Libra encaminha venda de direitos para Globo, dificulta unificação dos clubes e põe pressão sobre rivais

Reunidos no Hotel Hilton, em São Paulo , na tarde de quarta-feira, presidentes dos clubes que integram a Libra optaram por prosseguir com a negociação de seus direitos de transmissão com a Globo. Como resultado, a trama da liga mudou. Mais uma vez. A decisão tomada por esses dirigentes torna a unificação improvável e põe pressão nos cartolas que integram o outro bloco, que une o Forte Futebol e o Grupo União.

O encontro foi conduzido por Silvio Matos, publicitário indicado pela Codajas, empresa que representa a Libra, e principal responsável pelas negociações com mídias e investidores. Diante dos representantes de todos os 19 clubes da Libra, o profissional apresentou as três opções que haviam sido negociadas.

A primeira era seguir a negociação com a Globo. A empresa apresentou uma proposta de R$ 1,3 bilhão — R$ 1,1 bilhão fixos pelos direitos de televisões aberta e fechada, mais R$ 200 milhões em mínimo garantido pelo pay-per-view. Como a negociação diz respeito à Libra, o dinheiro se divide apenas entre seus integrantes de Série A e Série B.

A segunda possibilidade era aceitar a proposta do Mubadala, fundo de investimentos dos Emirados Árabes, para criar uma agência que se responsabilizaria por vender os direitos de transmissão . Os investidores dariam uma garantia mínima de R$ 1,4 bilhão em caso de haver nove clubes do bloco na Série A.

Dirigentes dos clubes que formam a Libra — Foto: Divulgação

A terceira opção era partir para a unificação com o Forte Futebol e o Grupo União, que havia sido formalizada em um memorando de entendimentos distribuído há duas semanas . Nesse modelo, a negociação dos direitos de televisão seria recomeçada, a partir de então com a participação de todos os 40 clubes de Séries A e B.

No caso da unificação com o outro bloco, negociações avançaram desde que o ge publicou os detalhes do memorando. Clubes da Libra entenderam que, como já tinham uma oferta de R$ 1,3 bilhão da Globo em mãos, a unificação só faria sentido se houvesse garantia deste valor.

Os investidores do Forte Futebol e do Grupo União, coordenados pela Life Capital Partners (LCP), então, fizeram uma contraproposta. Eles dariam a garantia aos clubes da Libra de R$ 1,3 bilhão em receitas, porém haveria contrapartidas. Uma delas seria ganhar 30% do faturamento que superasse R$ 1,5 bilhão. Outra seria o direito de nomear a agência que faria a representação comercial — a escolha seria pela Livemode, parceira do Forte Futebol desde o início das negociações pela liga.

Veja os integrantes de cada grupo

Libra Forte Futebol Grupo União
ABC América-MG Botafogo
Atlético-MG Athletico-PR Coritiba
Bahia Atlético-GO Cruzeiro
Brusque Avaí Vasco
Corinthians Ceará
Flamengo Chapecoense
Grêmio CRB
Guarani Criciúma
Ituano CSA
Mirassol Cuiabá
Novorizontino Figueirense
Palmeiras Fluminense
Paysandu Fortaleza
Ponte Preta Goiás
Red Bull Bragantino Inter
Sampaio Corrêa Juventude
Santos Londrina
São Paulo Operário
Vitória Sport
Tombense
Vila Nova-GO

De volta à reunião de quarta-feira, dos presidentes da Libra. Quando Silvio Matos passou pelas duas propostas que envolviam ceder percentuais para investidores — Mubadala e LCP —, Leila Pereira, presidente do Palmeiras , interrompeu. De acordo com ela, seu clube não tinha interesse em vender percentuais. Ela preferia seguir com a Globo.

Os demais dirigentes se alinharam a ela, um por um. Julio Casares, do São Paulo, e Andre Rocha, do Red Bull Bragantino , eram favoráveis a essa opção desde o início. Bem como o Flamengo , representado pelo vice-presidente de comunicação e marketing, Gustavo Oliveira. Santos e Corinthians , que acabam de trocar seus gestores, acabaram seguindo.

Assim, a Libra sinalizou a preferência pela Globo em detrimento das outras duas opções. A negociação ainda não acabou. Novas rodadas serão agendadas para que dirigentes e executivos da emissora cheguem à versão final do contrato, com seus termos negociados no detalhe.

Entre dirigentes do bloco composto por Forte Futebol e Grupo União, a decepção com a decisão da Libra era evidente após a reunião. Até por ter havido negociações anteriores ao encontro em si, como a que definiu a garantia oferecida pela LCP para a Libra, a expectativa era de unificação.

O cartola que havia se responsabilizado por pacificar a situação era o presidente da Federação Paulista de Futebol, Reinaldo Carneiro Bastos. Ele é parceiro da Livemode na comercialização dos direitos do Paulistão e estava empoderado por sua campanha a presidente da CBF — apesar de o pleito não ter ocorrido, clubes do país inteiro manifestaram apoio à candidatura dele.

A maior surpresa desses dirigentes foi com a própria Leila Pereira. Até a semana anterior, a presidente palmeirense dava sinais nos bastidores de que lutaria pela unificação dos blocos, para que os direitos fossem vendidos conjuntamente. Ela esteve em contato por telefone na última sexta-feira com o presidente do Fluminense , Mário Bittencourt, a quem disse que ajudaria no processo.

Dirigentes da Liga Forte Futebol — Foto: Liga Forte Futebol

Agora, que a decisão da Libra foi tomada, a união entre os blocos se torna improvável, pois os clubes passam a estar em posições muito diferentes.

Em primeiro lugar, a Libra indica que não venderá um percentual de sua receita para investidores, enquanto Forte e União venderam 20% de seus direitos de transmissão para os investidores coordenados pela LCP. Os clubes receberam metade de todo o dinheiro prometido em outubro do ano passado. Em muitos casos, essa verba já foi totalmente gasta.

A diferença coloca os clubes de Forte e União em posição desfavorável em relação à Libra. A Libra já tem garantido R$ 1,3 bilhão da Globo por ano, sem ceder percentual nenhum a terceiros. Já os dois blocos precisam faturar R$ 1,6 bilhão só para igualar os adversários, pois 20% do montante — equivalentes a R$ 300 milhões — precisam ser repassados anualmente aos investidores.

Os direitos dos clubes da Libra valem mais, pois incluem Flamengo, Corinthians, Palmeiras, Santos, São Paulo, Red Bull Bragantino, Atlético-MG e Grêmio . Há interminável discussão sobre "quanto a mais", mas a premissa de que valem mais é aceita por quase todos os envolvidos no enredo. Isto só torna a missão de Forte e União ainda mais difícil.

Em segundo lugar, os estágios das negociações dos blocos são bastante diferentes. Enquanto o acerto da Libra com a Globo está encaminhado, Forte e União começarão agora a rodar o mercado para buscar propostas por seus direitos de transmissão. O trabalho é conduzido pela Livemode.

Como a intenção sempre foi a da unificação em um bloco único, para a constituição da liga, os números apresentados pela agência geralmente apontavam para a venda dos direitos de todos os 40 clubes. A cifra mais repetida em apresentações foi a de R$ 3,8 bilhões por ano. Agora que o cenário da divisão entre blocos persistiu, a questão se torna: quanto valem os direitos só de Forte e União?

— Agora é a hora da verdade. Vamos ver se vão nos entregar o que foi prometido — disse ao ge o representante de um dos maiores clubes do Forte Futebol.

A Livemode vem sendo pressionada por dirigentes nas últimas semanas para dar previsões mais assertivas, em relação ao valor a ser arrecadado. A agência defende que o valor comercial dos blocos é parecido. Segundo números de audiência e performance esportiva, a Libra valeria 53% do total, enquanto Forte e União corresponderiam por 47%. Será possível arrecadar tanto quanto os adversários ou mais?

Os assessores do Forte Futebol ainda tentam mudar a ideia da Libra. Eles vêm pedindo reuniões aos presidentes dos clubes que formam o bloco, para que tentem convencê-los a não prosseguir com a Globo e optar pela unificação. No entanto, a unificação imediata parece distante.

Ao longo dos últimos meses, negociações entre Libra e Forte Futebol foram levadas adiante, em direção à unificação dos blocos. Vários fatores de divergência foram resolvidos, como a fórmula de distribuição do dinheiro da televisão, o cálculo do peso da audiência, entre outros.

Só havia um grande impeditivo para a união: o mínimo garantido. Clubes da Libra faziam questão de receber, a partir de 2025, pelo menos os valores que tinham arrecadado em 2023.

A garantia mínima individual beneficiava três clubes, em particular: Flamengo, Grêmio e Corinthians. São esses os que, no contrato em vigor, válido para o ciclo entre 2019 e 2024, possuem mínimos garantidos altos para a verba distribuída com a rubrica do pay-per-view.

É relevante relembrar que todos os clubes tinham garantias mínimas para o pay-per-view, no momento da assinatura do contrato atual, em 2016. Porém, entre 2017 e 2018, quase todos os clubes desistiram de seus mínimos garantidos, em troca de antecipações de verba por parte da emissora. Flamengo, Grêmio e Corinthians, que estavam em situação financeira diferenciada, mantiveram os seus.

A briga pelo mínimo garantido dividiu os clubes até o fim. Clubes como Fluminense e Internacional foram protagonistas no discurso de que os privilégios desse trio, fosse qual fosse a origem, não deveriam ser carregados para o contrato de 2025 em diante. A Libra negava.

Na reunião desta quarta-feira, no Hilton, em São Paulo, o assunto passou batido. Ninguém tocou formalmente na questão do mínimo garantido.

Segundo três interlocutores ouvidos pelo ge , o mínimo garantido deixou de ser um problema, pois ele só estava previsto para o caso de unificação dos blocos. Como a Libra optou por prosseguir sozinha com a venda de seus direitos, o mínimo não se aplica à divisão entre seus membros.

Flamengo, Corinthians, Grêmio e todos os outros toparam dividir a verba da Série A segundo um 40-30-30 — 40% iguais para todos os clubes, 30% conforme a posição na tabela e 30% de acordo com as audiências das transmissões. Do total, 3% serão distribuídos entre membros da Libra na Série B. Minúcias serão discutidas em cada percentual, como a maneira que se medem as audiências, mas diretrizes foram estabelecidas.

Fonte: Globo Esporte