Neste momento, é natural que algumas questões estejam na cabeça do torcedor rubro-negro. Se o impacto da mudança de comando gerou uma influência emocional no jogo; se tal influência será duradoura; se a sequência de jogos permitirá manter a intensidade e a capacidade de pressão mostradas contra o Corinthians; se o time terá uma curva de crescimento proporcional aos progressos exibidos na estreia de Filipe Luís...
Por ora, é impossível ter uma resposta para cada uma destas dúvidas. Seria mero exercício de futurologia. O possível é analisar o que funcionou na estreia do novo treinador. E os sinais foram positivos.
O primeiro ponto de intervenção de Filipe Luís pareceu ser o comportamento de linha defensiva. Quando escolheu Léo Ortiz, muito se falou da capacidade de saída de bola do defensor. No entanto, ele e Léo Pereira formaram uma dupla zaga que, junto com Alex Sandro e Wesley, tiveram constante preocupação de encurtar o campo. Se o Corinthians tinha o controle da bola e estava minimamente pressionado, sem possibilidade de executar um passe com liberdade, a linha de defesa andava para frente. Este foi um comportamento constante na partida.
Como num efeito dominó, o campo mais curto deu ao Flamengo melhores condições de pressionar. E, no futebol, quase sempre as ações com bola condicionam o que acontece sem ela.
A recuperação rápida da bola impactou, por exemplo, o desempenho de Bruno Henrique. Muito já se discutiu sobre seu melhor aproveitamento. Ele não é um ponta driblador, que possa receber uma bola parado, contra um marcador posicionado, e achar soluções na habilidade individual em espaço curto. Tampouco é um “camisa 9” que jogue de costas para o gol como um pivô. Suas melhores ações são em progressão, com algum espaço para correr ou atacando tais espaços. Na estreia de Filipe Luís, um time que recuperava rapidamente a bola com a defesa adversária ainda desordenada, criou boas condições - e espaço - para Bruno Henrique acelerar, progredir, mesmo atuando como um ponta pela esquerda.
Em organização ofensiva, o time também mostrou algumas intenções. Ao menos neste jogo, Gérson tinha o lado direito do ataque como mera posição inicial – e como setor por onde fazia a recomposição sem bola, algo que já desempenhava no trabalho anterior. Quando o Flamengo se ordenava no campo ofensivo, ele fazia uma dupla de meias com Arrascaeta, ambos por trás de Gabigol. Tal posicionamento permitiu mais aproximações, um jogo mais curto em alguns momentos.
Havia uma certa assimetria. Pulgar e De La Cruz eram os volantes – este último com mais chegada à frente, mantendo chileno mais posicionado por trás. Wesley abria campo na direita, enquanto Bruno Henrique fazia o mesmo na esquerda, com a diferença de que, por este lado, ainda havia a presença de Alex Sandro. Isso permitia ao time criar triangulações entre Arrascaeta, Bruno e Alex Sandro por ali. Na melhor delas, Gabigol finalizou de letra.
Este Flamengo aceso, muito ativo no jogo, terminou por fazerem funcionar rapidamente algumas ideias do novo treinador. O que incluiu cortar uma sequência de jogos que preocupavam pela falta de agressividade: a equipe vinha tendo a bola, mas as chances reais de gol não eram proporcionais ao volume. Contra o Corinthians, fosse com Alex Sandro ou Bruno Henrique na esquerda, com Gabigol no centro, com Wesley ou com os meias, havia movimentos de ataque à profundidade. E, neste ponto, Arrascaeta pode ser duplamente beneficiado.
O uruguaio, ao receber numa zona de criação, precisa de opções de passe em infiltração. Além disso, conseguiu se posicionar, na maior parte do tempo, do meio para a esquerda, onde rende melhor. Pareceu ter sido obrigado a cobrir menos porções de campo. O que, no futuro, pode até resultar em menos desgaste.
Quanto a Gabigol, aposta mais impactante de Filipe Luís, não é possível dizer que ele foi brilhante e sempre participativo. Ainda assim, tentou fazer os movimentos de ataque a espaço que melhor o caracterizam e pareceu um pouco mais "dentro do jogo" do que nos últimos meses. Na realidade de um Flamengo sem Pedro, talvez seja o que Filipe tem de mais próximo de um "camisa 9" para apostar.
De todo modo, a amostragem é muito pequena para um decreto sobre o que será esta nova etapa do Flamengo. É injusto até comparar trabalhos. O mais correto talvez seja dizer que, no primeiro jogo, o time respondeu bem a alguns estímulos, o que é bom sinal. Foi como a exibição de uma carta de intenções. A partir de agora, surgem novos desafios: outros adversários e um calendário que não dá trégua, especialmente para um tipo de jogo de grande exigência física.