Ex-presidente do Fla, Helal diz que ainda não teve coragem de voltar ao CT após tragédia

Visionário e maluco foram os adjetivos mais ouvidos por George Helal quando, em 1984, o então presidente do Flamengo decidiu que o dinheiro da venda de Zico seria usado para comprar um terreno onde funcionara um aviário, numa rua sem asfalto na distante Vargem Grande. À época, nem se cogitava tratar Centros de Treinamento como necessidade para clubes de futebol. Foram mais de três décadas de espera para ver o maior legado de sua vida rubro-negra de pé. Hoje, aos 87 anos, tenta superar um trauma que abalou sua saúde.

Às 7h da manhã do dia 8 de fevereiro, soube por uma amiga, em sua casa no Recreio dos Bandeirantes, que um incêndio num alojamento do Ninho do Urubu matara dez garotos. Imaginando a reação do ex-dirigente, os filhos foram ao seu encontro e o impediram de sair de casa e ir para o CT.

— Chorei muito por uma semana, não estou fazendo drama. Só fui melhorar no domingo, após a coletiva do presidente. Não saía de casa. Afetou minha saúde, eu me sentia tonto. Aquilo é parte da minha vida, um legado meu.

Desde então, Helal não teve coragem de voltar ao CT, onde ia uma vez por semana. De memória, lembra cada passo da empreitada de 35 anos atrás, que começou com anúncios em jornais informando da busca do clube por terrenos.

Sugestão de memorial

Havia razões para que seu plano fosse levado em conta. Anos antes, este americano nascido em Patterson, Nova Jersey, já fora responsável por convencer seus pares de que valia a pena manter no clube o jovem franzino que causava desconfiança por seu físico nas categorias de base. Tratava-se de Zico, claro.

— Após o anúncio, apareceram mais de 50 propostas, uma monte de corretores. Visitamos 14 terrenos, depois escolhemos dois e compramos o Ninho em 30 de agosto de 1984. Pagamos à vista.

Nada o machuca mais do que o fato de o incêndio ter vitimado jovens da base.

— Nunca no clube houve um defensor da base maior do que eu. Desde aquela época, eu disse a todos os presidentes do clube: aquilo ali é para a base. Só quem me conhece sabe o quanto sofri. Não comprei para colocarem meu nome. Comprei para o Flamengo.

Em 1988, quando ainda havia apenas mato no CT, o então presidente Márcio Braga propôs batizar o Ninho com o nome de Helal. Depois, uma estátua foi colocada no local.

— Eu falei: “Não faz, isso é para quando o cara morre”. Mas fiquei feliz.

Em meio a elogios ao presidente Rodolfo Landim, Helal diz o que gostaria de ver no local da tragédia.

— Deveria ser feito um memorial, com o nome dos meninos em destaque. É o mínimo.

Fonte: O Globo
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