Nos bares lotados no bairro de Botafogo, o calor do verão carioca se encontrou com o futebol num sábado à tarde em que ele geralmente já está de férias. Centenas de torcedores do Flamengo consumiam o chope gelado em doses generosas que faziam os garçons trabalharem freneticamente, correrem de um lado para outro, alguns à espera de uma brecha para a espiada no telão que transmitia a final do Mundial de Clubes. A vitória sobre o Liverpool não veio, diferentemente das tulipas suadas, mas não houve ressaca: o saldo do rubro-negro foi de alegria. Predominou a sensação de dever cumprido.
Durante o jogo, o nervosismo. Olhos vidrados no telão e poucos motivos para reclamar. A esperança crescia a cada desarme da defesa no primeiro tempo, a cada ataque do time de Jorge Jesus que mostrava não se intimidar diante do atual campeão europeu. O intervalo veio acompanhado de aplausos. Era possível sonhar. Para os garçons, foi a chance de respirar.
- Vamos levando, o pessoal entende o meu lado, às vezes fazem o pedido e eu esqueço - afirmou o garçom rubro-negro Cláudio Serra, de 39 anos, com uma camisa do Flamengo em uma das mãos.
No segundo tempo, a confiança seguiu viva, mesmo com a queda de rendimento da equipe. A torcida cantava para mostrar que ainda acreditava, mas se silenciou quando o VAR foi acionado para chegar uma entrada de Rafinha em Mané. Foram mais de dois minutos de silêncio e tensão até a arbitragem concluir que não foi pênalti. A torcida explodiu. Foi quase o primeiro gol do Flamengo na decisão.
Tempo regulamentar encerrado, a torcida correu para os banheiros do bares, todos apertados, consequência do caráter diurético da cerveja ingerida como se fosse água. "Vamos, gente, acelera o xixi que o intervalo até a prorrogação começar é mais curto", gritavam os torcedores na fila. Entre um torcedor que entrava na cabine e outro que saía, "dá-le, dá-le, dá-le, mengo, pra cima deles, Flamengo...".
Começou a prorrogação e não demorou para sair o gol de Roberto Firmino. Silêncio, algumas reclamações pouco convictas e o esforço do torcedor abnegado em cantar e convencer o vizinho de que a virada era possível. Quando Lincoln perdeu a chance já no fim do jogo, alguns torcedores menos ligados ao futebol e mais preocupados em socializar no verão carioca nem perceberam. Depois disso, o fim da partida veio a jato.
E então a torcida começou a cantar. Alguns com semblante de choro, outros em prantos no ombro amigo, mas a maioria, serena. A tristeza pela derrota não foi maior do que a sensação de que o time cumpriu seu papel, do que o orgulho dos meses mágicos do Flamengo no futebol.
- Enfrentamos de igual para igual o melhor time do mundo. O Santos pegou o Barcelona e perdeu de quatro. O River veio aqui e nem chegou à final. Ninguém nunca ganhou como o Flamengo ganhou esse ano - afirmou Fernanda Paz, contadora, acompanhada da filha e da sobrinha.
Não houve quem se revoltasse, rasgasse camisa, xingasse Deus e o mundo pela falta de sorte na decisão. O bicampeonato mundial não veio, mas fica a certeza de que, com o momento que o clube vive, não faltarão oportunidades para isso acontecer.
- O time honrou o manto. Jogou pau a pau com o Liverpool e só perdeu porque cansou. Como o Bruno Henrique disse, estamos em outro patamar. Vamos vir em 2020 para ganhar a Libertadores e ano que vem vamos ganhar o Mundial de qualquer jeito. Para quem torceu contra, só tenho a dizer, o Flamengo está em outro patamar. Aceita ou morde as costas - afirmou o profissional de TI Lucas Correia, de 27 anos, acompanhado de duas amigas.