Foi o Flamengo , e o presidente Rodolfo Landim diz isso com orgulho, o principal articulador da MP 984. Publicada pelo Governo Federal, a medida atribui exclusivamente ao mandante dos jogos os direitos sobre suas transmissões .

Com isso, o Flamengo, em seu entendimento, de cara ficava dono dos direitos de exibição do Campeonato Carioca , que não comercializara com ninguém. E, a partir do fim dos contratos em vigor com a Globo (2024), passava a ser “proprietário” de todos os seus jogos.

O tiro ainda não fez efeito. A Globo promete contestar o clube na Justiça, caso o Fla transmita algum jogo seu do Estadual do Rio.

Mas, independentemente do resultado final - que pode se arrastar e até parar no STJ - , o fato é que a articulação isola o Flamengo como "negociador de si mesmo" como produto.

Posição diferente da que o clube da Gávea adotou e até idealizou no passado. E que, talvez, por linhas tortas, acabe tendo de adotar novamente.

1987 - Grande articulador do Clube dos 13

Surgida cinco anos antes da Premier League , a entidade que agregava os 13 maiores clubes do Brasil na época - Flamengo, Vasco , Fluminense , Botafogo , São Paulo , Santos , Corinthians , Palmeiras , Internacional , Grêmio , Atlético-MG Atlético-MG , Cruzeiro e Bahia - nasceu para realizar o Campeonato Brasileiro de 1987 e poderia ter sido o "pulo do gato" do futebol no Brasil.

Falida, a CBF se declarou incapaz de bancar transporte e acomodação para os participantes do torneio naquela temporada. Foi então que Carlos Miguel Aidar, na época presidente do São Paulo , e Márcio Braga, do Flamengo, decidiram começar a estruturar o grupo para montar um campeonato forte e independente da CBF.

Além dos 13, juntaram-se a eles Goiás , Coritiba e Santa Cruz. A Copa União de 1987 teve apoio da Coca-Cola, da Globo e da Revista Placar . João Henrique Areias, publicitário e dirigente rubro-negro, foi um dos idealizadores do plano de marketing que colocou o evento em pé.

Conquistada pelo Flamengo, a Copa teria sido um sucesso completo, se Eurico Miranda, dirigente do Vasco, não tivesse prometido à CBF unificar o título brasileiro a partir de um cruzamento com campeão e vice do Módulo Amarelo, que a CBF acabou organizando no mesmo ano com equipes de menor expressão.

O Flamengo se recusou a participar de tal cruzamento, e é por isso que, até hoje discute-se quem foi o verdadeiro campeão brasileiro de 87: Fla ou Sport .

2011 - Ruptura e bloco dos 4 cariocas

Em 1988, a CBF retomou a organização do Brasileiro. Apenas em 2000, o Clube dos 13 teria novamente o papel de organizador do campeonato. Em litígio com o Gama, que questionava seu rebaixamento, a CBF declarou-se impedida de organizar o nacional, tarefa que coube ao Clube dos 13 - já com 20 membros à época.

No restante do tempo de sua existência, a entidade ficou relegada ao papel de negociar contratos de transmissão para seus filiados - que logo se tornariam 20, embora o nome não tenha mudado.

Nesse papel, a entidade sobreviveu até 2011, quando começaram os maiores atritos em relação ao valor dos direitos de transmissão.

Primeiro, foi o Corinthians quem começou a questionar o valor que recebia, diante do tamanho de sua representatividade de torcida, mostrando também descontentamento com a licitação que tirara da Globo , repassando à RedeTV! , os direitos de transmissão da competição.

O Alvinegro de São Paulo deixa o Clube dos 13 em fevereiro de 2011. No mesmo mês, Flamengo, Botafogo, Fluminense e Vasco decidem formar um bloco para negociar em conjunto seus direitos de transmissão.

A união dos cariocas teve pompa e até comunicado em conjunto nos sites dos quatro clubes, publicados simultaneamente.

A licitação com a RedeTV! Acabou ficando nula, os campeonatos voltaram para as mãos da Globo , e o Clube dos 13 se dissolveu após 24 anos. Em muito, por causa do movimento dos cariocas, puxado pelos rubro-negros.

2015 - Eu sozinho

Em 2011, de fato, os cariocas negociaram em conjunto, ao menos representativamente falando, porque a fatia do Fla foi maior que a dos seus rivais.

A partir de 2015, porém, o Fla voltou a negociar de modo isolado. Foi desse modo, em 2019, que assinou com a Globo , também, até 2024, os direitos de seus jogos do Brasileiro.

2020 - Sozinho - mas com o presidente

A posição de articular junto ao presidente da república a criação da MP 984 mantém o Flamengo como um “bloco em si mesmo”.

Por mais que outros clubes possam se beneficiar da medida, foi pensando nos seus interesses, e não nos demais pares de competição, que o clube buscou auxílio de Jair Bolsonaro (sem partido).

Existe no ar uma hipótese, porém, que pode acabar fazendo com que o Flamengo tenha, sem querer, fomentado a recriação de blocos de clubes para negociação.

Entendendo não terem força para atrair, sozinhos, os interesses dos canais de TV e players de outros modos de transmissão, clubes menores já estudam negociar conjuntamente os direitos de transmissão de seus jogos.

Uma proposta do Deputado Pedro Paulo (DEM-RJ), vai além. O parlamentar quer incluir na MP a obrigatoriedade de que os clubes negociem em conjunto, como liga, as cessões de seus direitos de transmissão.

E, caso a MP 984 se torne lei, e o adendo de Pedro Paulo venha a ser adicionado ao texto, o movimento do Flamengo para ganhar autonomia pode acabar levando as agremiações a se agruparem sob um único guarda-chuva novamente.

Como era na época do Clube dos 13, co-idealizado pelo próprio Rubro-Negro, há 33 anos.