Torcedor do Fla assassinado jogou na base do Flu, e primo lamenta: "Família chora por coisa idiota"

Pedro Henrique jogou na base do Flu ao lado de nomes como Marcos Júnior e Wellington Silva — Foto: Reprodução

Pedro Henrique jogou na base do Flu ao lado de nomes como Marcos Júnior e Wellington Silva — Foto: Reprodução

O sábado de Botafogo x Flamengo terminou em violência e morte mais uma vez. Uma face brutal da rivalidade entre duas camisas que novamente fez uma vítima. Mais um jovem. Mais uma vida ceifada por um ódio que extrapola as quatro linhas.

Na Rua Combu, no Jardim Carioca, na Ilha do Governador, o rubro-negro Pedro Henrique Vicente de Santana, de 25 anos, foi emboscado, segundo relato de familiares, por torcedores de Botafogo e Vasco - as duas torcidas são tradicionalmente aliadas - e não resistiu aos quatro ferimentos à bala. Dois tiros no pescoço, um no peito e outro nas costas.

Entrou para uma lista que cresce a cada ano, uma estatística hedionda que, apesar da relação com o esporte, se espalha por pontos da cidade bem distantes dos estádios onde acontecem as partidas, distante do sonho que um dia alimentou de estar no gramado. Na adolescência, Pedro Henrique vestiu a camisa de um dos grandes rivais do Flamengo, o Fluminense, mas acabou não vingando como profissional.

Primo da vítima, Vinícius Santana, de 32 anos, trabalha para uma companhia telefônica e, embora triste, não se surpreende com o desfecho trágico do sábado de futebol. Sabia que o primo fazia parte de uma organizada que está proibida de frequentar estádios por conta de eventos violentos anteriores e não hesita em dizer que, hoje, a família chora por "uma coisa idiota".

- A gente sabe que está sujeito a acontecer. A questão da torcida organizada é essa: são amigos, estão lá um pelo outro. Vai dizer que nunca brigou? Óbvio que brigou. Hoje nossa família chora. E outras já choraram. Por uma coisa idiota.

Irmã de Pedro Henrique postou mensagens nas redes sociais — Foto: Reprodução

Irmã de Pedro Henrique postou mensagens nas redes sociais — Foto: Reprodução

Ele afirma que o primo "nunca foi envolvido com coisa errada", mas lembra que futebol é entretenimento e diversão:

- São rumos, escolhas... A polícia se prontificou a investigar (a Delegacia de Homicídios conduz o inquérito). É sempre uma luta acabar com isso (violência no futebol). É uma esperança que isso acabe. Qual é a necessidade? Ele morreu. O clube está lá, os jogadores estão lá, e ninguém sabe quem é ele. Nem nota oficial - ponderou.

De acordo com o relato de Vinícius Santana, Pedro Henrique saiu para ver o jogo com amigos, no local onde sempre costumava ir, bem longe do estádio onde aconteceria o clássico. Houve uma emboscada envolvendo não apenas torcedores do Botafogo, o adversário do Flamengo no último sábado:

- Saíram para ver o jogo no Posto Ilha. Point que o pessoal está acostumado a ver jogo. Não foi nada marcado. Eles normalmente vão assistir ao jogo lá. Quase no Posto Ilha, eles se depararam com torcedores do Botafogo e do Vasco. Eles correram até uma escadaria e, quando chegaram lá, atiraram neles.

Pedro Henrique era mais um dos muitos jovens que durante a adolescência alimentaram o sonho de se tornar jogador profissional, mas pararam pelo caminho. Ele jogou até os 16 anos, de acordo com Vinícius, passando pela base de clubes como o Fluminense, ABC de Natal e Bangu.

- O Pedro sempre foi um garoto de família. Jogou futebol até os 16 anos. Sonho que dá certo para um em um milhão. As coisas não aconteceram. Saiu do Fluminense, foi para o ABC de Natal, Bangu... Ele trabalhava de motorista, em aplicativo. Até semana passada estava trabalhando em um colégio. Ele tinha uma namorada - contou.

Pedro Henrique era membro de organizada que está impedida de entrar nos estádios — Foto: InfoEsporte

Pedro Henrique era membro de organizada que está impedida de entrar nos estádios — Foto: InfoEsporte

Na base tricolor, Pedro Henrique atuou com outros que hoje jogam na elite do futebol nacional, como Marcos Júnior, ainda do Fluminense, e Wellington Silva, atualmente no Internacional de Porto Alegre.

- Que sirva de lição. Sei que não acaba (violência no futebol), é muito difícil. A gente acha que nunca vai acontecer com a gente.

Após o jogo entre Internacional e Ceará neste domingo, Wellington Silva lembrou que estudou com Pedro Henrique no colégio Percepção, de Irajá, além do período juntos na base tricolor. Os dois não se viram recentemente, mas conversavam por redes sociais.

- Estudamos juntos, fizemos a base no Fluminense. Não nos encontramos recentemente, mas trocávamos mensagens, curtíamos fotos uns dos outros. Dividimos o sonho de infância de sermos jogadores profissionais. Lamento muito a morte dele, a maneira como ocorreu. Que Deus conforte o coração dos seus familiares.

Marcos Junior, que entrou em campo no domingo no empate entre Fluminense e Sport, também lamentou a morte do ex-colega de Xerém.

- Jogamos juntos no mirim e infantil. Não tinha intimidade com ele, convivio fora do clube, mas a gente se dava bem. Ele era zagueiro, tentou ir para outros times depois, mas não deu sequência. Fiquei sabendo depois que era Flamengo e estava em torcida organizada. Mas quando vi a notícia da morte de um torcedor, não me liguei que era ele. Só depois quando vi amigos em comum postando "luto pelo Pedrão" que me toquei. Muito triste, cara novo, meus sentimentos para toda família nesse momento.


O confronto na Ilha do Governador não foi a única confusão antes do clássico entre Botafogo e Flamengo. A caminho do estádio Nilton Santos, um ônibus com torcedores alvinegros que vinha sendo escoltado pelo Grupamento Especial de Policiamento em Estádios (Gepe) foi depredado. Teve as janelas quebras.

No trajeto, os torcedores ameaçaram o motorista, que chegou ao estádio chorando, e foi obrigado a parar na Avenida Brasil na altura do Parque União onde, como acontecia na Ilha, grupos de rubro-negros estavam reunidos para assistir ao jogo. O Gepe entrou em ação rapidamente e conteve a ação dos cerca de 60 alvinegros, que acabaram detidos.

Fonte: Globo Esporte