A Copa do Mundo de 1938, realizada na França, não apenas consolidou o Brasil como uma potência no futebol mundial, mas também destacou a figura de José Perácio, um atacante que se tornaria ícone do Flamengo. Com a Seleção Brasileira conquistando um histórico terceiro lugar, Perácio brilhou nos campos, mas sua trajetória foi abruptamente interrompida por um chamado maior: a Segunda Guerra Mundial.
O Retorno Triunfante
No dia 22 de agosto de 1945, há exatos 80 anos, Perácio retornava ao Brasil após participar da Batalha de Montese, um dos confrontos mais intensos enfrentados pela Força Expedicionária Brasileira (FEB) na Itália. O combate, que ocorreu em abril de 1945, foi marcado por resistência feroz das tropas alemãs e um terreno desafiador, mas os brasileiros conseguiram conquistar Montese, uma vitória significativa no contexto da guerra.
Ao lado de seus companheiros de equipe, Walter e Geninho, ambos do Botafogo, Perácio desembarcou no Rio de Janeiro, onde uma multidão aguardava ansiosamente. A recepção calorosa foi descrita em uma reportagem do jornal "O Globo", que ressaltou a presença do atacante, fuzil em punho e acompanhado de um cachorro que se tornara mascote dos soldados. O texto ainda mencionava que Perácio retornava ao Brasil com "quase seis quilos a mais".
Um Guerreiro em Campo e na Guerra
Durante sua estadia na Itália, Perácio enviou uma carta ao radialista Ary Barroso, expressando seu orgulho em representar não apenas sua pátria, mas também o Flamengo. “Diga-lhes que tudo farei pela vitória e que assim, de modo especial, o nosso querido Flamengo estará diretamente contribuindo para a derrota do nazifascismo. Sinceramente, já lutei contra os fascistas, jogando bola. Lutarei agora contra os nazistas, jogando bala! Essa é a minha partida de maior 'vulto'. Darei Tudo!” A carta, publicada pelo "Diário de Pernambuco" em 8 de novembro de 1944, refletia a determinação de Perácio em lutar por um ideal maior.
Vale lembrar que a luta contra os fascistas mencionada por Perácio se referia ao jogo contra a Itália na semifinal da Copa de 1938, onde o Brasil foi eliminado em um lance polêmico. Apesar de não ser um protagonista nas batalhas da guerra, o atacante do Flamengo, que também teve passagens por Villa Nova e Botafogo, fez história nos gramados. Ele foi fundamental para o tricampeonato carioca do Flamengo em 1942, 1943 e 1944, sendo o artilheiro do estadual de 1943, com 14 gols.
A Contribuição dos Atletas na Guerra
Natural de Nova Lima, o mineiro Perácio conquistou três títulos estaduais pelo Villa Nova antes de se transferir para o Botafogo em 1937. Seu desempenho notável o levou à convocação para a Copa do Mundo de 1938, onde, em quatro partidas, marcou três gols, incluindo um na vitória sobre a Suécia, que garantiu o terceiro lugar ao Brasil.
Antes de embarcar para a Itália, Perácio, Walter e Geninho participaram de um amistoso entre Brasil e Uruguai, onde o atacante rubro-negro entrou em campo fardado. A atuação dos brasileiros na Itália não se limitou às batalhas; em 1945, os Aliados promoveram uma "Copa do Mundo", na qual Perácio defendeu o time do 5º Exército dos Estados Unidos, que se sagrou campeão.
O Retorno aos Gramados e o Legado de Perácio
Após a guerra, Perácio voltou aos gramados em 14 de setembro de 1945, sendo homenageado por sua participação no conflito antes de um clássico contra o Fluminense. O atacante é lembrado no Museu do Flamengo como um dos grandes ídolos do clube, conhecido por sua força nos chutes, que lhe renderam o apelido de "Canhão".
Perácio, que ficou no Flamengo até 1949, encerrou sua carreira no Canto do Rio, dois anos depois. Ele faleceu em 1977, aos 60 anos, deixando um legado que transcende o futebol. Sua história é um testemunho de coragem e patriotismo, simbolizando a união entre o esporte e a luta pela liberdade. Um verdadeiro expedicionário rubro-negro.