A repercussão negativa entre torcedores e a pressão interna na Gávea para que o Flamengo voltasse atrás no acerto com o atacante Mikey Johnston aumentaram os questionamentos no clube sobre o trabalho de José Boto. A interferência do presidente Bap, que vetou a contratação do irlandês, simboliza o pior momento do diretor de futebol, que vive desgaste com vários jogadores.
Mesmo depois de ótimo primeiro semestre do time em campo, existe um incômodo considerável com métodos de Boto, que estaria prejudicando o clima no dia a dia com atitudes criticadas por dirigentes, jogadores e funcionários. Do seu lado, o português também está insatisfeito, mas pessoas que convivem com ele consideram pouco provável a saída neste momento, a três dias da abertura da janela de transferências.
Boto foi anunciado no dia 18 de dezembro, quando Bap tomou posse no Flamengo . A contratação de um diretor-técnico era promessa de campanha do presidente, que prometeu deixar para um profissional a missão de tocar o futebol rubro-negro.
— Tenho dito e repito: não vou me meter nas escolhas do diretor técnico. Claro que a caneta no fim das contas é minha, mas vou muito mais na linha de vetar do que de tomar decisões por ele — disse Bap em sua primeira e única entrevista coletiva desde que foi eleito .
José Boto e Bap no Ninho do Urubu, CT do Flamengo — Foto: Marcelo Cortes / CRF
Quase sete meses depois, o presidente fez sua primeira interferência direta no trabalho de Boto. A reação negativa da torcida e a pressão interna na Gávea sobre a iminente contratação de um atacante irlandês que joga na segunda divisão inglesa fizeram Bap agir nos bastidores para que o Flamengo desfizesse o acerto. Mikey chegaria ao Rio na manhã desta terça.
Outra recente atitude de Boto que causou incômodo no clube foi a negociação de Victor Hugo de graça para o Famalicão. A pressão interna também fez o Flamengo repensar a negociação, que no momento está travada. Dirigentes e conselheiros questionaram o fato de o Rubro-Negro não receber compensação financeira na transação de um jogador de 21 anos e que ainda tem dois anos de contrato com o clube.
Os episódios expuseram a insatisfação de pessoas importantes do clube com o trabalho do dirigente, mas não é a primeira vez que Boto se torna alvo de questionamentos. O diretor de futebol enfrenta problemas com alguns jogadores, empresários e funcionários desde que foi contratado. Em meio à pressão, o diretor continua com o respaldo de Bap, mas no clube não conta com o mesmo prestígio do início do ano .
A crise interna no Flamengo não começou com a possível contratação de Mikey Johnston. Na semana passada, veio à tona uma insatisfação entre o clube e o atacante Pedro. A informação de que um integrante do departamento de futebol do Fla estaria disposto a negociar o jogador por 15 milhões de euros (R$ 95 milhões), publicada pelo colunista Mauro Cezar Pereira do UOL , irritou muita gente dentro e fora da Gávea.
A forma como a situação foi conduzida causou desgaste na relação com o jogador e incomodou o treinador Filipe Luís, levantando questionamentos sobre o convívio de Boto com os atletas no dia a dia.
A maneira como o português lida com os astros do elenco causa desconforto em alguns deles. No caso de Pedro, por exemplo, no início do ano, o estafe do jogador abriu conversas com a diretoria para extensão do vínculo. Na ocasião, José Boto informou que o assunto seria resolvido assim que o jogador voltasse de lesão. No entanto, o atacante retornou aos campos em abril, e o diretor de futebol ainda não procurou os empresários do atleta. O contrato atual vai até o fim de 2027.
Boto ao lado de Gerson no treino do Flamengo — Foto: Gilvan de Souza / Flamengo
O atrito com Gerson também causou insatisfação em parte do elenco. Na janela do início deste ano, o Flamengo recusou proposta oficial de 18 milhões de euros mais 6 milhões de euros em metas (R$ 153,5 milhões no total) pelo meia. O ge apurou que no dia seguinte o CEO do clube russo, Alexander Medvedev, em reunião por videoconferência, disse que poderia subir a oferta para 20 milhões de euros fixos e 9 milhões de euros em metas (R$ 185,5 milhões no total) .
Na época, a direção afirmou a Gerson que ele seria vendido se pedisse sua liberação diretamente a Filipe Luís, o que o atleta não quis fazer, entendendo que aceitar ou não a oferta russa era uma decisão do Flamengo. Logo depois, ele e seu pai e empresário, Marcão, toparam a proposta de renovação com redução da multa rescisória (de 200 milhões de euros para 25 milhões de euros), em contrapartida ao aumento salarial ainda ficar bem abaixo do que receberia na Rússia.
Antes da viagem para a Copa do Mundo de Clubes nos Estados Unidos, quando vazou a notícia de que Gerson já tinha um acordo com o Zenit, o Flamengo emitiu nota oficial dizendo que "a saída de qualquer atleta só poderá ocorrer mediante o pagamento integral da cláusula de rescisão e com o desejo do próprio jogador em deixar o clube". A mensagem foi tida como uma indireta ao capitão e repercutiu no grupo de WhatsApp do elenco.
Arrascaeta posta foto ao lado do empresário, Daniel Fonseca, e uma possível indireta — Foto: Reprodução
Outro que não está satisfeito é Arrascaeta. Com vínculo até o fim de 2026, o uruguaio sinalizou o interesse de encerrar sua carreira no Flamengo e abriu negociações para renovar no início deste ano. Em maio, o clube congelou as tratativas e resolveu deixar o assunto para depois, o que incomodou o meia e seu estafe . A ideia inicial era resolver a renovação logo após a Copa do Mundo de Clubes, mas a condução do processo afastou uma resolução e deixou a relação mais fria.
No sábado, um dia após a nota do Flamengo que comunicava a saída de Gerson citando "pedido de demissão unilateral" do jogador, Arrascaeta se despediu do camisa 8 em post no qual chama o meio-campista de "sinônimo de caráter e profissionalismo" .
Há ainda a condução da situação do jovem Lorran . Depois de melar a venda para o CSKA (Rússia), o Flamengo se abriu ao mercado interno e aceitou uma proposta do Fortaleza de empréstimo até dezembro, sem valor fixado e 10% de vitrine em caso de venda no período. Mas o negócio melou no último instante por um atrito com os agentes do meia, que ficaram fora da negociação. Considerado uma das principais joias rubro-negras nos últimos anos, o atleta foi escanteado no Ninho do Urubu e voltou à base. Tratamento que foi alvo de críticas públicas do Madureira, clube formador do garoto , e despertou insatisfação em pessoas do Flamengo.
Nos bastidores, Boto sempre deixou claro que não teria problemas em comprar brigas com empresários pelo que considera ser melhor para o clube. São vários agentes diferentes envolvidos nessas negociações de renovações no elenco.
Lorran em ação no jogo entre Flamengo e Palestino — Foto: Marcelo Cortes/Flamengo
No início, Boto ganhou pontos com os jogadores ao blindar os treinos e vestiário de figuras da política rubro-negra (comprando briga com dirigentes e conselheiros), e também por ficar ao lado do elenco no atrito com o diretor médico José Luiz Runco, que queria retirar o futmesa da academia do CT . Mas hoje a situação é de distanciamento com boa parte do grupo, especialmente as principais lideranças. Os relatos de pessoas que vivem no Ninho indicam um dirigente com pouca abertura com os atletas.
Internamente, as pessoas que trabalham no Ninho acreditam que uma recente publicação de Arrascaeta seria uma indireta ao português: "O tempo põe cada um em seu lugar, cada rei em seu trono e cada 🤡 (emoji de palhaço) em seu circo...", escreveu o uruguaio na legenda de uma foto ao lado de seu empresário, Daniel Fonseca, nas redes sociais .
Não apenas alguns jogadores fazem críticas à conduta de Boto. A entrevista do dirigente ao ge publicada no último dia 29 pegou mal principalmente entre funcionários do Ninho. Ao fazer balanço de seus primeiros seis meses no clube, o português citou que havia "falta de comprometimento".
— Há coisas, por mais culturais que sejam, que devem ser feitas de outra forma e estão a ser feitas com tempo, sem grandes revoluções, mas estão a ser feitas de outra forma. Para dizer o que mais machucou foi uma falta de comprometimento, sabe? Não pode ser o treinador e o diretor as pessoas que entram primeiro e saem por último, trabalham de sol a sol. Porque estar num clube como o Flamengo se exige de todos esse comprometimento, tem que ser a coisa mais importante — disse o dirigente à ocasião.
Durante a participação do Flamengo na Copa do Mundo de Clubes, Boto concedeu entrevistas também para veículos da Europa e dos Estados Unidos. A atitude chamou atenção de pessoas importantes no clube. Os mais críticos ao diretor entenderam que ele queria atrair holofotes para si em mercados financeiramente mais fortes no futebol. Os conteúdos abordados também foram amplamente debatidos internamente.
José Boto, do Flamengo, em entrevista ao canal CBS — Foto: Reprodução
Ao jornal italiano Gazzetta Dello Sport , por exemplo, ele chegou a levantar o nome de dois treinadores como alvos caso Filipe Luís deixasse o comando do Flamengo: os italianos Antonio Conte e Roberto De Zerbi. Na mesma entrevista, Boto protagonizou o início da polêmica com Pedro, quando comentou o interesse em contratar um camisa 9 e citou Vlahovic, da Juventus (o rubro-negro era reserva do sérvio na época em que estava na Fiorentina). Pouca gente no clube entendeu, já que Boto dizia que acertar com um centroavante não seria prioridade na janela.
As mudanças promovidas no início do trabalho tampouco causaram boa impressão no Flamengo. Depois das trocas no departamento médico, o clube promoveu demissão em massa na base. Em sua apresentação no Flamengo, Boto revelou ter como missão retomar o DNA do futebol brasileiro e voltar a ser uma fábrica de talentos .
A promessa de revolucionar a base, porém, ainda não foi colocada em prática. O diretor centraliza as decisões do departamento, mas muitas também são questionadas.
Nuno Campos em seu primeiro treino no Flamengo — Foto: Divulgação / Flamengo
A primeira delas foi a demissão de Cléber dos Santos, desligado logo após ser campeão da Libertadores Sub-20 pelo Flamengo. O clube contratou o português Nuno Campos, que trabalhou com Boto na Ucrânia, para assumir o time sub-20. Menos de três meses depois, porém, ele pediu demissão alegando problemas pessoais e fechou com o Zte (Hungria) após quatro dias. Nos bastidores, a saída de Nuno incomodou o diretor de futebol.
Publicamente, o Flamengo não falou sobre a demissão de um dos homens de confiança de Boto e ainda não anunciou a contratação do novo técnico. O ge apurou que o clube está acertado com Bruno Pivetti. No dia a dia, quem dá maior atenção à base é Alfredo Almeida, assistente de Boto.
A ação do Flamengo no mercado também provoca debate em grupos políticos. Até agora, o clube contratou este ano três reforços, sendo dois deles muito conhecidos, com passagens longas por suas respectivas seleções: Danilo e Jorginho. Ambos são considerados "previsíveis", com o perfil que a antiga diretoria contrataria, por exemplo.
O terceiro é o atacante Juninho, buscado por José Boto no Qarabag, do Azerbaijão. O jogador ainda não vingou no Flamengo, que avalia um empréstimo para a Arábia Saudita .
O polêmico nome de Mikey Johnston surgiu a partir do trabalho de scout. O processo naturalmente prevê uma conversa com Filipe Luís. O ge apurou que o treinador apenas aceitou a sugestão de Boto. A comissão técnica espera a contratação de um ponta que, além de driblador, seja decisivo com gols.
José Boto apresenta Juninho no Flamengo — Foto: Gilvan de Souza / CRF
Em 28 de dezembro do ano passado, quando José Boto chegou ao Rio de Janeiro, o canal oficial do clube, então ainda chamado de "FlaTV", fez cobertura ao vivo do aeroporto do desembarque do dirigente. Com tratamento de reforço de primeiro nível, o português prometeu mudar toda a condução do futebol rubro-negro. Nos primeiros seis meses, a missão ainda não foi bem-sucedida, apesar dos bons resultados em campo.
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