o garoto Hugo figurar na pré-lista do técnico Tite, da seleção brasileira, de convocados para os jogos das Eliminatórias da Copa do Mundo de 2022.

Hugo Souza após cobrança de pênalti de Edenílson - Flamengo x Internacional, Brasileirão — Foto: André Durão
2 de 5 Hugo Souza após cobrança de pênalti de Edenílson - Flamengo x Internacional, Brasileirão — Foto: André Durão

Hugo Souza após cobrança de pênalti de Edenílson - Flamengo x Internacional, Brasileirão — Foto: André Durão

A relação de Hugo e Flamengo já dura quase 12 anos. É um dos jogadores da base mais antigos. A oportunidade para brilhar no profissional aconteceu no momento em que 19 jogadores do elenco principal do Flamengo foram infectados pela Covid-19. Na 12° rodada do Brasileirão, um time repleto de meninos da base encarava o Palmeiras com praticamente força máxima. O Flamengo não venceu, acabou 1 a 1 graças ao Hugo, que defendeu tanto ao ponto de ser eleito o melhor em campo. A atuação rendeu mais chances e ele foi coroado no fim da temporada como titular do time campeão brasileiro.

Hugo Souza em ação durante  Palmeiras x Flamengo, pela 12ª rodada do Brasileirão — Foto: Anderson Lira/Agência Estado
3 de 5 Hugo Souza em ação durante Palmeiras x Flamengo, pela 12ª rodada do Brasileirão — Foto: Anderson Lira/Agência Estado

Hugo Souza em ação durante Palmeiras x Flamengo, pela 12ª rodada do Brasileirão — Foto: Anderson Lira/Agência Estado

Mas, ao jogar em um clube de massa, a trajetória dele tem sido um misto de elogios e críticas em altas proporções. A dificuldade no jogo com os pés ganhou evidência na estreia de Rogério Ceni no comando do Flamengo. O jogo entra contra o São Paulo pela Copa do Brasil. Justamente o clube em que Ceni foi ídolo, se destacou com grandes defesas, títulos e gols, fez mais de 100 na carreira de goleiro. Nos minutos finais da partida, Hugo foi tentar driblar o atacante Brenner, perdeu a bola e sofreu o gol. Fim de jogo 2 a 1, São Paulo.

- Eu me destacava na base com o jogo com os pés, mas é tudo diferente da base para o profissional, porque quando eu errava na base não tinha o mesmo peso que tem no profissional. Eu me cobro bastante, porque tive erros nesses fundamentos e trabalho para não errar mais, tenho um cara que trabalha comigo que é referência no jogo com os pés, que é o Diego Alves, então eu tento absorver o máximo possível - Afirma o goleiro Hugo Souza, do Flamengo.

Hugo Souza falha - Flamengo x São Paulo — Foto: Maga Jr/ O Fotográfico /  Estadão Conteúdo
4 de 5 Hugo Souza falha - Flamengo x São Paulo — Foto: Maga Jr/ O Fotográfico / Estadão Conteúdo

Hugo Souza falha - Flamengo x São Paulo — Foto: Maga Jr/ O Fotográfico / Estadão Conteúdo

Apesar de jovem, Hugo sempre mostrou personalidade ao reconhecer as falhas e expor sua opinião. Quando erra, ele assume e quando ele não considera um erro, ele dá a visão dele. Também contra o São Paulo, só que pela última rodada do Brasileirão, erro na saída, que colocou a bola no peito de Daniel Alves e na sequência da jogada, Pablo fez o gol.

- Se eu errei nisso é que eu preciso melhorar, se eu errei é porque eu preciso trabalhar – Afirma o goleiro.

Mas as críticas que envolveram a posição da barreira no gol de falta de Luciano, para Hugo a mentalidade de quem está de fora é falha, mas na opinião do goleiro, não foi.

- Eu costumo dizer que quem está de fora tem uma mentalidade sobre as faltas diferente, falam que quando chutam no lado do goleiro não pode entrar, a gente que é goleiro sabe que nem sempre é assim, fui muito criticado na questão da barreira contra o São Paulo, mas não acredito que tenha sido uma falha. Foi uma falta centralizada, em faltas assim o goleiro tem que escolher um lado para montar a barreira e outro para ficar, como a falta foi mais para a direita, eu montei a barreira no lado direito e fechei o esquerdo. Eu não escolhi canto, fiz um movimento que é meu, dando um passo para frente e quando o Luciano bate eu não consigo mais ver a bola, porque tinha muita gente, quando vejo ela já está muito próxima e não consigo alcançar, ela foi muito bem batida, na “bochecha” da rede - explica Hugo.

Conviver com as críticas faz parte da rotina, Hugo sabe que por mais que trabalhe, ele está suscetível a erros. Afinal, só erra quem joga. Mas o goleiro também está ciente que a boa performance vai além dos gramados, significa representatividade. Ainda na base, quando disputava a final do Carioca sub-20 contra o Vasco, foi chamado de “macaco”. No último dia 27 de março, o goleiro Barbosa completaria 100 anos e foi levantado diversos debates sobre o racismo que ele sofreu na época, com a sua suposta falha. O preconceito que Barbosa sofreu ainda se faz presente, em levantamento recente feito pelo jornalista Marcos Luca Valentim, do Ubuntu Esporte Clube, o goleiro Hugo foi apenas o 13° goleiro negro campeão do Brasileirão na história.

- Tenho certeza que a importância foi gigantesca (ganhar o título como titular), porque eu sou do clube que representa o gueto, a favela, a minoria e eu também faço parte disso, criado no mesmo ambiente. O clube com o peso que o Flamengo tem, ser campeão Brasileiro com um goleiro negro, isso é de muito valor para as pessoas, para que a galera de onde eu vim possa entender que não é porque eles são negros de classe baixa, que eles vão deixar de conquistar o que eles sonham - completa Hugo.

 Hugo Souza, com Wagner Miranda,  no Morumbi após o Flamengo conquistar o Campeonato Brasileiro 2020 — Foto: Alexandre Vidal/Flamengo
5 de 5 Hugo Souza, com Wagner Miranda, no Morumbi após o Flamengo conquistar o Campeonato Brasileiro 2020 — Foto: Alexandre Vidal/Flamengo

Hugo Souza, com Wagner Miranda, no Morumbi após o Flamengo conquistar o Campeonato Brasileiro 2020 — Foto: Alexandre Vidal/Flamengo

Sobre as sondagens do Ajax, o jogador prefere não comentar, apenas focar no Flamengo e deixar as possíveis negociações com o seu Staff. Com apenas 22 anos, o goleiro segue quebrando barreiras, sendo o mais jovem goleiro do Flamengo a conquistar um Brasileiro e vive a melhor definição de Ubuntu: Com os seus feitos, com as suas conquistas, cada vez mais goleiros negros vão ter coragem de desafiar os estigmas do racismo.

Fonte: Globo Esporte
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