Partiu Santiago? Torcedores do Flamengo enfrentam percalços para ir à final da Libertadores

O que você seria capaz de fazer para acompanhar seu clube numa final de Libertadores em outro país? É o que se perguntam neste momento os torcedores do Flamengo, que se classificou para a final depois de eliminar o Grêmio na última quarta e vai enfrentar o River Plate no dia 23 de novembro, em Santiago, no Chile. E tem cada história...

Tem, por exemplo, quem já tenha comprado há tempos a passagem para a capital chilena, mas ainda está sem ingresso. Tem quem já está com tudo pronto e só esperando o dia da decisão. Tem torcedor pensando em fretar um voo. E tem um até que vai sair da Austrália.

A final da Libertadores e Flamengo será no dia 23 de novembro, às 17h30 (de Brasília), no Estádio Nacional de Santiago, no Chile.

Após a confirmação da presença do Flamengo na decisão em Santiago, os preços das passagens aumentaram e há bilhetes acima de R$ 7 mil, somente o trecho de ida.

Confira as histórias:

Só não dá para ir correndo de novo, né?!

Gustavo Zeitone e a esposa Paula, torcedores fanáticos do Flamengo — Foto: Arquivo Pessoal

Gustavo Zeitone e a esposa Paula, torcedores fanáticos do Flamengo — Foto: Arquivo Pessoal

O economista Gustavo Zeitone, de 43 anos, comprou faz tempo a passagem para Santiago e os ingressos para a final da Libertadores. Foi o Flamengo passar pelo Internacional nas quartas, e o estalo veio à mente. "Quando senti que o time engrenou, decidi que ia acompanhar tudo que eu pudesse", conta ele. Também, pudera: na última vez em que o Rubro-Negro faturou a competição, em 1981, Gustavo tinha apenas oito anos.

Ele comprou dois ingressos. O segundo será para a esposa Paula, fiel companheira de Maracanã, mas só se conseguirem uma passagem em conta para o Chile; ou de algum amigo "alucinado" que esteja disposto a comprar. Bom, pelo menos dessa vez o rapaz não vai correndo para o estádio, não é verdade?

– Eu fui a Porto Alegre no jogo contra o Grêmio. E foi engraçado porque o voo atrasou, chegamos lá quase às 20h. O ônibus dos torcedores do Fla ia sair, mas tinha que esperar a escolta da polícia. Só que a escolta nunca chegava, eu estava nervoso. Deu 20h15, 20h30. Eu pensei: quer saber? Botei no mapa e, como estava chovendo, fechei o casaco até o pescoço e corri cinco quilômetros até o estádio. Levei uns 40 minutos e cheguei lá encharcado (risos).

Na conta da chefe gremista

Rafael Monteiro, torcedor do Flamengo, vai a todos os jogos no Maracanã — Foto: Arquivo Pessoal

Rafael Monteiro, torcedor do Flamengo, vai a todos os jogos no Maracanã — Foto: Arquivo Pessoal

Estudante de Recursos Humanos e funcionário de um comércio no Rio de Janeiro, Rafael Monteiro, de 24 anos, está no Maracanã uma semana sim, e na outra, também. Mas a única vez em que saiu do Rio para ver a equipe jogar foi no Fla-Flu que aconteceu no Pacaembu em 2016. Fora isso, jamais. Agora ele vai para Santiago - bom, ao menos tem passagens e hospedagem pagas, falta só o ingresso. E vai graças à sua chefe, que é... gremista.

– Como eu trabalho numa loja, novembro é a época em que está chegando a carga de Natal, perto de dezembro. Eu conversei com minha chefe, perguntei se tinha como tirar férias para ir para Santiago. E ela topou. Detalhe: ela é gremista. Comprei a passagem no cartão dela, e (antes da semifinal) ela até brincou: "Sabe que vai você ou eu, né?" - recorda ele, aos risos.

– Estou pagando ela mensalmente, já descontando direto do meu salário - completa ele, que calcula um gasto total entre R$ 5 e 6 mil.

Bate e volta Sydney-Santiago

Se quem é do Rio já fica frustrado se não conseguir, imagina para quem vai sair do outro lado do mundo? É o caso de Gustavo Guimarães, de 32 anos, gerente de uma rede social de negócios em Sydney, na Austrália. Morando no país desde 2015, ele vem ao Brasil uma vez por ano e esteve, por exemplo, na estreia de Jorge Jesus no Maracanã, na goleada por 6 a 1 sobre o Goiás.

Dono de cadeira cativa no Maracanã, ele não é sócio-torcedor e tentará ingresso de camarotes ou com cambista em Santiago. Otimista, comprou a passagem e reservou hotel logo após a classificação nas oitavas sobre o Emelec e vai encarar sozinho uma maratona de 13 horas de voo e 14 de fuso horário para um bate-volta de três dias. Só falta combinar com o chefe.

– Vou sexta na hora do almoço, chego na própria sexta e volto domingo à tarde. Perderia metade do dia de trabalho na sexta e segunda. Meu chefe é inglês, se amarra em futebol, é torcedor do Queens Park Rangers e adora o Julio Cesar. No primeiro jogo da semifinal, disse para ele que só iria no horário do almoço porque era o jogo mais importante do meu time em 35 anos. Ele se amarrou. Não falei ainda (sobre a viagem), mas vai ser de boa. Nossa cultura é muito flexível. Eles confiam em mim para entregar, independentemente de onde estiver.

Casa alugada para 11 pessoas

Leandro Morais e sua inseparável roupa desde a classificação sobre o Emelec — Foto: Arquivo Pessoal

Leandro Morais e sua inseparável roupa desde a classificação sobre o Emelec — Foto: Arquivo Pessoal

Leandro Morais é mais um caso de torcedor que já garantiu a viagem mesmo sem ingresso. Mas ele fez o upgrade do seu plano de sócio-torcedor antes da semifinal e está confiante em conseguir comprar quando abrir o último lote da venda. O dentista de Campinas, de 38 anos, juntou-se com mais 10 pessoas e alugou uma casa em Santiago com seis diárias, ao preço de R$ 200 para cada um. A passagem aérea ele comprou após a classificação nas quartas de final sobre o Inter e chegará à capital chilena na quarta-feira, três dias antes da final. Junto com uma superstição:

– Estou sempre com a mesma roupa. É a mesma camisa, mesma bermuda, mesmo boné... Tudo igual desde o jogo com o Emelec. Já estava olhando e quase comprei antes do primeiro jogo contra o Inter no Maracanã, mas esperei acabar. Voo direto estava R$ 1.300 e quando acabou o jogo pulou para R$ 2.000. Consegui um por 1.400 fazendo conexão. Somos 11, ninguém conseguiu ainda. Se não der, arrumo na hora ou vejo um bar lá perto. Mas estou disposto a comprar. Está rolando pacotes de viagem com promessa de ingresso, na pior das hipóteses compro um – avisou, ficando com receio só de cambista:

– Em 2017 eu fui na final da Champions Real Madrid x Juventus, em Cardiff, e consegui por um site. Comprei de um holandês, sem conhecer, e o cara entregou na caixa postal. Mas com chileno nessa crise, corre o risco de ficar sem os dois: sem dinheiro e sem ingresso.

Vai rolar sorteio?

O economista Leonardo Melo, de 33 anos, vive situação parecida: usou as milhas comprar passagem após a classificação para a semifinal; vai chegar sexta e voltar domingo; reservou hotel com reembolso em caso de desistência... Mas com uma peculiaridade: ele divide o plano mais caro de sócio-torcedor junto com três amigos. O +Paixão normalmente dá direito a quatro ingressos, mas fora de casa contra o Grêmio na semifinal ele só deu direito a um (a capacidade era de 4.000). Como só um deles podia ir, não teve problema. Agora, a expectativa é que volte ao normal por ser uma carga três vezes maior.

– A gente ainda não sabe como vai ser. Um está morando em Barcelona e já comprou passagem também, mesmo sem ingresso. Tenho vários amigos nessa situação, pelo menos uns 10, e só dois ou três conseguiram comprar com a Conmebol. Está todo mundo na expectativa, um ajudando o outro. Não imaginava essa falta de informação e dificuldade de comprar ingresso. Mas estou tentando de todas as maneiras, ainda tenho esperanças.

– Já vi o Flamengo com tanto time ruim, não vou perder essa final com um dos melhores times da história. Já fui a Potosí, na Bolívia, ver Roni, Souza, com um frio... Acho que mereço (risos). Vou de qualquer jeito. Ficamos 30 e poucos anos esperando, não posso perder essa oportunidade.

Voo fretado x ônibus

João Mariano com a pequena Manuella: "nasceu no ano do título da Libertadores" — Foto: Arquivo Pessoal

João Mariano com a pequena Manuella: "nasceu no ano do título da Libertadores" — Foto: Arquivo Pessoal

Há também aqueles que não quiseram arriscar e agora precisam não só correr atrás de ingressos, como também de passagem e hospedagem. É o caso de João Mariano, professor de educação física de 34 anos. Ele conseguiu mudar seu plano de de sócio-torcedor +Amor para + Paixão antes que o Flamengo bloqueasse novas adesões e upgrades até definir o critério para as vendas da final . A confiança em conseguir comprar o ingresso é grande; lugar para ficar em Santiago ele já tem, na casa do primo, o problema agora é a viagem:

– Como eu trabalho, sou professor em escola, para mim é complicado faltar ao trabalho. Tenho uma filha pequena também, de quatro meses, então a ideia é ir sexta à noite ou de madrugada e voltar na madrugada de domingo. Estava monitorando antes os voos, mas agora estão todos esgotados. Não comprei porque estava uma fofoquinha de que iria mudar o país, e achei arriscado comprar antes do jogo contra o Grêmio. Estou totalmente arrependido. Mas com certeza vou para esse jogo ainda, não desisto. Como vai ser e quanto vou ter que gastar que é a questão.

– Tem muita gente montando grupos para fretar avião. Estão falando em R$ 5.000 a R$ 6.000, mas com hospedagem. Para mim não interessa porque tenho família lá. É o terceiro ou quarto que vejo oferecendo voo fretado. Mas estou pesquisando até para ir de ônibus. Vou fazer o possível e o impossível para ir a esse jogo. E depois, para a guerra de conseguir ingresso, mas tenho certeza de que vou conseguir.

Há uma caravana sendo organizada do Rio de Janeiro para Santiago, com ônibus leitos e semi-leitos. O comboio deixa o Rio de Janeiro na manhã do dia 20 de novembro (quarta-feira) e sai do Maracanã. Até Santiago, serão cerca de 50 horas de viagem.

Fonte: Globo Esporte