Discussão sobre projeto de clube-empresa esbarra em carga tributária

Dirigentes de clubes, federações e parlamentares caminham na discussão do projeto que tem como objetivo incentivar os clubes a se transformarem em empresas. Sem a menor intenção de mudar sua natureza jurídica, o Flamengo é a principal voz dissonante em questões fundamentais, como o volume de impostos para cada modelo.

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Nesta quarta-feira, o cenário da conversa foi Brasília, onde os cartolas foram ouvidos pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), torcedor do Botafogo. O plano é que o projeto seja votado em cerca de um mês. Nesta quinta-feira, os clubes estarão na sede da CBF, no Rio, para novo debate.

No café da manhã na capital federal, o representante do Flamengo foi o presidente Rodolfo Landim. Em nome do Botafogo, o presidente Nelson Mufarrej, acompanhado de Ricardo Rotenberg, vice-presidente comercial e de marketing. Fluminense e Vasco não enviaram representantes.

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O interesse de cada um na discussão é diferente. Enquanto o Botafogo, afundado em dívidas, corre contra o tempo e estuda a criação, já em 2020, de uma sociedade de propósito específico (SPE) para gerir o futebol, o Flamengo, com as contas saneadas, nem pensa em largar o modelo associativo.

Nesse cenário, Landim expressou a discordância com um dos termos iniciais do projeto trazido à pauta por Rodrigo Maia. Na visão do Fla, a carga tributária daqueles que seguirem no modelo associativo (sem fins lucrativos e, portanto, livres de vários impostos) não pode ser equiparada aos que migrarem para o formato empresarial.

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Na visão inicial dos autores do projeto, cuja relatoria na Câmara está nas mãos do deputado federal Pedro Paulo (DEM-RJ), a equiparação da carga tributária tem como objetivo tornar o clube-empresa um alvo tão atraente para investimentos quanto os do modelo associativo. Mas tanto Pedro Paulo quanto Maia estão aberto para discussões.

Outro item em que não há consenso diz respeito à tomada de decisão do clube-empresa. Mario Celso Petraglia, presidente do Conselho Deliberativo do Athletico-PR, por exemplo, entende que o controle acionário não pode passar para os futuros investidores.

Mas se há um ponto que une os clubes é o pressuposto de que a mudança de modelo jurídico não pode ser obrigatória. Um ato compulsório geraria questionamentos sobre a constitucionalidade do projeto.

Principais pontos do projeto
Dirigentes de alguns dos principais clubes brasileiros estavam na reunião com Rodrigo Maia
Rodolfo Landim
Andrés Sanchez
PRESIDENTE DO FLAMENGO
PRESIDENTE DO CORINTHIANS
Nelson Mufarrej
José Carlos Peres
PRESIDENTE DO BOTAFOGO
Estimular a migração dos clubes do modelo sem
Novo refinanciamento de dívidas fiscais, com um
fins lucrativos para o modelo empresarial, com
abatimento de até 50% do valor devido. Prazo de
tributação condizente.
20 anos para quitação.
Tributação equiparada entre clube
Criação de um fundo abastecido por todos os
associativo e clube-empresa.
clubes com objetivo de eventualmente resgatar
clubes à beira da falência.
Fim dos direitos trabalhistas para jogadores
com salário maior do que R$ 10 mil.
Permissão para que os clubes, já
como empresas, entrem em regime
de recuperação judicial. As dívidas
do clube associativo passariam a
ser da empresa, que poderia
renegociar os débitos.
Aumento do mecanismo de solidariedade
nacional de 5% para 10%.
Principais pontos do projeto
Dirigentes de alguns dos principais clubes brasileiros estavam na reunião com Rodrigo Maia
Rodolfo Landim
PRESIDENTE DO FLAMENGO
Nelson Mufarrej
PRESIDENTE DO BOTAFOGO
Andrés Sanchez
PRESIDENTE DO CORINTHIANS
José Carlos Peres
PRESIDENTE DO SANTOS
Estimular a migração dos clubes do modelo sem
fins lucrativos para o modelo empresarial, com
tributação condizente.
Tributação equiparada entre clube associativo
e clube-empresa.
Permissão para que os clubes, já como empresas,
entrem em regime de recuperação judicial. As
dívidas do clube associativo passariam a ser da
empresa, que poderia renegociar os débitos.
Novo refinanciamento de dívidas fiscais, com um
abatimento de até 50% do valor devido. Prazo de
20 anos para quitação.
Criação de um fundo abastecido por todos os
clubes com objetivo de eventualmente resgatar
clubes à beira da falência.
Fim dos direitos trabalhistas para jogadores
com salário maior do que R$ 10 mil.
Aumento do mecanismo de solidariedade
nacional de 5% para 10%.

Vantagem competitiva

O Flamengo é exceção no cenário atual dos clubes brasileiros e sabe disso. Por esse fato, sente-se à vontade de bater o pé em relação a alguns termos. Depois do papo em Brasília, dirigentes rubro-negros debateram a estratégia para o encontro de hoje, na CBF. Nos bastidores, os cartolas batem na tecla de que o Fla não pode perder as vantagem de ter ter feito o “dever de casa” contábil nos últimos anos.

Os clubes que estão no aperto financeiro, assim como o Botafogo, enxergam uma chance de ouro de regularização das finanças. Até por conta disso participam da discussão dirigentes de clubes da Série B.

Por parte da CBF, o discurso por ora é de gerar um fórum de discussões para um entendimento entre as partes. O interlocutor em nome da entidade tem sido o secretário-geral Walter Feldman, que recebeu visitas recentes do próprio Maia e de Pedro Paulo.

Segundo o presidente da CBF, Rogério Caboclo, não há intenção em pegar uma carona e inserir itens que aliviem os tributos da entidade.

— A CBF apoia a ideia, desde que isso não seja feito de maneira compulsória. O clube-empresa é bem-vindo dentro do conceito de futebol profissional. Agora, vai depender da proposta que vier. A CBF não terá nenhum benefício e nenhum prejuízo. A realidade dos clubes é que pode mudar bastante — disse Caboclo.

Fonte: O Globo