Passageiro de uma montanha-russa de emoções em 2024, Gabigol volta a campo hoje, 16h, pelo Flamengo, contra o Atlético-MG, no jogo de volta da final da Copa do Brasil, como o possível grande herói em caso de título do time carioca na Arena MRV. Os dois gols dele e a participação no outro, marcado por Arrascaeta, deram a vitória por 3 a 1 à equipe de Filipe Luís na ida, no Maracanã, e a vantagem de o Flamengo poder perder por até um gol em Belo Horizonte para levar a taça.
Mesmo em uma temporada apagada em campo e recheada de polêmicas, e que pode ser sua última pelo clube, Gabigol seguiu com o apoio de grande parte da torcida rubro-negra. A explicação mais óbvia para tal sentimento são os históricos feitos esportivos do centroavante. Foram dele os gols dos títulos das Libertadores de 2019 — que tirou o Flamengo de uma fila de 38 anos desde a conquista anterior, em 1981 — e 2022.
Profissionais da psicologia apontam que é natural que a irracionalidade da paixão causada pela memória afetiva das conquistas fale mais alto do que qualquer momento ruim.
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— Essa relação tende a ser muito passional. Num dia a pessoa é amada, no outro é odiada. Mas acredito que existe um sentimento de gratidão por todas as conquistas em que ele teve um papel decisivo. Essa história jamais será apagada — analisa Raphael Zaremba, professor de psicologia do esporte da PUC-Rio.
Além dos feitos nos gramados, há algo mais intrínseco também capaz de explicar esse amor.
— O Gabigol pegou muito o espírito irreverente da torcida do Flamengo. Ele é boquirroto, fala mesmo, é marrento... A torcida do Flamengo se identifica com esse tipo de comportamento e ele fez essa leitura — aponta Maurício Neves de Jesus, historiador e escritor de diversos livros sobre a história do clube.
De acordo com Neves, a história do Flamengo é repleta de ídolos “polêmicos”, que cultivaram algumas desavenças com a torcida rubro-negra:
— A relação de idolatria no Flamengo raramente é tranquila. Zico e Júnior conseguiram porque, além de serem gigantes, só saíram para o exterior e voltaram para encerrar a carreira no clube. Geralmente a relação se torna turbulenta quando esses jogadores vão para outros times, como foi com Zizinho, Dida, Bebeto.
Acostumado a aparecer em finais — são 16 gols em 17 partidas pelo Flamengo —, Gabigol voltou a demonstrar sua versão decisiva no momento certo da temporada. A fase faz o torcedor reacender a idolatria. Mas antes mesmo de Gabigol dar indícios de que pode voltar a ser quem o flamenguista estava acostumado, já havia boa parcela da torcida que seguia defendendo o principal ídolo da atual geração.
Sem espaço sob o comando de Tite — foram apenas 871 minutos em 28 partidas no ano —, Gabigol só ocupou os holofotes em momentos de polêmica até a chegada de Filipe Luís. O atleta passou cerca de um mês suspenso por tentativa de fraude em exame antidoping. Como resposta, torcedores levantaram bandeiras em homenagem ao atacante na final do Carioca e levaram adesivos com mensagens de apoio. Após o retorno, uma foto vazada do até então 10 usando uma camisa do Corinthians fez com que ele perdesse a numeração, tornando-se assim o 99, e estremeceu a relação, que chegou a ganhar status de “prestes a ser encerrada” com as falas de dirigentes e do empresário do atleta de que o contrato não seria renovado.
— Para mim é muito simples: enquanto ele estiver no Flamengo, será um dos nossos e terá todo o meu apoio. Em 2019 ele não desistiu, 2020 e 2022 também não, então não vai ser agora que vou desistir dele — afirma Pedro Amaral, produtor audiovisual de 22 anos que tem no pulso direito uma tatuagem com a silhueta de Gabigol em sua comemoração tradicional. — Meu desejo é que ele fique no Flamengo até a aposentadoria. O que ele fez não vai ser apagado por uma temporada abaixo daquilo que ele sempre nos entregou. Se for para ser a “última dança”, então que seja numa linda coreografia. Os jogadores passam, mas a gratidão e a idolatria serão eternas.