Fla mais pressionado do que o Bota

Como Flamengo e Botafogo protagonizam o clássico carioca deste meio de semana, fui perguntado numa resenha da redação sobre as perspectivas de ambos para a temporada, e também sobre pressão por conquistas. Esse tipo de debate, com "a" ou "b", melhor ou pior, vale muito para o torcedor, ou numa conversa sem compromisso entre amigos, na praia ou no boteco. Entre as analistas, perde muito valor especialmente porque quem ouve acaba confundindo: quando optamos por um, não significa que o outro não existe, ou que não está próximo ao outro. Exemplo: na pergunta específica que me foi feita, entendo que o Flamengo tem muito mais pressão e obrigação de levantar taças em 2024 do que o Botafogo. Não significa nem de longe que o Alvinegro não tenha pressão, ou que seja um time pior do que o rival, ou que não vá ser campeão. Nada disso. Apenas vejo que passar o ano em branco quanto a taças vai pesar muito mais na Gávea.

Carrossel Botafogo x Flamengo — Foto: Infoesporte

A questão, do ponto de vista alvinegro, é: se fizermos um recorte das últimas temporadas, o Botafogo vem numa curva evolutiva invejável. De mais um rebaixamento, o clube virou o rumo, voltou à elite, criou sua SAF, manteve-se na Primeira Divisão, chegou à Sul-Americana (onde poderia ter sido campeão se não tivesse, corretamente, privilegiado um Brasileiro que chegou a ter nas mãos) e agora vai disputar a Libertadores. Em tese, 2024 seria o momento de chegar ao mata-mata da Libertadores, lutar por uma semifinal de Copa do Brasil, brigar por título no Carioca, e consolidar-se como "time de G4" no Brasileiro. Ou seja: um título este ano já seria um belo "plus". Onde isso saiu um pouco do prumo? No contexto, já citado, do enredo da perda do último Brasileiro. Viver um turno de sonho e um returno do pior pesadelo machucou muito o torcedor. Mas não pode tirar a SAF do rumo. E uma contratação do tamanho de Luiz Henrique mostra que o Botafogo manteve-se no caminho certo do topo, e faz um belo afago no ego ferido dos torcedores.

O Flamengo está num ponto distinto. Há anos é o maior arrecadador do país, desde 2019 tem uma folha salarial europeia, tem uma quantidade de jogadores acima da média e acima do mercado que ninguém tem (nem o papa-títulos Palmeiras) e acostumou seu torcedor a acompanhar voltas olímpicas relevantes desde que acertou no centro do alvo quando contratou Jorge Jesus. Dois Estaduais, dois Brasileiros, duas Supercopas, uma Recopa, duas Libertadores... e um ano de 2023 de total e absoluto jejum de conquistas, mesmo tendo disputado oito taças. É uma situação inaceitável para uma torcida gigante como a do Flamengo, e algo inexplicável para jornalistas que estudam orçamento e lógica.

Não tenho dúvidas de que Tite tem tamanho, estofo e capacidade de colocar novas taças na prateleira rubro-negra. Mas tampouco duvido que ele e seu milionário elenco estão com a corda no pescoço, na obrigação de conquistas. Até o presidente Rodolfo Landim está pressionado porque há eleições no clube no fim do ano - por isso abriu o cofre para trazer um treinador cuja figura vai inibir o intempestivo Marcos Braz na hora de cometer desatinos.

Também tenho uma quase certeza com relação ao Botafogo: a maior pressão, e esta é pesada e será um desafio de curto prazo para Tiago Nunes: chegar à fase de grupos da Libertadores. O desafio começa dia 21 de fevereiro contra Aurora de Cochabamba ou Melgar peruano - o primeiro tem o perigo de um altitude tolerável de pouco mais de 2,5 mil metros, o segundo é mais experiente, com muitos argentinos no elenco, incluindo o técnico. Passando, ainda tem uma segunda eliminatória, que pode ser diante do perigosíssimo Bragantino. Se cair nesta, antes da fase de grupos, seria terrível, mas ainda haveria a Sul-Americana como consolo. Mas se não passar na primeira eliminatória, aí o Botafogo terá um outro trauma que pode determinar uma ruptura com a sequência positiva. Mas se chegar à fase de grupos, o Alvinegro terá moral e confiança para jogar de novo no seu limite e, além de conquistar a obrigação (passar da pré-Libertadores), chegar a tudo aquilo que listei acima como lucro.

Ou seja, o classico desta quarta será, como sempre, importante para os torcedores. Mas não altera em absolutamente nada o caminho que Flamengo e Botafogo serão obrigados a trilhar neste ano.

Fonte: Globo Esporte