21 anos, 122 jogos e 4 gols marcados com a camisa do Flamengo : a história de Wesley teve seu capítulo mais simbólico no último dia 6 de março, quando foi convocado pela primeira vez para a seleção brasileira por Dorival Júnior . Porém, o que poucos sabem, é que o promissor lateral precisou de muita paciência, resiliência e dedicação para superar as negativas e percalços da difícil trajetória até a amarelinha.

Após o anúncio dos convocados, Dorival Júnior exaltou Wesley e relembrou época que trabalhava no Flamengo ao lado do já promissor lateral-direito.

"Desde 2022, eu já conhecia o Wesley e o trazia para treinamentos (no Flamengo). Era um jogador promissor, mesmo que nós tivéssemos três laterais que atuavam com frequência. Ele sempre chamou muita atenção, um jogador muito interessante. De setembro para cá, ele conseguiu um salto de qualidade que o credenciou a um momento como esse. É um primeiro momento dele aqui dentro, vamos ver a reação, sentir a condição que ele está. E torcemos que ele possa repetir as atuações que vem tendo pelo Flamengo", disse o treinador.

Presente na vida de Wesley desde que o lateral tinha 11 anos, Balo, agente do jogador, concedeu entrevista exclusiva ao ESPN.com.br e contou toda a trajetória do maranhense, desde quando chegou a Florianópolis, em Santa Catarina, para iniciar o sonho de ser jogador de futebol. O que poucos sabem é que, quando criança, Wesley atuava no meio-campo, como volante, e não como lateral.

"O Wesley está fazendo uma função na lateral, mas vocês vão ver futuramente ele jogando muito por dentro. Ele começou como volante na escolinha. A primeira tatuagem dele é ele com a camisa 8 do Figueirense .”, revelou Balo, com quem tem um vínculo muito afetivo.

"Meu destino se cruza com Wesley em 2011, em Santa Catarina, quando ele tinha 11 anos. O menino, desde o primeiro dia, me mostrou muito coração. Ele tinha sangue nos olhos. Foi ali que a gente iniciou nosso trabalho e um vínculo afetivo.", relembrou.

"Quando Wesley foi reprovado a primeira vez no Figueirense, perguntei para alguns contatos do clube o porquê. Me disseram que ele precisava melhorar no último terço do campo. Continuamos trabalhando. Retornamos uma segunda e uma terceira vez, e ele foi reprovado novamente. Levei ele ao Atlético Tubarão , também de Santa Catarina, e também foi reprovado."

"Por isso que falo em propósito. Qualquer outro agente ou empresário que não tivesse um vínculo afetivo, já teria o deixado. O nosso vínculo era muito forte como é até hoje, a gente foi resiliente, meu primeiro objetivo era não perder ele para a vida.”, completou.

O sonho começa a acontecer

Após as negativas, Wesley e Balo não desistiram do projeto que culminara, anos depois, em uma convocação à seleção. Finalmente aceito no Figueirense, o jogador contou com a sinceridade do treinador da época para tomar uma das decisões mais importantes de sua vida.

"Wesley volta ao Figueirense numa quarta oportunidade. Falei para o diretor que ele estava pronto. Tinha 16 anos. Muitos falam que ele foi recusado e dispensado nessa quarta vez, mas não é verdade. O Figueirense passava por uma dificuldade financeira muito grande, e o treinador na época, Fernando Gil, foi sincero ao dizer que não teria como oferecer boas condições de trabalho. Quem quisesse ficar, teria que estar consciente disso. Wesley me ligou e explicou a situação.", disse Balo.

"Coincidentemente, o ex-treinador do sub-20 do Figueirense tinha sido mandado embora e comandava o sub-17 do Tubarão . Eu liguei para ele e expliquei a situação. Ele quis o Wesley. Só que logo depois veio a pandemia, ele volta para minha escolinha e fica treinando seis meses."

"Ele morava perto da minha escola, ia de bicicleta para o treino, correndo na chuva, no frio. Chegava lá com o chinelo dele, sacolinha com a chuteirinha, regatinha, e o pau torava. A vida dele não foi nada fácil. A mãe dele é uma trabalhadora, uma guerreira. Moravam em um apartamentozinho pequeno alugado, com muita gente, com muita dificuldade para chegar ao final do mês.", relembrou.

"Durante a pandemia, o diretor profissional do Atlético Tubarão me ligou e perguntou se Wesley poderia compor elenco para a Copa Santa Cantarina. Ele vai para o Tubarão e, naquele momento, o lateral-direito do profissional estava passando por uma má fase. O treinador o coloca em três oportunidades, em um campo na chuva. Ele dá aquelas arrancadas e brilha."

A chegada ao Flamengo

Com boas atuações no Atlético Tubarão, de Santa Catarina, Wesley contou com a produção de sua equipe para fazer alguns vídeos compactando seus melhores lances. Deu certo.

"Estávamos com a avaliação marcada para o Red Bull Bragantino e com algumas outras equipes grandes, pois enviei um vídeo. Após algumas ligações, fomos ao Rio de Janeiro em fevereiro de 2022 para assinar com o Flamengo. No dia anterior, um cara do Red Bull me ligou pedindo, pelo amor de Deus, para a gente ir para lá.", revelou.

"Wesley falou que eu ia decidir. Apostei no Flamengo. A gente foi fazer a avaliação e, 15 dias depois, teve a notícia. Todo mundo falando que o moleque realmente tinha talento, que só precisava ser lapidado.", afirmou.

As metas pessoais

Ao chegar ao Flamengo na equipe do sub-20 B, Wesley e Balo conversavam diariamente e estabeleceram 'metas'. Para o agente, era fundamental o jogador ter em mente que, em breve, estaria junto do elenco profissional rubro-negro.

“Antes de você me ligar, eu estava escutando uns áudios de quando a gente estabeleceu metas. Quando nós chegamos ao Ninho do Urubu, nos primeiros dias, ele tinha sido aprovado para o sub-20 B do Flamengo. O sub-20 B treinava nos campos de trás do CT, e eu dizia para ele: 'Wesley olha onde nós chegamos. No B. Lindo, feliz da vida, demos um passo gigantesco. Só que agora, dentro de dois meses, eu quero que você vá para o A. E então, depois, iremos para o campo 3, 2 e 1, o do profissional. Isso aconteceu", conta emocionado.

Balo fez questão de relembrar o dia da estreia de Wesley como profissional. No dia 9 de dezembro de 2021, Maurício Souza colocou o jovem como titular no duelo contra o Atlético-GO , em Goiânia, na última rodada do Campeonato Brasileiro. O Flamengo perdeu por 2 a 0, mas o agente exaltou atuação do até então desconhecido lateral.

"Wesley teve seis meses de base, passou quase a vida inteira na escolinha. Na estreia contra o Atlético-GO, ele jogou com a camisa 46. Fomos assistir in loco. Ele jogou muito. Posso estar fazendo uma análise junto da emoção, mas se você pegar o jogo, já dava para ver."

Críticas da torcida e ajuda de David Luiz

Sempre lembrado pelos jovens enquanto era zagueiro do Flamengo, David Luiz também fez parte da volta por cima de Wesley no futebol. Alvo de críticas em um período de desempenho irregular do Rubro-Negro, o lateral contou com a experiência do zagueiro para não se abater.

“A virada de chave foi quando Wesley viu que teriam coisas que ele teria que aprender por ele mesmo. Exemplo: 'Wesley, sábado tem jogo. Faz sentido você comer um lanche terça-feira?' E ele teve que aprender.", relembra.

“Eu brinco muito que o Wesley é uma cebola, mesmo para quem o conhece e está no dia a dia com ele. Ele é muito duro, tem uma personalidade absurda, é fechado... Para ver o Wesley chorar, é difícil. Ano passado, fui 18 vezes ao Rio de Janeiro. Sempre estivemos ao lado dele, mas nem sempre falando o que ele queria escutar."

"Tinham coisas que ele tinha que passar e aprender, que não podiam ser feitas como um moleque. Flamengo, redes sociais, mudança de vida econômica, famoso, tudo isso mexe com a cabeça", disse Balo.

"Por muitas vezes, o David Luiz foi uma pessoa com palavras importantes, inclusive chegou a levar o Wesley na igreja que ele frequenta. Tiveram muitas outras pessoas, como o próprio Filipe Luís, que é um cara que sempre falou bem dele mesmo na época de sub-20. O Erick (Pulgar) é um cara que entrosa muito com ele...”

Frustração e lágrimas

A negociação com a Atalanta , da Itália, marcou a passagem de Wesley até aqui no Flamengo. Em 2024, na janela do meio do ano, Flamengo e o staff do lateral receberam uma proposta dos italianos. A oferta agradava todos os lados, e a saída era dada como certa. Porém, um desencontro de datas fez o negócio não se concretizar, e o jogador não conteve a frustração.

"Quando ele não vai para a Atalanta, chora muito. A gente estava com passagem comprada, falei que ele já podia fazer a despedida do Flamengo. Porém, naquele momento, o clube queria muito que ele jogasse contra o Botafogo no domingo e contra o Bolívar na quinta-feira. Tudo certo, contrato trocado, solidariedade do Figueirense, do Tubarão. Tudo certo. Flamengo empurrou o contrato um pouco para frente, e eu entendo. Eu sempre falo que a gente tem sempre três cadeiras para sentar: a nossa, a do Flamengo e a do clube comprador."

"Em nenhum momento fiquei com raiva do Marcos Braz ou do Bruno Spindel. Eles têm a cadeira deles, que precisam defender. Provavelmente existia, dentro do corpo técnico (naquela época comandado por Tite), uma ideia de liberar só depois do Bolívar (na Libertadores). Eu acredito, não perguntei, também não quero perguntar, não me compete, mas eu tenho certeza. Porque, se não houvesse isso, não faz sentido."

"Chegou o contrato, 20 milhões de euros, salário certo, a gente vendo moradia. Tudo certo. Aconteceu o que vocês sabem, um desentendimento das datas do contrato entre Atalanta e Flamengo. Wesley chorou muito, eu chorei também. Pouquíssimas vezes o vi assim. Não o vi chorando nem cinco vezes em dez anos.”, relembrou.

Além de toda a frustração por não ter sido vendido, Wesley ainda tinha que conquistar seu espaço no clube, quando via Varela atuar com mais frequência.

“Ele não era unanimidade para o Tite, a torcida em cima. Ele pensava: 'Vou sair daqui com uma proposta fantástica para o clube e para mim. Sair dessa pressão... Mas não deu certo. Flamengo faz a parte dele. Marcos Braz e Bruno fizeram o que tinha que ser feito, e o presidente da Atalanta ficou com raiva e acabou com o negócio."

"Foi difícil falar isso para o Wesley. A primeira coisa que eu falei foi que sempre devemos agradecer o que a gente tem. Quem te dá de comer, o que mudou sua vida e a da sua família se chama Flamengo. Ele chorou, chorou, chorou.”, desabafou.

Balo contou uma história curiosa ao ESPN.com.br . Com tamanha frustração, Wesley foi 'liberado' por Balo para comprar um carro de seus sonhos.

“Todo menino gosta de carro. Ele queria uma caminhonete, mas falei que só ia comprar na Europa. Falei para ele parar de gastar dinheiro. Nesse dia, quando o negócio com a Atalanta não deu certo, ele chorava, e eu falei: 'Para de chorar, e agora pode comprar sua caminhonete". Risos.”

“Flamengo é gigante, te deu tudo. Seja agradecido, falei isso para ele. Viramos a chave e fomos para frente. Da mesma forma que o Wesley foi muito criticado, todo mundo dizia que o Bruno Spindel e Braz eram maus profissionais por não vender. Em 2022, no primeiro ano do Wesley, o Barcelona veio com uma oferta de 2 milhões de euros (mais de 12 milhões de reais) por empréstimo e 15 milhões de euros (mais de 90 milhões de reais) fixados. Wesley não tinha dado um chute no profissional em 2022. Barcelona olhou e viu que o jogador era diferente, mas Braz e Spindel não quiseram vender, pensaram em fazer uma fortuna."

“É fácil falar agora... Lembra aqueles caras que xingavam eles lá atrás? E agora? Eles (Marcos Braz e Bruno Spindel) acreditavem mais do que eu. Porque eu falo com o coração. Eles disseram que Wesley ia jogar e valer uma fortuna. Está feito. Eles tiveram mérito nisso e acreditaram muito no moleque."

"Será que na Atalanta, se estivesse no banco, seria convocado para a seleção? O que justificaria? Ele jogou ano passado, foi o melhor do Brasil, destaque em todas as finais. O que eu vou dizer dos caras? Ou eles têm bola de cristal, ou entendem”, finalizou.

Assista à entrevista que Wesley concedeu em dezembro de 2024, falando sobre as negociações com o clube europeu:

A convocação

O dia da convocação chegou. Com vôo atrasado, Balo e sua esposa tiveram que correr para estar com Wesley no momento em que Dorival Júnior anunciara os selecionados. O agente ainda falou do vídeo que viralizou nas redes sociais, no qual Wesley tenta acalmar sua filha em seu colo segundos após saber que estaria presente nos duelos contra a Colômbia e Argentina, nas eliminatórias da Copa do Mundo de 2026.

“Dorival não tinha falado com Wesley antes. Ninguém sabia. Eu quase desmaiei, minhas pernas falharam. Eu consegui antecipar um voo para estar com ele. Se você assistir ao vídeo, o menos emocionado é ele. Esse é o Wesley. Ele vai botar a camisa da seleção, vai esquecer quem está contra ele, ele ama jogar futebol, e é isso que ele quer fazer. Simples assim.", disse Balo.

“Nós fomos jantar semana passada com uma pessoa de dentro do Flamengo. Essa pessoa falou que Wesley não pode ser jogador de convocação, mas sim de seleção. Ele respondeu: ‘Tem uma coisa que você não sabe, eu detesto ser banco. Eu vou dar a vida."

Assédio da Europa

Perguntado sobre o futuro de Wesley, o agente não quis entrar em detalhes, mas comentou declaração de Filipe Luís. O treinador chegou a dizer, mais de uma vez, que, em breve, o lateral irá 'escolher' o clube onde irá atuar após o Mundial de Clubes.

"Wesley não lida com o assédio dos clubes da Europa. Ele fala: ‘O que vocês decidirem, eu estou dentro’. Ele tem o desejo de sair, mas isso não mexe com a cabeça dele. Naquele momento, da Atalanta, mexeu por causa do momento que ele estava vivendo. Não é que ele queria ir para a Europa. O momento era ruim, era mais fácil sair daquele turbilhão, sem redes sociais, sem gente chamando ele de bagre. Ele é novo."

“Isso (poder escolher aonde quer jogar) está perto de acontecer. Com a graça de Deus, está indo... Está encaminhado. Ele joga, e a gente faz a nossa parte fora de campo. Vai ser maravilhoso, é diferente ter uma convocação no currículo.", concluiu.

Próximos jogos do Brasil: