O advogado Rodrigo Dunshee tenta repetir, a partir do ano que vem, um feito de seu pai, Antônio Augusto Dunshee de Abranches, que presidiu o Flamengo na década de 1980. Ele tem a missão de suceder outro dirigente de sucesso esportivo, Rodolfo Landim, e o desafio de, mesmo na situação, desvencilhar-se dos problemas da atual gestão.
Na última das três entrevistas com os candidatos feitas pelo GLOBO, o hoje vice-presidente geral rubro-negro explica como pretende reestruturar o departamento de futebol e detalha de que forma sua gestão deseja financiar as obras do novo estádio no Gasômetro sem cortar os investimentos no time.
Como começou sua trajetória política no Flamengo?
Meu pai foi presidente. Depois, não quis mais cargo no clube. Eu comecei a participar dos Conselhos em 1992 e fui representante do Flamengo na Federação do Rio. Para o executivo, entrei em 2018. Saí da gestão Eduardo Bandeira de Mello porque fui convidado para a chapa do Rodolfo Landim por ele, Flávio Godinho e Wallim Vasconcellos. Assumi como vice-presidente jurídico.
Você diz que o sócio não quer que o Flamengo vire SAF. Qual é a sua opinião?
Sou contra. Sempre fui contra o Flamengo abrir mão de seu controle e de sua marca. Não o vejo com um dono. Ele é de massa, e a torcida tem poder de controle externo. Se ela começa a pressionar, muita coisa se movimenta. Existem pessoas com títulos do Flamengo e poder de voto, e elas representam muito a “nação”. Se o Flamengo tiver dono, perde sua identidade. Além disso, a SAF foi feita para quem precisa. O Flamengo está com uma pujança financeira grande. Não cogito.
Na atual gestão, Marcos Braz (vice de futebol) afere essa temperatura da torcida, das organizadas, do clube social. Sem ele, quem fará isso?
O Marcos reconhece que seu ciclo se encerrou. Essa cadeira é muito pesada. Toda situação ruim cai na conta dele. Ele prestou bons serviços, mas não vai mais participar do futebol. A gente quer botar um diretor esportivo. Alguém que tenha liderança e uma trajetória bacana e seja respeitado no mercado da bola. É necessário ter uma pessoa com esse perfil, porque o diretor executivo terá outro. A ideia é anunciar após a eleição.
Já existe esse nome?
Já, mas não posso anunciar.
Você acumulará o cargo de vice-presidente de futebol?
Posso botar alguém, mas esse alguém será um orientador de longe. Quem cuidará do futebol serão o diretor executivo, o diretor esportivo e a comissão técnica. Ou seja, os profissionais.
Você terá Landim como CEO. Ele participará do futebol?
Não.
E você? Landim, como presidente, participou do futebol em vários momentos.
Nesses seis anos, fui vice jurídico e geral. E procurei não me envolver no futebol, porque ele atrai. Todo mundo quer participar. Só que o clube precisa do presidente ou do vice à frente dos outros assuntos. Não quero ser o presidente do futebol. A gente tem que deixar o futebol ser tocado por quem está no dia a dia. Me perguntaram se eu renovaria com o David Luiz. Não tenho a menor condição de avaliar isso. Quem está avaliando o rendimento dele é o scout. Como eu, presidente do clube, vou estar melhor informado que um profissional que faz isso 24 horas por dia? O presidente tem que dar as melhores condições para os profissionais e cobrá-los.
Quais seriam as diferenças de atribuição entre os diretores executivo e esportivo?
O diretor esportivo é alguém que tem uma vivência grande no mercado do futebol, um ex-jogador. Mas não vou dar uma pista, senão vocês vão acabar descobrindo (risos). E não quero usar isso para ganhar voto.
Bruno Spindel continuará cuidando das negociações?
Ele cuida da parte executiva, inclusive dos contratos. Provavelmente vai continuar fazendo isso, mas tem outras coisas. Ele cuida de todo o futebol, que é enorme e inclui a base. O diretor esportivo vai ser um cara mais de campo, de relacionamento com o jogador e o treinador.
O diretor esportivo, então, será uma figura como o Braz?
É diferente. Marcos Braz é vice-presidente, tem uma hierarquia, e não o vejo como um cara de vestiário, de conversar com o treinador. É uma capacitação diferente. O diretor técnico (ou esportivo) e o diretor executivo vão trabalhar juntos.
Pretende qualificar o scout?
Essa área já é bem qualificada. A gente tem vários profissionais bons, como o Ricardo Perlingeiro, que era da CBF. O departamento de scout tem autonomia para fazer listas de contratações e dispensas. Ele apresenta à comissão técnica uma relação de jogadores disponíveis por posição de acordo com as carências do clube. Às vezes, você vai em um e não consegue. Aí vai em outro. É assim nos clubes mais organizados do mundo.
Como enxerga as críticas de que o Flamengo só busca jogadores mais badalados e, por isso, mais caros?
O Flamengo fez 21 finais e ganhou 13 títulos na gestão Landim. Isso nunca aconteceu na história do clube. O scout fez um trabalho bem feito, e o Flamengo, com o orçamento que tem, teve condições de ir em cima de jogadores bons. O Flamengo não vai ficar procurando galinha morta. Quero dizer, uma oportunidade de ouro. Não é toda hora que tem um Pablo Marí. Quando faz isso, você corre um risco. O Flamengo não pode fazer aposta toda hora, porque, se não der certo, vai ter que pagar o salário mesmo assim.
Dados de scout justificam a proposta de renovação com Gabigol por um ano? Ou ela é uma aposta da diretoria?
Quando for presidente, vou deixar o profissional trabalhar. Não tenho como te responder, porque eu não participei disso. Hoje, sou do jurídico. O Landim diz que, pela produtividade do atleta nos últimos dois anos, não seria uma decisão correta oferecer a ele quatro anos.
A eleição será no dia 9. Ele ainda estará sob contrato. Quem vai decidir é você.
É. A gente pode conversar, mas existe uma proposta. Gabriel deu uma entrevista dizendo que não vai ficar no clube. Ele é quem precisa reformular isso, se quiser ficar. A proposta continua lá.
Como equilibrar as finanças do Flamengo, com o início das obras do estádio, sem afetar os investimentos no futebol?
Estou tranquilo em relação a isso, porque estamos apresentando um orçamento separado. O orçamento do clube não vai se misturar com o do estádio. Este só se viabiliza incluindo receitas do próprio estádio: potencial construtivo, naming rights, iniciativas com o torcedor... Só vamos fazer quando estiver gerando recursos.
Uma das ideias para financiar as obras é a venda de cadeiras cativas. Isso será feito?
A cadeira cativa é um produto premium. Sabemos da força da torcida do Flamengo. Muitas pessoas querem ajudar na construção, e uma das formas de fazer isso é reservando esse produto premium. A perda de receita é irrisória, porque nunca se vende 100% dos ingressos. Temos uma média de público de 55 mil no Maracanã, e cabem 65 mil. É um investimento do rubro-negro que quer ter o seu nome ligado à história do Flamengo.
Quantas cadeiras seriam?
A princípio, seriam mil cadeiras cativas premium. Por R$ 150 mil cada. Mas também terá a cadeira com prazo de cinco anos. Só lembrando que vamos ter de 75 mil a 80 mil lugares no estádio... Vamos começar a vendê-las depois da eleição.
Em que pé está o projeto?
Temos um projeto básico. O primeiro era de viabilidade do local para apresentação às autoridades. Agora, estamos terminando o projeto básico, que dá uma noção de como será: o tamanho do estádio, a quantidade de andares, como vai ser por dentro. Mas ainda não é o final.
Quanto o clube comprometeria além do montante que viria de recursos do próprio estádio?
R$ 1,5 bilhão.
Para custear a obra toda?
Não. Porque tem que contar esse crédito futuro sobre um contrato de 20 anos. Se você vai trazer a valor presente, vai ter que dar um deságio. Trazendo um valor de 20 anos a valor presente, tirando os juros, vão ser cerca de R$ 750 milhões ou R$ 800 milhões.
Pretende fazer obras no Maracanã? O que mudar?
O Maracanã é um negócio bem lucrativo sendo explorado pelo Flamengo nos últimos anos. Quando ganhamos a licitação, apresentamos um plano de negócios e um caderno de encargos. Nesses encargos, há investimentos a ser feitos. Eles serão pagos pela própria receita do Maracanã. Vamos investir e fazer melhorias.