Rocha: Como a dupla Fla-Flu ficou "escrava" do clássico

O Flamengo é o atual tricampeão carioca, vencendo o Fluminense nas duas últimas finais. Ganhou a Libertadores em 2019, está na decisão da atual edição e luta na quarta contra o Athletico pela presença na final da Copa do Brasil.

Em termos competitivos, sobra no Rio de Janeiro como, talvez, nenhum outro clube na história. Por méritos próprios e, também, deméritos dos três grandes rivais. Dois atualmente na Série B nacional.

Só por isso consegue entrar em campo para disputar um Fla-Flu com alta expectativa de vitória, mesmo com a crise técnica batendo a porta e repleto de desfalques, por suspensão, lesão ou poupando mesmo, como foram os casos de Isla e Willian Arão. Lançando-se ao ataque e empurrando o rival para o próprio campo.

Em outros tempos, de maior equilíbrio de forças, o time rubro-negro começaria a partida mais cauteloso e transferindo a responsabilidade do protagonismo para o outro lado. Sem adiantar tanto as linhas e expor a sua última linha defensiva.

Por ser poderoso no cenário local e nacional, o Flamengo cria para si uma "armadilha" que o Fluminense aproveitou muito bem nas quatro vitórias sobre o rival em 2021.

Uma pelo Brasileiro de 2020, outra no estadual e agora mais duas na competição por pontos corridos deste ano. Destas o Flamengo só jogou mais completo na primeira. Também no triunfo que valeu taça, decidindo o estadual.

Nos 3 a 1 em um Maracanã com torcida pela primeira vez no ano, o Flu, sem Nino e Fred, recuou, aceitou a pressão do rival, sofreu um pouco no início para não sair atrás no placar, como na cabeçada de Matheuzinho que bateu no travessão. Mas no primeiro ataque mais organizado, chegando com mais jogadores na zona de conclusão, o cruzamento da esquerda encontrou John Kennedy, que se antecipou a Renê e abriu o placar.

O jovem e promissor atacante marcaria também o segundo, na etapa final, completando assistência de Luiz Henrique, que fez o que quis com o lateral esquerdo reserva do Fla. Um time esbarrando em suas limitações, mas que seguia atacando. Por convicção, mas também necessidade. A derrota praticamente encerrava o sonho de um inédito tricampeonato consecutivo para o clube.

Com Vitinho na vaga de Diego Ribas, um pouco mais de criatividade na frente. Nada demais, porém, até pela atuação constrangedora de Everton Ribeiro. O gol único foi um símbolo do Flamengo no clássico: do contestado Renê, meio sem querer, na dividida. Renato Gaúcho, que conversava com Ramon, que substituiria o camisa seis e merecia mais oportunidades na ausência de Filipe Luís, mandou o jovem lateral de volta ao banco, para colocá-lo minutos depois. Renê, um dos piores em campo, seguiu jogando porque foi às redes, meio ao acaso.

O caos rubro-negro foi punido com o belo chute de Abel Hernández, aproveitando mais uma falha de Gustavo Henrique, tão instável quanto Léo Pereira como o companheiro de Rodrigo Caio na zaga. Tantos problemas geraram tensão e reações acima do tom no atual bicampeão nacional. Talvez pela consciência de que, sem suas estrelas, a equipe não consegue entregar desempenho semelhante. Apesar da obrigação imposta pelas próprias expectativas.

Um ciclo vicioso. Assim como resta aos tricolores vibrarem nas arquibancadas e nas redes sociais como se vencessem uma final de campeonato. É o que sobra no cenário atual, além de uma possível vaga na Libertadores do ano que vem. O time vence o Fla-Flu porque joga como franco-atirador, a "zebra". Mesmo quando está quase completo e o rival em frangalhos. É o suficiente para a história de um tetracampeão brasileiro?

A dupla Fla-Flu vive uma espécie de "escravidão" no clássico. O Flamengo do próprio sucesso nos últimos anos, o Fluminense do papel de coadjuvante que incomoda no confronto direto, mas tem zero perspectivas de taças na temporada. Apesar da excelência do trabalho das divisões de base em Xerém. Mesmo com Marcão entregando um time mais organizado que Renato Gaúcho.

Por essa Nelson Rodrigues, o grande arauto da história do clássico, não esperava.

Imagem: Thiago Ribeiro/AGIF

Fonte: Uol