Missão Pará: como uma excursão colocou o Flamengo no mapa do futebol brasileiro há 110 anos

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Fundado em 1895, o Clube de Regatas do Flamengo - como o próprio nome diz - deu os seus primeiros passos no esporte com o remo sendo o carro-chefe. O pontapé inicial no futebol aconteceu 17 anos depois, em 1912. Aos poucos, a modalidade foi ganhando destaque e, em dois anos, o Rubro-Negro começou a fazer as primeiras excursões pelo território brasileiro.

Excursão do Flamengo em Belém, em 1915 e 1916 — Foto: Reprodução

O Pará, estado que receberá a decisão entre Flamengo e Botafogo pela Supercopa neste domingo, foi um dos primeiros locais a receber um jogo do clube fora do Rio de Janeiro. Há 110 anos, o Rubro-Negro fez a sua primeira excursão pela Região Norte do Brasil com uma série de jogos justamente em Belém - a sua segunda excursão da história. A primeira foi pelo Paraná, em 1914, para a inauguração da Arena da Baixada. Entre uma e outra, houve uma rápida viagem para São Paulo, em 1915.

E o Flamengo mantém a tradição de rodar o país até os dias de hoje. No início da temporada de 2025, o clube fez as cinco primeiras rodadas do Carioca fora do Rio. O foco do tour foi o Nordeste e passou por Sergipe, Paraíba e Maranhão. Para encerrar, foi até Brasília.

Depois de fazer o primeiro jogo no Rio, na última quinta-feira, na vitória em cima do Sampaio Corrêa, o Flamengo embarcou para o seu sexto destino neste ano: Belém - sem contar a pré-temporada nos Estados Unidos.

Este será o jogo de número 41 na capital paraense: foram 23 vitórias, nove empates e oito derrotas até o momento. Foram 84 gols marcados e 53 sofridos.

Já são mais de cem anos desde o primeiro jogo no estado do Pará, e o ge relembra a história daquela foi a segunda excursão da história do Flamengo .

A cidade de Belém foi fundada em 1616 e para celebrar os seus 300 anos convidou o Flamengo para participar dos festejos. À época, o Rubro-Negro caminhava para ser protagonista no futebol, conquistando os Cariocas de 1914 e 1915, o último de forma invicta.

Foi neste cenário que o time embarcou em um navio para Belém para disputar alguns amistosos entre o fim de dezembro de 1915 e o início de janeiro de 1916, em comemoração ao terceiro centenário da capital. A viagem durou cerca de dez dias pelo Oceano Atlântico. O Flamengo foi recebido por mais de duas mil pessoas no porto. Depois, o time participou de um cortejo que atravessou a cidade para saudar a população - 50 carros acompanhavam.

Galeria dos Fundadores do Paysandu — Foto: Beto Kaulino / ge

O entusiasta que fez o convite e bancou a excursão foi Eduardo Pessoa, um carioca que foi um dos fundadores do Paysandu. Foi dele a iniciativa que fez Belém se tornar rubro-negra mesmo estando a mais de 3 mil quilômetros do Rio. Neto de Eduardo, Luiz Fernando Pessoa Pinheiros, de 85 anos, comenta a ligação entre o Flamengo e o Pará.

– O Flamengo é a maior torcida do Pará. Foi o primeiro clube a ir para o Pará para jogar. Isso foi a convite do meu avô. Belém fazia 300 anos de fundação. E meu avô, para agradar os paraenses, convidou o Flamengo . Flamengo começou a jogar futebol em 1912. Em 1916, Belém fazia 300 anos. Meu avô sempre comentava da recepção do navio com os jogadores, dizia que foi uma coisa de louco. O navio demorou uns nove dias para chegar em Belém – contou Luiz Fernando.

– Você vê a quantidade de pessoas que se tornaram Flamengo no início do século, com essa ida do Flamengo . Foi o primeiro clube do Brasil a ir para Belém. Meu avô bancou a viagem toda de navio. Ninguém recebia nada, o profissionalismo começou só em 1935. Era tudo amador, jogavam por amor a camisa. Meu avô bancou a viagem, a estadia – comentou.

Luiz Fernando Pessoa Pinheiro, neto do fundador do Paysandu — Foto: Guilherme Oliveira / ge

O primeiro jogo em Belém aconteceu ainda em 27 de dezembro, e o Flamengo venceu a Seleção do Pará por 5 a 1, conquistando a Taça Jornal Folha do Norte.

Base do time: Baena, Píndaro, Nery, Cuthbert, Gallo, Antonico, Coriolano, Juvenal, Welfare, Batista e Paulo Buarque. Técnico: Emmanuel Augusto Nery.

Cobra-Coral: uniforme do Flamengo na excursão em Belém — Foto: Reprodução

O Rubro-negro virou o ano em Belém e seguiu por lá para fazer outros jogos. O time voltou a campo logo no primeiro dia de 1916, mas desta vez não saiu do empate com a Seleção do Pará (1 a 1). Mas, logo em seguida, goleou o Paysandu por 4 a 0 e conquistou o Troféu Artístico.

No dia 6 de janeiro, venceu o Remo por 3 a 1 e conquistou a Taça Clube do Remo. No dia 8, voltou a campo contra a Seleção do Pará e venceu por 2 a 0, conquistando mais uma taça. O último amistoso foi novamente contra a seleção local, mas terminou em um empate sem gols. Este jogo foi encerrado ainda no primeiro tempo devido à forte chuva que caía na cidade.

O Flamengo retornou para o Rio de Janeiro logo depois do último amistoso e desembarcou na cidade somente no dia 21 - foram 11 dias de uma longa viagem de navio. Os jornais da semana relataram a passagem do Rubro-Negro por Belém (veja publicações abaixo). Na ocasião, o time ainda usava a tradicional camisa "Cobra-Coral", que tinha listras horizontais rubro-negras contrastando com listras mais finas brancas.

Imparcial, dia 22/01/1916 — Foto: Reprodução

O Malho, dia 08/01/1916 — Foto: Reprodução

A excursão foi o primeiro passo para o Flamengo criar raízes em Belém. Anos depois, a Segunda Guerra Mundial de forma indireta acabou favorecendo que as notícias do Rio de Janeiro fossem consumidas por todo o litoral brasileiro. Assim, Luiz Fernando conta que os paraenses estavam antenados às rádios cariocas. À época, o Rubro-Negro era tricampeão carioca.

– Entre 1942 e 1944, o Flamengo conquistou o primeiro tricampeonato. Esse era o período da 2ª Guerra e os americanos instalaram antenas por todo o literal brasileiro. E, através dessas antenas, nós escutávamos as emissoras ( de rádio ) do Rio de Janeiro. Transmitiram as notícias dos jogos do Flamengo , que já tinha uma audiência imensa no Pará. Aí passava a ter a rádio do Rio quase como uma rádio local. Mas isso não foi só no Pará, foi por todo o litoral brasileiro – comentou .

Luiz Fernando Pessoa Pinheiro, neto do fundador do Paysandu — Foto: Reprodução

Apesar da ligação do avô com o Flamengo , Luiz Fernando revelou que o amor pelo clube aconteceu por influência de um sapateiro que morava na sua rua em Belém.

– Quando eu ia levar o meu sapato para consertar, via o quadro enorme que ele tinha do Flamengo . Era um timaço, do primeiro tricampeonato (1942, 43, 44). Ele falava para mim que era o maior time do mundo. Ele era paraense, não era carioca. Eu gostava muito de vermelho. Simpatizei com o Flamengo e me tornei um grande flamenguista.

Depois da excursão em 1916, o Flamengo voltou a Belém somente em 1950, em mais um amistoso contra o Paysandu. O Rubro-Negro venceu por 3 a 2. De lá para cá, foram alguns jogos até a última vez que o clube disputou uma partida na capital paraense, em 2024.

Pelo Carioca da temporada passada, o Sampaio Corrêa vendeu o mando de campo e escolheu Belém para ser palco da partida contra o Flamengo . O time de Tite venceu por 2 a 0, com o Mangueirão recebendo mais de 59 mil pessoas. Os gols da vitória foram de Bruno Henrique e Gabigol - último jogo em que a dupla marcou na mesma partida pelo clube.

Assista: tudo sobre o Flamengo no ge, na Globo e no sportv

Fonte: Globo Esporte