Tive a honra de mediar a abertura do Café Literário, que completa 25 anos como uma das atrações da Bienal do Livro. O tema era “A paixão pelo futebol”, e o modelo lembrava o da “Resenha Facit”, a primeira mesa-redonda sobre futebol da TV brasileira, com um torcedor de cada grande time do Rio: Pedro Bial (Fluminense), Hélio de la Peña (Botafogo), João Carlos Éboli (Vasco) e Ruy Castro, o homenageado desta edição da Bienal (Flamengo).
A diferença é que eles não estavam ali no papel de comentaristas esportivos, mas no de autores de quatro plaquetes (livros de até 48 páginas) escritas para um evento realizado no ano passado pela Associação Brasileira de Letras, na qual Ruy ocupa a cadeira número 13. Nos textos e nas pitadas de inteligência, bom humor e rivalidade do bate-papo que durou o tempo de uma partida, encontrei elementos que me fizeram pensar em como cada torcida vai encarar a Copa do Mundo de Clubes.
Ruy Castro fez uma coletânea de crônicas curtas — com uma capacidade de fechar o raciocínio que, como autor desta coluna, invejei muito — e escolheu como título “É o meu maior prazer”, trecho do hino. Ao responder a uma pergunta sobre a sensação de conquistar a Libertadores, respondeu com outra: “Qual delas?” Não há como escapar desse complexo de superioridade na expectativa dos rubro-negros para o Mundial. O Flamengo foi o primeiro carioca campeão continental, ainda é o único campeão mundial e, desde 2019, se tornou mais rico e poderoso do que os rivais. Para quem sempre se orgulhou de ter a maior torcida, a humildade não é uma opção.
Mas o último clube da mui leal e honrada cidade de São Sebastião a conquistar a glória eterna foi outro. “O cinturão ainda está lá em casa”, provocou Hélio de la Peña, que usou a expressão “Tempo de Botafogo”, celebrizada pela torcida na incrível campanha de 2024, como título. O texto começa com relatos de sua história de torcedor e termina registrando o surgimento de um novo tipo de alvinegro, livre do pessimismo, confiante na vitória mesmo quando seu time começa uma final com um a menos, mas ainda supersticioso: “Agora a gente acha que precisa ter um jogador expulso para ganhar os jogos mais difíceis”, brincou Hélio. E haja dificuldade para quem caiu num grupo com dois europeus.
Pedro Bial também vem de uma conquista recente de Libertadores, testemunhada no Maracanã com os filhos. Ele abre “O meu Fluminense” dizendo, em tom dramático que sugere ser ouvido na voz de outro tricolor famoso, Nelson Rodrigues, que o clube salvou sua vida — porque o futebol tirou o pai do vício das apostas em cavalos e deu à família uma vida melhor. Daí para a frente, tudo o que veio (incluindo uma carreira de jogador de basquete nas divisões de base tricolores) foi lucro, como será passar de fase para quem não é rico, nem SAF.
O advogado João Carlos Éboli, pai de Carlos Eduardo, jornalista das rádios Globo e CBN e meu companheiro de bancada no “Redação Sportv”, não terá para quem torcer na Copa do Mundo. Mas o autor de “Vamos todos cantar de coração” garantiu que não vai secar ninguém. Seu amor ao clube e o orgulho da história cruz-maltina lhe bastam. Já que me falta a capacidade do Ruy para fechar a coluna com frases certeiras, recorro a uma que Éboli usou ao responder a uma pergunta sobre rivalidade: “Eu poderia encerrar dizendo Vasco, mas prefiro dizer paz.”