Os advogados de Bruno Henrique e do Flamengo estão mobilizados para recorrer da decisão do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD), que impôs ao atacante uma suspensão de 12 jogos e uma multa de R$ 60 mil. A defesa planeja protocolar o recurso ainda esta semana, após a divulgação do resultado do julgamento realizado na última quinta-feira.
Primeiro recurso: a questão da prescrição
A sessão do STJD foi dividida em duas partes. Inicialmente, foi analisado o pedido da defesa de Bruno Henrique para que o processo fosse considerado prescrito, resultando em seu arquivamento definitivo. No entanto, a defesa foi derrotada por três votos a dois. Os advogados acreditam que têm chances de reverter essa decisão no pleno do STJD, buscando anular o resultado do julgamento do mérito, que é o cerne do caso.
A discussão sobre a prescrição é crucial. Ela se refere à perda do direito da Procuradoria de denunciar uma infração disciplinar devido à inatividade em um determinado período após a prática do ato infracional. No caso de Bruno Henrique, a acusação teria um prazo de 60 dias para apresentar a denúncia após a abertura do inquérito. O jogo em que ocorreu a infração foi em 1º de novembro de 2023, e a defesa argumenta que o prazo pode ser contado de duas maneiras: a partir da data do jogo ou a partir do momento em que a Procuradoria tomou ciência do fato, em 2 de agosto de 2024, quando o STJD recebeu um alerta da Conmebol.
Se contarmos a partir da data do jogo, o prazo para a denúncia se encerraria em 30 de dezembro de 2023. Por outro lado, se a contagem for a partir do momento em que a Procuradoria foi informada, o prazo se estenderia até 30 de setembro de 2024. O relator do processo destacou que a justiça desportiva não possui os mesmos recursos que a justiça comum, como a quebra de sigilo telefônico, o que dificultou a investigação no momento em que o caso chegou ao tribunal.
O inquérito da Polícia Federal, que revelou mensagens trocadas entre Bruno Henrique e seu irmão Wander, também réu no tribunal, embasou as acusações. O STJD teve acesso ao relatório da PF em 5 de maio deste ano, instaurando a investigação em 7 de maio e concluindo-a em 6 de junho, com a denúncia sendo apresentada em 1º de agosto. A Procuradoria considerou o período entre 6 de junho e 1º de agosto, totalizando 56 dias, para contar o prazo de prescrição. A defesa, por sua vez, se baseia no Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD), que estipula que a interrupção da prescrição só pode ocorrer uma vez, no momento da instauração do inquérito. Assim, mesmo desconsiderando os prazos anteriores, a defesa argumenta que a contagem de 60 dias deveria iniciar em 7 de maio de 2025, data da abertura do inquérito.
Durante o julgamento, o advogado de Bruno Henrique, Alexandre Vitorino, defendeu que novas provas não podem reabrir o prazo prescricional: — "Tendo havido um arquivamento anterior, surgindo prova nova, é possível que haja denúncia. É verdade, mas dentro do prazo prescricional. Não existe a possibilidade de interpretar qualquer sistema punitivo no sentido de que novas provas reabrem o prazo prescricional."
Dois dos auditores, William Figueiredo e Marcelo Rocha, presidente da 1ª Comissão Disciplinar do STJD, acolheram o pedido de prescrição. A votação apertada, 3 a 2, traz confiança à defesa de que o recurso será aceito, uma vez que o tema gerou dúvidas no primeiro julgamento. Marcelo Rocha sustentou: — "A partir do momento em que foi instaurado um inquérito, esse inquérito precisava ter sido concluído, e a denúncia ter sido oferecida e recebida em 60 dias. Quando se traz esse novo marco temporal para junho, quando houve a conclusão do inquérito, e fazendo uma nova contagem de 60 dias até o oferecimento da denúncia, eu acho que estamos criando uma regra que não está no CBJD."
A incerteza em torno da questão é considerada favorável ao pedido de efeito suspensivo, que também será analisado ao longo da semana. Há uma expectativa de que Bruno Henrique possa ser liberado para atuar pelo Flamengo no próximo jogo, marcado para domingo, contra o Juventude.
Segundo recurso: a condenação e os artigos do CBJD
Com o pedido de prescrição não acolhido, o tribunal prosseguiu e condenou Bruno Henrique. O atacante do Flamengo foi denunciado pela Procuradoria do STJD em diversos artigos do CBJD: art. 243, §1º; art. 243-A, parágrafo único; art. 184 e art. 191, III, além do artigo 65, II, III e V, do regulamento geral de competições da CBF de 2023. Os dois primeiros artigos, 243 e 243A, preveem como punição a suspensão do futebol.
Bruno Henrique foi absolvido do artigo 243, que trata de atuar deliberadamente de modo prejudicial à equipe, mas foi condenado no artigo 243A, que aborda a atuação contrária à ética desportiva com o intuito de influenciar o resultado de uma partida. Os auditores que votaram pela punição argumentaram que, embora o CBJD esteja desatualizado e não aborde diretamente a manipulação, é possível interpretar o caso como uma violação da ética desportiva. Marcelo Rocha afirmou: — "Houve a violação. A gente consegue interpretar o artigo de uma forma sem alterar o contexto do que está ali. Precisamos fazer isso em função de uma norma que está desatualizada diante dos tempos que vivemos hoje em dia."
A defesa, por sua vez, considera contraditório absolver o jogador de um artigo e condená-lo em outro. A pergunta que permeia a estratégia dos advogados é: "Como Bruno Henrique é inocente de causar prejuízo ao Flamengo, mas é culpado de influenciar no resultado desta mesma partida?" Essa questão deve embasar parte do recurso que será julgado pelo pleno do STJD.