Desabafo de Braz sobre "caso Tondela" expõe novo capítulo de guerra fria nos bastidores do Flamengo

Uma resposta incisiva que começou com "não vou falar sobre o assunto" e diz muito mais sobre um antigo conflito político no Flamengo do que o que foi perguntado.

Marcos Braz não se privou de fazer questionamentos ao projeto que prevê parceria com o Tondela, de Portugal. Comportamento que soou internamente muito mais como um recado para o vice de finanças, Rodrigo Tostes, do que explanação sobre o assunto.

"Esse assunto foi irritante. No meio de uma janela e ter que falar de Tondela. Estou desde os meus oito anos no Flamengo. Já ouvi e vi de tudo. Não vou falar desse assunto. Primeiro que o presidente Landim nunca tocou nisso comigo, e tem um outro ponto: se o Flamengo de fato for ao mercado e quiser se associar a outro clube, botando dinheiro ou não, porque o Flamengo tem muito ativo que não é dinheiro, isso precisa passar nos conselhos do Flamengo", disse Braz. (Veja no fim desta reportagem a declaração completa)
Marcos Braz deu longa resposta sobre o caso Tondela na segunda-feira — Foto: Alexandre Vidal/Flamengo
1 de 5 Marcos Braz deu longa resposta sobre o caso Tondela na segunda-feira — Foto: Alexandre Vidal/Flamengo

Marcos Braz deu longa resposta sobre o caso Tondela na segunda-feira — Foto: Alexandre Vidal/Flamengo

Não é de hoje que os vices de futebol e de finanças caminham em direções distintas. É como se fosse um novo round do conflito entre Ninho do Urubu e Gávea, que já teve BAP como antagonista e agora tem em Tostes a figura que bate de frente com Braz. Guerra fria que vem desde o início da gestão Landim.

Há algum tempo o vice de futebol se vê como alvo do trio BAP, Tostes e Gustavo Oliveira, vice de comunicação e marketing, e os confrontos geralmente se dão mais de maneira velada do que direta. O episódio Tondela, que tem o vice de finanças como principal incentivador nos bastidores, é só mais um.

A resposta de quase três minutos de Marcos Braz para a pergunta "o Tondela está perto?" repercutiu nos corredores da Gávea e a percepção coletiva é de que foi exagerada. Dois pontos chamaram a atenção de maneira especial nas resenhas sobre o assunto.

O primeiro foi o fato de Braz nunca sequer ter se manifestado fosse no sentido de questionar ou no de se posicionar sobre a pauta. Após a coletiva de apresentação de Andreas Pereira, houve uma reunião de mais de uma hora do conselho de futebol sobre os rumos para reta final de temporada e planejamento para 2022, e o tema Tondela foi ignorado.

Outro ponto foi o fato de seu fiel escudeiro, Bruno Spindel, estar a par de tudo o que está acontecendo e Braz indicar não ter conhecimento mais profundo do andamento. O vice de futebol tratou o assunto como irritante e disse que "Landim nunca tocou nisso comigo".

Até agora Tostes não deu declarações públicas sobre o projeto em Portugal. A tendência é de que isso só aconteça após aprovação no Conselho, em setembro, e após o contrato estar assinado.

Rodrigo Tostes com Landim. VP de finanças voltou ao Flamengo em fevereiro de 2020 — Foto: Reprodução
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Rodrigo Tostes com Landim. VP de finanças voltou ao Flamengo em fevereiro de 2020 — Foto: Reprodução

A relação entre Braz e Tostes começou a piorar no episódio da polêmica renovação de contrato de Diego Alves, no final de 2020. Na ocasião, o vice de finanças foi firme ao rechaçar o acordo inicial costurado por Bruno Spindel e deu início a um cabo de guerra que terminou com o goleiro flexibilizando até que o novo vínculo fosse definido.

A disputa pela autonomia nas ações do futebol continuou com o pulso firme na liberação de verba mantido na primeira janela de transferências, quando o Flamengo contratou apenas Bruno Viana. O clima esquentou novamente no episódio Rafinha.

Camisa 1 do Tondela, nas cores verde e amarela — Foto: Divulgação
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Camisa 1 do Tondela, nas cores verde e amarela — Foto: Divulgação

O próprio lateral-direito declarou que Marcos Braz e Bruno Spindel demonstraram interesse na contratação e colocaram a responsabilidade dos rumos da negociação no departamento financeiro. Paralelamente a isso, houve críticas do departamento de futebol ao desempenho da vice-presidência de marketing na busca por patrocínio. No fim das contas, o jogador foi para o Grêmio.

A guerra fria continuou internamente e não foram poucas as vezes que Braz manifestou o incômodo sobre a interferência de dirigentes de fora do futebol nas tomadas de decisão da pasta.

- A gente vai conseguir fazer as contratações que achar importante para o Flamengo. Tenho muita fé nisso, independente de um vice-presidente ou outro achar que tem que apertar mais aqui ou ali - disse em entrevista ao podcast GE Flamengo em março.

Questionado na ocasião se era uma indireta para alguém por conta do velho conflito entre Ninho e Gávea, Braz disse:

- Passei da fase de ter preocupação com isso.

A cobrança pela geração de receitas antes de cogitar ir ao mercado, por sua vez, sempre foi algo que gerou ruído entre as sedes no Flamengo. O departamento de futebol se sentia exposto ao ser cobrado por saídas como as de Natan e Gerson, enquanto tratava-se de uma urgência para o cumprimento do orçamento.

Marcos Braz e Bruno Spindel, Flamengo x Fluminense — Foto: Marcos Ribolli / ge
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Marcos Braz e Bruno Spindel, Flamengo x Fluminense — Foto: Marcos Ribolli / ge

Além disso, havia desconforto por não existir contrapartida. Por mais que tenha feito milhões com vendas como as já citadas e a de Rodrigo Muniz, a torneira segue fechada para maiores investimentos. Nesta janela, a boa relação com Giuliano Bertolucci, que tem ótima entrada em gigantes europeus, mais uma vez fez a diferença.

Andreas Pereira e Kenedy, por exemplo, chegam praticamente a custo zero e as tratativas com o Lyon por Thiago Mendes esbarraram justamente na torneira fechada. Do lado da Gávea, a postura é irredutível, o que muitas vezes incomoda. Não à toa, o sucesso na empreitada com "bolso vazio" foi tão comemorado pela dupla do futebol.

Acima do cabo de guerra, Rodolfo Landim conduz a situação com naturalidade e chama para si a responsabilidade da maioria das decisões, evitando que os conflitos cheguem a momentos mais agudos dos debates. Faltando cerca de quatro meses para as eleições, o favoritismo é grande no caminho para a reeleição e não é um problema que já dura quase três anos que tiraria o sono do presidente.

Confira a íntegra da resposta de Braz sobre o caso Tondela

"Esse assunto foi irritante. No meio de uma janela e ter que falar de Tondela. Estou desde os meus oito anos no Flamengo. Já ouvi e vi de tudo. Não vou falar desse assunto. Primeiro que o presidente Landim nunca tocou nisso comigo, e tem um outro ponto: se o Flamengo de fato for ao mercado e quiser se associar a outro clube, botando dinheiro ou não, porque o Flamengo tem muito ativo que não é dinheiro, isso precisa passar nos conselhos do Flamengo. Passar no conselho de administração, no conselho deliberativo, e vou fazer até uma sugestão, que façam uma comissão para saber se é possível, se é bom, qual o caminho, qual o estilo de negociação e associação para depois a gente falar.

Não quero falar de Tondela, não quero falar de nada, porque respeito e muito os conselhos deliberativo e de administração do Flamengo. Tem os grandes beneméritos, que precisam ser ouvidos. Isso não tem nada a ver com inviabilizar, nada tem a ver com não gostar. Só acho que tem ritos e caminhos a seguir e são decisões que as pessoas não têm noção que não é só a parte financeira.

Por que é em Portugal e não na Bélgica, por exemplo? Está cheio de clube lá na Bélgica que são de outros grupos do mundo inteiro. Por que não é na Espanha? Então, isso primeiro tem que passar pelos conselhos. Acho que tem que ser feita uma comissão para fazer um estudo, planejamento, e depois se decidir quem será o parceiro. Claro que isso tudo é uma sugestão minha, mas quem manda é o presidente Rodolfo Landim".

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Fonte: Globo Esporte