Perto da churrasqueira, a própria data de nascimento, a dos filhos, dos irmãos e dos pais estão marcadas na parede. Mas, na cabeça do Baixinho, as idades pouco importam. O quase sessentão Romário afirma que vive os melhores dias de sua vida.
Gravada antes da definição da CBF por Carlo Ancelotti, a entrevista ao Abre Aspas tinha duração prevista de 30 minutos. Mas o senador da República concedeu alguns acréscimos para lembrar do início da carreira, das confusões dentro e fora do campo — numa delas, não poupou nem a família —, falar da vida em Brasília e do novo hobby: a carreira de youtuber com a Romário TV.
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Abre Aspas com Romário Fotos: André Durão — Foto: André Durão
Romário em estado puro: palavrões, reflexões e muito mais em entrevista ao Abre Aspas — Foto: André Durão
ge: Você faz 60 anos no início de 2026. O que significa a idade para você?
— Cara, 60 anos são 60 anos. Mas eu acredito que essa coisa de ficar velho é muito de cada um, é da cabeça. Sou um cara que sou eternamente jovem. Mas tenho hoje as minhas responsabilidades. O mais importante, independentemente dessa idade, um cara de 60, de 59 para 60, eu sou um cara muito feliz. Curto muito a vida e aproveito o máximo que puder.
Você teve bronquite com 11 anos...
— Tive bronquite, tive asma, tive a p... toda. E superei tudo isso e tô aqui firmão.
Mas, recentemente, você operou, em 2017, por causa da diabetes.
— Eu era diabético. Naquele momento era até uma cirurgia experimental e resolvi fazer. Minha glicose chegou a 480, estava começando a ter algumas complicações. Depois dessa cirurgia, dois meses depois, caiu para 90. Graças a Deus até hoje está entre 85 e 95.
Romário toma posse do America — Foto: Raphael Zarko / ge
Lembro uma vez, no Flamengo, você teve um problema de saúde na Gávea, sentou, colocou a mão no coração. Você lembra disso?
— Lembro. Cara, na verdade, eu estava há uns dois, três dias sem dormir. Estava numa balada profunda, né, direto (risos). Sol do c.... Não lembro se o treino foi à tarde, mas se foi eu com certeza não tinha almoçado, se foi de manhã com certeza não tinha tomado café. E aí, meu irmão, bagulho embolou tudo, vi tudo rodando... Meio que dei uma desmaiada. E até mesmo na ambulância eu lembro, ficaram assim comigo, “pô, será que esse cara vai morrer?”. Aí chegou perto do hospital, (olhei), “morrer é o c...., cara” (risos). Já estava bem melhor.
Antigamente, 60 anos era a terceira idade. Hoje, não. Quais são as mudanças do Romário ao longo do tempo?
— Primeiro, virei pai, né. Minha filha hoje tem 35 anos, daí para a frente você começa a ver a vida de forma diferente. Depois dela vieram mais cinco. Hoje, sou avô do Davi, da Sofia e da Duda. E, cara, tenho responsabilidade hoje que eu não tinha quando parei de jogar. Hoje eu sou parlamentar, fui deputado federal, hoje estou no segundo mandato de senador. E sou presidente do America, time do meu coração e do meu pai. E para complicar mais ainda, virei entrevistador. Tenho programa no Youtube, na Romário TV, programa de Cara com o Cara. Que tô curtindo bastante, gostando muito.
— Mais um motivo que estou ligado nas perguntas de vocês. Vocês não vão me pegar mais, antigamente eu caía mole, agora não dá mais (risos). Mas, enfim, cara, as coisas mudaram, a gente evoluiu, particularmente eu sinto que evoluí e cresci. Fiquei mais velho, fiquei mais experiente. O mais importante da idade é que sou um cara que curto muito a minha vida. Eu me sinto um cara muito jovem, porque consigo fazer tudo aquilo que me dá vontade, jogo futevôlei, jogo futebol, malho, dou uma nadada, às vezes até jogo tênis. Continuo gostando para c... da noite, é claro que vou menos, mas continuo gostando. E curto a minha vida.
"E o Mbappé, é marrento mesmo?" Na pauta da entrevista de Romário com Neymar, a forma coloquial do ex-jogador falar com entrevistados — Foto: Raphael Zarko
Está trabalhando muito para quem dizia que você não gostava de treinar.
— Treinar para quê, né. Cara, essas coisas que tenho feito me fazem muito bem. O que me motivou a entrar na política foi a Ivy, a minha filha que é a mais nova e que tem síndrome de Down. O nicho daquelas famílias que têm síndrome de Down lá atrás, quando entrei na política, me motivou, me colocou que seria uma pessoa que teria muita voz e poderia ajudar muito esse segmento. E estou aí há 14 anos lutando, batalhando e estou muito feliz. Agora, como entrevistador na Romário TV, no de Cara com o Cara, é uma coisa que realmente eu não esperava, nunca imaginava que realmente fosse acontecer, mas hoje estou curtindo muito, muito, muito mesmo. Estou vivendo assim um dos momentos mais felizes da minha vida.
Você que faz a pauta do programa?
— Nós temos o produtor aqui que é o Zuca, um cara bastante ligado em todos os assuntos, mas sempre antes das entrevistas a gente senta uma hora antes, uma hora e meia antes. Posso dizer assim que eu participo uns 40% da hora de montar, principalmente as perguntas.
A churrasqueira com a data de "29-01-1966", data de nascimento de Romário — Foto: Raphael Zarko
Você já teve momentos de paz absoluta com a imprensa e momentos de guerra intensa... Mas a tua experiência de hoje faz entender melhor o outro lado, fez refletir?
— Paz absoluta não sei, não (risos). Pode até ter trégua, mas paz absoluta... Ao longo do tempo a gente vai crescendo, entendendo várias coisas, é claro que muitas das matérias que saíram em relação a mim, eu não vou dizer que foram mentirosas, mas faltaram um pouco com a verdade no sentido de 100%. E eu poderia ter tido, talvez, uma relação melhor com a imprensa. Claro, não estou generalizando, mas é uma minoria, não tivesse um monte de babaca que tinha na época. Mas com certeza hoje não deixa de ter. No geral posso dizer que por mais que tenha sido conturbada minha relação com a imprensa, foi uma relação que eu levei. Vocês levaram também comigo. Eu precisei de vocês muitas vezes. Vocês precisaram de mim muitas vezes. Então, assim, sempre foi uma troca.
— E hoje vivendo do lado de lá, eu consigo entender que, por mais que eu seja o Romário e tenha uma história dentro do futebol, sou um cara que as pessoas respeitam, muitos gostam, têm carinho por mim. Eu tenho que saber que quando eu pergunto ou chamo alguém para fazer uma entrevista, tenho que estar preparado para tomar um não. Quando eu tomo, eu fico p.... Mas faz parte do jogo.
No seu documentário, tem um momento que você chama um jornalista de mentiroso por uma noitada na Seleção. Aquilo era verdade?
— Se não me engano, estava em Teresópolis. Na verdade, eu realmente tinha saído, e a gente estava, eu e outros jogadores, que aqui não diz respeito falar os nomes, que devem estar casados. Tinha umas mulheres com a gente na mesa, o cara fez matéria especificando que uma daquelas mulheres da mesa era minha. Poderia até ser, mas p... A mulher estava comigo ali, estava eu e mais quatro e três mulheres. Aí o cara colocou que uma das mulheres era minha, que a gente saiu junto e isso era mentira. Por isso que cheguei para ele e a gente teve aquele papo um pouquinho mais exaltado (risos).
Romário com o troféu da Copa do Mundo de 1994 — Foto: Alessandro Sabattini/Getty Images
Como você vê hoje que a distância entre jogador e a imprensa é tão grande?
— Eu não posso falar por vocês, mas hoje fazendo um pouco esse papel... As coisas são bem complicadas. P..., para chegar num cara, você tem que falar com 40. É f... O que passa para representante, agente, emissário, enfim... Para chegar num cara lá atrás isso chega até distorcido. A situação, eu prestei atenção e vi, hoje, posso assegurar que a relação jornalista, imprensa com jogador de futebol, realmente é muito mais difícil, muito mais complexa do que na minha época.
A entrevista que você fez com o Raphinha, se fosse de uma imprensa tradicional, provavelmente a reação do jogador seria outra. Mas você sente que eles ficam mais espontâneos?
— Sim, espero que eles estejam sempre espontâneos. E quem me conheceu muito, quem fez muita entrevista comigo, eu nunca montei uma pauta. Nunca falei para alguém do meu lado para falar com alguém de vocês: “ah, não pergunta isso, pergunta aquilo...”. Sempre fui um cara bastante tranquilo em relação a isso, eu tinha na minha cabeça e tenho até hoje, como eu estou dando essa entrevista e quando eu vou entrevistar, as perguntas são feitas de uma forma que você pode fazer ou não, e quem vai responder, responde se quiser. Eu, algumas vezes, raríssimas vezes, disse: “pô, essa eu passo. É melhor não responder”.
— Em relação ao Raphinha, eu acho que ele é um moleque que tem muita personalidade e vejo, falando dentro de campo agora, que vai ajudar muito o Brasil. Por acaso deu uma falta de sorte, tanto o Raphinha quanto eu, que o Brasil tomou-lhe uma porrada esculachada, foi f.... A Argentina passou por cima, a gente não viu nem a placa. Mas, cara, o Raphinha é um cara que eu tenho maior esperança nele para a próxima Copa do Mundo e vou falar mais. A possibilidade de ser o próximo melhor do mundo é muito grande. O que ficou de lição é que eu conheci um cara que tem muita personalidade. Que hoje em dia no Brasil isso aí é um pouco complicado.
O baixinho marrento é o personagem que você criou para enfrentar esse mundo do futebol, de câmeras, de entrevistas? Foi uma autodefesa?
— Sempre fui assim, não é personagem não. Independentemente de qualquer coisa, desde moleque sempre tive muita personalidade. Isso eu puxei muito do meu pai. Sempre fui um cara de coragem, de falar aquilo que tenho vontade, de dizer aquilo que tenho condições de fazer e antecipar aquilo que vou fazer. Claro que nem sempre a gente acerta, mas na maioria das vezes tive a felicidade de acabar fazendo o que eu disse que ia fazer. Eu nunca fui um personagem, o Romário sempre foi esse cara real. Até hoje.
Senadores Jorge Kajuru e Romário são presidente e relator da CPI, respectivamente — Foto: Roque de Sá/Agência Senado
Uma história do seu início que mostra isso foi quando você comunica ao presidente do Olaria que ia para o Vasco. Ele proíbe, mas você enfrenta. Como foi isso?
— Teve um jogo Olaria e Vasco, e a gente ganhou de 4 a 3, de 3 a 2, acho, e eu fiz os gols. E aí o Vasco se interessou por mim. Meu pai conversou com o pessoal do Vasco na época, ficou tudo certo, e eu falei para ele me liberar. E ele falou que não ia me liberar, eu falei que ia de qualquer jeito. Naquela época, apenas um time, no caso o Olaria, não dava liberação e aí você tinha que ficar um ano sem atuar em jogos oficiais. Eu cheguei a ficar um ano, próximo disso, mas depois de alguns meses acabou acertando e eu fiquei no Vasco tranquilo, mas foi realmente isso. Ele falou que não ia me liberar, eu pedi para liberar, ficou aquele tumulto e eu definitivamente meti o pé do Olaria.
Romário é carregado por torcedores do Vasco em São Januário, após bicampeonato carioca em 1987-88 — Foto: Ricardo Beliel
Perdeu a chance de fazer mais uns gols nesse ano parado?
— Ah, perdi uns 30 golzinhos com certeza.
O que você fez com o primeiro dinheiro bom que você ganhou no futebol?
— Comprei uma casa para a minha mãe em Jacarepaguá. A gente morava na Vila da Penha. Isso foi quando eu fiz o primeiro bom contrato, vamos dizer assim, no PSV. Em 1988, se não me engano. Na verdade, eu fiz contrato no Vasco em 1986 e 1987. Contrato bom, mas ainda não era contrato do nível de comprar uma casa do tipo de casa que comprei para a minha mãe. E nesse outro foi isso. Uns compravam carro, cordões, eu comprei uma casa (risos).
Você comprou um prédio também para a sua família?
— Foi, logo depois, eu tinha oito familiares que moravam na favela do Jacarezinho, minha avó e mais sete tios. Eu montei um prédio, fiz um prédio para eles na Vila da Penha, o prédio está lá até hoje. Muitos deles ainda moram lá.
Teve uma vez que você tirou um monte de familiar de lá. Por quê?
— O que que era o combinado: "eu vou deixar vocês morarem aqui dez anos. Vocês não vão pagar nem condomínio nem água e nem luz, nem telefone. P... nenhuma. Eu vou pagar. Daqui a dez anos, vocês começam a pagar as contas de vocês". Dez anos depois eu fui lá. Eles acharam que estavam no direito de continuar não pagando. Aí eu dei mais dois anos. Foram 12 anos.
— No décimo terceiro ano uma família que era da minha tia com a minha prima, sobrinho e tal, falou que não ia pagar, que ia ficar naquela mesma... Então está bom, a gente vai botar vocês na Justiça. E eles foram para a casa do c... Justamente por isso (risos).
É quando você fala quem tem filho grande é elefante?
— É, quem tem filho grande é elefante, exatamente.
Dona Lita, mãe de Romário, morreu aos 86 anos — Foto: Reprodução
O sequestro do seu pai foi pouco antes da Copa. Como foi aquele momento?
— Pô, cara, foi talvez o momento mais triste que eu passei. Claro que a morte do meu pai, não tem nem como comparar. Era março de 1994, eu estava no auge da minha carreira jogando no Barcelona. Eu lembro que meu pai tinha sido sequestrado um ou dois dias antes do jogo do Barcelona. Os jogadores, o próprio Cruyff, entenderam que era para eu voltar. Eu falei que não, não ia voltar. Quando voltei, cheguei ao Brasil no dia seguinte, graças a Deus meu pai já tinha sido liberado, tinham estourado o cativeiro. No final, acabou dando tudo certo. Mas foi um momento muito triste, principalmente para o meu irmão, minha irmã e minha mãe que viveram isso aqui. Eu ainda estava meio que em Barcelona, claro que 24h me comunicando com eles. Mas foi difícil.
Você sempre foi autossuficiente. Hoje você é presidente de clube e não pode fazer gol. É senador, mas depende da maioria. É avô e não pode dar ordem no neto. Como é essa face do Romário?
— As coisas são bem diferentes da época que eu tinha o controle. Mas a idade faz a gente amadurecer, crescer e entender algumas coisas. Por exemplo, presidente do America. Cara, tem cada coisa que é f... Os caras fazem dentro de campo e dá uma raiva do c... Mas fazer o quê? Eu tenho que continuar pagando o cara todo mês e torcer para que resolvam. E no senado é exatamente isso. Nós somos 81, vários senadores têm seus projetos, mas para se transformarem mesmo em projeto, para irem para sanção, têm que ter a aprovação a metade mais um. São coisas que totalmente fogem do meu controle. O menos importante dessa história é o caso dos meus netos. Porque ser avô é bom para c... Cheguei a essa conclusão. Está rindo, está contigo. Está chorando, bota para os pais e está tudo certo.
Nesse novo mundo depois do futebol, onde você acha que se sai melhor?
— Cara, eu acho que, neste momento, tenho certeza que me saio melhor como senador. Entrei com o objetivo de ser a voz e fazer com que o segmento das pessoas com deficiência tenham visibilidade, voz no país e possam ser o que eles são. Então de lá para cá eu consegui construir várias coisas, vários projetos, tanto como autor quanto relator. Tenho bastante consciência da minha representatividade no Congresso Nacional, principalmente nessas causas, no esporte, na saúde também. Eu me considero um senador muito, muito, muito bom.
Tudo isso começou com a chegada da Ivy. Como foi aquele momento?
— Na verdade, quando a mãe dela fez o exame, alguns dias antes do parto, a princípio era 99,9% de chance que seria mais um filho igual os outros cinco que nasceram sem nenhum tipo de deficiência, sem nenhum tipo de problema. Mas acabou saindo, nascendo com Síndrome de Down. A gente ficou saindo tipo meia hora ou uma hora depois. E, cara, nada na minha vida foi à toa. O papai do céu jogou esse anjo no meu colo e falou: “já que tu diz que eu apontei pra você e falei que tu é o cara, agora mais do que nunca vai ter que ser o cara”. Então assim, eu abracei, a minha família abraçou, é a minha princesa e vai ser eternamente minha Ivy. Com certeza ela me fez mudar o ritmo, o rumo da minha vida, principalmente em relação à política.
Você viveu pressão também na política. Foi muito cobrado para ir contra contra o ministro Alexandre de Moraes, uma candidatura mal-sucedida ao Governo do RJ. Como foi viver isso?
— A pressão existe. São pessoas diferentes, tanto no futebol quanto na política. Eu, graças a Deus, convivi desde os 18 anos até 42 anos, acho, no futebol e estou há 14 anos político. Eu consigo ter boa relação com isso, conviver bem com esse tipo de pressão. Sei dos meus compromissos, sei das minhas obrigações. As pessoas quando votam em você, votam com pensamento que vai fazer tudo aquilo que ele quer que você faça ou que ele entenda que você faça.
— Independentemente dessa última coisa que teve com o ministro Alexandre de Moraes, tem sempre pressão para a gente votar em alguma coisa. A minha vida eu sempre conduzi de dentro para fora. E nunca vai deixar de ser assim. O meu entendimento é o que mais vale nas minhas condutas. Tanto como pessoa na minha vida particular, hoje como apresentador e, principalmente, também como senador. Eu procuro sempre entender o que é bom realmente para a nossa população, dar uma melhora, uma qualidade de vida melhor para ela. E eu vou por esse lado.
Onde é mais difícil de transitar, no mundo da bola ou da política?
— Eu sempre transitei muito bem no mundo da bola, por mais que seja um cara polêmico, que as pessoas me chamam de marrento, sempre defendi muito a minha classe. Vocês que acompanham, sabem disso. Na política não é diferente, eu não faço inimigos. Eu não sou um cara vou ao plenário para ficar falando de A, B ou C. Faço parte de um partido, que é o PL, de direita, mas as minhas ações sempre foram de centro. Tenho algumas coisas da direita, como tenho também algumas coisas da esquerda. Sou um cara que brigo bastante pela minoria, respeito o pensamento e a ideia, as ideologias das pessoas, mas tenho forma de seguir e de fazer política e de viver que é a minha forma e ninguém vai me tirar.
Como vê esses últimos anos da Seleção?
— A gente tem sofrido muito. Nesses últimos dez anos, a Seleção está muito longe de mostrar o que o Brasil é, ou melhor, que o Brasil foi, de longe, o melhor futebol. Nós temos muito bons jogadores, embora o Neymar... E vamos botar o Vini também, que está nesse momento bem legal, principalmente no Real Madrid. Jogadores que têm bastante condições, que até merecem realmente colocar a camisa da seleção brasileira. Mas o que eu tenho notado é que há uma desorganização muito grande em todos sentidos. Principalmente dentro do campo, nesses últimos quatro, cinco treinadores que a Seleção Brasileira teve. Primeiro entendo que a CBF já errou lá atrás, quando o Tite foi técnico da Copa do Mundo. Ele perdeu e continuou. Na minha opinião já tinha que ter mudado o ciclo ali.
— Mas trazendo para hoje, nós estamos muito longe de um futebol convincente, um futebol que, realmente, não é que dê medo, porque talvez o Brasil nunca mais vá dar medo. As pessoas e os adversários não vão ter medo do Brasil. Lá atrás já teve, respeito e medo. Mas hoje nem respeito tem, isso é muito ruim. É uma m... (O povo está) descrente.
— A Seleção não move mais o brasileiro. Muitas vezes, quando a seleção brasileira está jogando, você não vê nenhum entusiasmo por parte dos brasileiros. Primeiro, não fazem nem questão de ver. E o pior, de saber o resultado. Significa que a Seleção está num momento muito difícil, muito complexo.
Você se arrepende daquelas caricaturas do Zagallo e do Zico que você fez lá no Café do Gol há muitos anos?
— Financeiramente me deu muitos problemas. Perdi um dinheiro para eles. Eu não sei se a palavra é arrependimento, mas vamos trazer pra hoje, talvez eu não faria. Mas, cara, na verdade, os sócios no Café do Gol, fizeram aquela porta. Tipo de coisa que acharam que eu ia ficar amarradão por ter sido cortado da Seleção, do c... Só que quando eu fui ver, não fui o primeiro a ver. Alguém da Globo viu o primeiro. Foi o Regis (Rosing). "Alegria, alegria". Foi o Regis que viu e botou essa p... no ar, e aí quando eu cheguei já tinha acontecido e essa conta ficou para mim.
Esse episódio faz parte de três que marcaram sua vida. A Copa de 1998, as Olimpíadas de 2000 e a Copa de 2002. Você não vai em nenhuma. Em qual se sentiu mais injustiçado?
— Injustiçado eu fui nos três, mas o que mais me dói é 2002, porque ganhou, poderia ter outro título. Já os outros que perderam, f...-se.
Felipão, há pouco tempo, disse que foi uma questão tática. O que achou?
— Eu ouvi o Felipão falar que a questão foi tática, que a questão foi técnica, e eu acredito que realmente tenha sido isso, porque não tem outro motivo. Muitos falaram que eu não tinha respeitado, que tinha traído a confiança dele, tinha feito coisas, que tinha levado aeromoça no hotel, que eu tinha transado com a aeromoça no dia anterior e não foi p... nenhuma disso. Se foi isso aí, é o direito dele e eu respeito.
Você foi capitão no primeiro jogo dele?
— Fui, capitão, contra o Uruguai. Então, foi nessa noite do jogo que falaram para ele que eu saí com uma comissária, uma aeromoça que tinha dormido lá. Ou seja, perdi a Copa e não comi a p... da mulher.
Em 1998, você se lesiona, é cortado e volta a jogar durante a Copa. Achava que tinha condições de jogar?
— Eu tinha falado para eles que me recuperaria ao longo da Copa do Mundo, não sei se no terceiro jogo da primeira fase ou para o quarto jogo. E assim que eu me recuperei, pedi para o Kleber Leite, que era presidente do Flamengo na época, marcar esse jogo (amistoso). A gente jogou, se não me engano, vencemos por 1 a 0. Eu mostrei para eles que eu estava recuperado. Na verdade, aquela comissão, não acreditou no que eu tinha me comprometido com eles.
Teve um revanchismo do Zagallo e do Lídio?
— Ah, teve, com certeza. Infelizmente... Eu respeito muito aqueles que foram, mas já falei muito deles enquanto estavam em vida. Prefiro não falar mais.
Você falou que o Muller não te queria em 1990. É muito comum isso no futebol?
— Trairagem tem. Pelo menos tinha na minha época. Principalmente se for um cara que é da sua posição e existe probabilidade de você ficar no banco para aquele cara. Antigamente o cara puxava mesmo a corda para esse malandro cair.
E o caso da Festa da Uva, na saída do Flamengo. O que aconteceu?
— Segundo o cara da época, o coordenador, o gerente de futebol que tinha lá (Nota da redação: refere-se a Gilmar Rinaldi, ex-goleiro) , me mandou embora por causa disso. Mas foi mais do que esclarecido. Eu tinha um contrato em vigor, eles tentaram me dar justa causa, eu ganhei por unanimidade na primeira instância, na segunda instância, o Flamengo me pagou tudo aquilo que tinha que pagar. E foi bastante demonstrado que eu saí para jantar com um diretor e um supervisor do Flamengo. Então não saí escondido, muito menos entrei escondido. Eles estavam chegando, queriam mostrar que quem manda eram eles, e tentaram me pegar de bode expiatório. Acabou não dando certo e, infelizmente, eu acabei saindo do Flamengo. Uma saída que poderia ter sido de uma forma bem diferente.
Essas desavenças que você teve na vida, com Pelé, Zagallo, Zico... Qual você olha para trás e pensa que vacilou? Você está voltando a falar com o Edmundo? Ele vem ao seu programa?
— Cara, esse negócio... Eu não me arrependo de ter tido os problemas que tive com as pessoas. Aqueles que eu consegui resolver, eu resolvi. Com Vanderlei, Zico... O Edmundo, a gente se desentendeu por muitos anos. Existe uma possibilidade, independentemente de vir ao programa ou não, de se cruzar um dia e voltar a falar. Eu falei: "60 anos faz a gente repensar um montão de coisa. Olhar para frente e resolver os problemas".
Edmundo é o cara mais maluco que você conheceu no futebol?
— Piroc... completo.
Mas vocês se entendiam bem né?
— Eu era outro. A gente empatava (risos).
Você sempre foi muito tranquilo em campo, mas teve algumas brigas. Uma delas para defender o Edmundo, inclusive...
— Comprei o barulho dele, daquele otário (risos).
— O cara veio por trás do Edmundo, largou o braço. A sorte é que não bateu aqui, bateu tipo isso aqui, ó (mostra o punho). De qualquer jeito ele caiu. Aí eu vim, dei-lhe uma voadora, achando que o cara ia cair. O cara...dois metros, pow, foi tipo goiabeira assim, envergou e voltou. Eu falei: "ai, c...” (risos). Aí fui armando para trás e chegou todo mundo (risos).
— O do Cafezinho, eu lembro que fiz um gol, ele ou alguém jogou umas conversas fora lá, eu fiquei tão puto que saí pegando ele. Teve o cara da galinha também no Fluminense. Teve uma com o Renato Gaúcho no Vasco x Flamengo. Acho que eles fizeram gol, Renato quis fazer gracinha, a gente se empurrou. Assim, eu já participei de umas porradazinhas. Brasil x Chile eu fui expulso, o cara mordeu meu peito, eu dei uma porrada nele. Barcelona e Sevilla, com Simeone. Mas tem umas derrotinhas também (risos).
Quando está no Barcelona, as histórias são que você levava quatro namoradas para o camarote num jogo e depois do jogo você ia escolher com quem sairia...
— É, estava nessa fase. Quatro não, às vezes tinham seis. Mas dessa fase eu passei. Esses amigos são para isso, para administrar, faziam tudo certinho. Dava tudo certo.
Você faz procedimento, botox, alguma coisa?
— P... nenhuma. Aqui é natureba.
Renato disse que ia chegar aos 70 jogando futevôlei. Você também?
— Vou. Eu jogo futevôlei praticamente todo feriado, sábado e domingo. E aqui na minha casa segunda-feira à noite. E umas três vezes por semana dou uma malhada. Ou seja, todo dia eu faço alguma coisa. Eu acredito que vou continuar com saúde e disposição para continuar fazendo isso. Tenho certeza, papai do céu vai continuar me iluminando, para chegar aos 70... claro, a proporção vai diminuir um pouco, mas vou continuar fazendo.