Até janeiro de 2012, Bruninho dividia sua rotina entre o trabalho de recepcionista em um escritório no centro de Belo Horizonte e os campos de terra batida na várzea. Aos 21 anos, o atacante não esperava mais ser um jogador profissional, já que não tinha passado por nenhuma categoria de base e havia tentado - sem sucesso - ingressar em clubes como Cruzeiro , Atlético-MG , América-MG e Valeriodoce-MG.

Ele realizava o sonho no futebol no ataque do Inconfidência ao lado do irmão Juninho, um ano mais velho, na disputa da Copa Itatiaia, tradicional torneio de futebol amador organizado pela rádio mineira.

Eles atuavam juntos desde os nove anos e seriam destaques na conquista do título contra o Brumadinho, na Arena do Jacaré, em Sete Lagoas-MG.

"A nossa dupla era muito boa. Aonde a gente ia, todo mundo parava para nos ver. Nós éramos uma atração", contou Juninho, ao ESPN.com.br .

O jogo foi uma das primeiras vezes que os jovens apareceriam na televisão. Bruninho terminou como artilheiro e eleito o melhor jogador do torneio, enquanto Juninho ganhou o prêmio de revelação.

Parecia o ápice da carreira de Bruninho, que mal poderia imaginar que pouco mais de sete anos depois ficaria conhecido no mundo do futebol como Bruno Henrique, viraria destaque do Flamengo e teria a chance de levantar o troféu da Copa Libertadores .

Os parentes dos irmãos procuraram o repórter de rádio Álvaro Damião, que também é do bairro Concórdia. O jornalista conversou com José Maria Filho, vice-presidente de futebol do Cruzeiro na época, que deu um contrato profissional de um ano à dupla.

"Quando o Álvaro disse que ia nos ajudar, nós não sabíamos qual seria o time. Achávamos que seria um clube de menor expressão e iriamos esperar porque sabíamos das dificuldades. Quando ele falou que era o Cruzeiro, nós aceitamos na hora e paramos de trabalhar", contou Juninho.

Eles nunca chegaram a vestir a camisa celeste. Bruno foi para o Uberlândia, enquanto Juninho mudou-se para o Araxá e passou por alguns clubes do interior antes de aposentar-se, em 2016.

"Meu irmão era o único profissional que morava na concentração do clube e ficava muito tempo sozinho. Muitas vezes, ele ligava para gente chateado e pensando em ir embora porque sentia saudade de casa. Ele comia muitos biscoitos nos finais de semana", afirmou Juninho.

Mesmo com as dificuldades, a carreira de Bruno Henrique teve uma ascensão meteórica. Após trocar o Uberlândia pelo Itumbiara-GO, ele se destacou no Estadual e foi para o Goiás . Jogou em 2015 pelo time esmeraldino e foi considerado uma das revelações do Brasileirão . O atacante foi vendido no final do ano para o Wolfsburg , da Alemanha.

Apesar de ficar apenas um ano no time alemão, o atacante ficou marcado pela boa atuação na vitória por 2 a 0 contra o poderoso Real Madrid , em duelo válido pelas quartas de final Champions League de 2016.

"Ele não queria ir para a Europa, mas eu e meu avô falamos para ele ir. O jogo contra o Real foi muito marcante porque ele enfrentou Sergio Ramos, Cristiano Ronaldo e Marcelo. Era um sonho dele estar ali. Só que ele não se adaptou e acabou voltando no ano seguinte ao Brasil", disse Juninho.

Em janeiro de 2017, Bruno Henrique desembarcou no Santos e teve uma boa temporada. No ano seguinte, porém, viveu o momento mais difícil da carreira. Na vitória por 3 a 0 sobre o Linense, no Paulistão, ele levou uma bolada no olho e ficou com problemas na visão.

O atacante quase ficou cego e precisou passar por um tratamento fora do Brasil. Ele teve uma lentíssima recuperação e chegou até mesmo a cogitar uma aposentadoria do futebol. Acabou a temporada com apenas dois gols marcados.

"Ele achou que poderia não estar voltar em alta performance por causa da visão. Foi um baque porque ele enxergava pouco. Nossa família é bem religiosa e pedimos para ele crer em Deus e oramos muito. Fizemos votos com Jesus para que ele voltasse a enxergar", contou o irmão do jogador.

Mesmo sem ainda voltar ao desempenho de 2017, o Flamengo apostou na contratação do jogador para 2019. E não se arrependeu. Desde então, ele ajudou o time a faturar o Carioca, liderar o Brasileiro e ser finalista da Libertadores.

"Era um sonho de todos jogar lá, porque é um clube de massa. Ficamos muito felizes por ele ter ido ao Fla. Ele está buscando ser ídolo e conquistar títulos. Para a gente foi uma alegria imensa por tudo que ele passou", emocionou-se Juninho.

Com a chegada do técnico Jorge Jesus, Bruno mudou seu posicionamento e chegou a 31 gols no ano.

"O 'mister' cobra muito e é bastante exigente. Antes mesmo do Jesus chegar, o Bruno comentou que o estilo dele ia dar muito certo por causa do elenco que o Flamengo tinha. Era um time com bastante intensidade e leve."

Chamado de rei dos clássicos (11 gols em 13 jogos contra rivais cariocas), ele é atualmente o jogador mais decisivo do elenco rubro-negro.

"Desde garoto, quando jogávamos no amador, ele resolvia os jogos decisivos. É algo dele. Na Copa Itatiaia, foi assim também e não é nenhuma surpresa. É o que ele fazia aqui na várzea. Já resolvia os jogos complicados, era muito decisivo".

A família de Bruno Henrique, que antes fretava ônibus para ver os jogos dos irmãos na Copa Itatiaia, não estará em Lima, no Peru, para a final da Libertadores. Mas a agitação será a mesma no bairro onde o atacante foi criado, em Belo Horizonte.

"A final vai ser uma grande atração. Nós vamos colocar um telão e será um grande evento aqui em Concórdia, em BH. Todo mundo torcendo pelo Bruno. Sempre que ele pode, vem para cá passar as férias conosco", disse Juninho.