“Foi gol do homem frio?” perguntou um dos garotos da base que assistia ao treino dos profissionais do Nova Iguaçu na beirada do campo. Sim, Carlinhos recebeu a bola na pequena área, de frente para o goleiro, e não titubeou ao bater no canto. Com ele, tem sido assim nos jogos à vera também, frieza no momento chave. Jogou cinco partidas no ano e fez cinco gols , que estão ajudando a equipe do Nova Iguaçu a brigar no topo da tabela e a mantê-lo na artilharia do Campeonato Carioca até aqui.
Formado no Corinthians, Carlinhos fez parte da mesma geração de Malcom e Guilherme Arana. Ao deixar a equipe paulista, o atacante rodou por clubes de menor investimento ao redor do Brasil. O desempenho no Audax-RJ, em 2023, chamou a atenção do Nova Iguaçu que conseguiu contratá-lo para esta temporada.
Nesta edição, fez gols no Flamengo - de cavadinha -, Botafogo e os dois da vitória sobre o Vasco. Ele não participou da única derrota do Nova Iguaçu na competição, para o Fluminense. Alto, com força física e bom finalizador, tem dado trabalho às defesas.
Carlinhos rodou o Brasil e viveu altos e baixos na carreira. Mas o ano de 2024 começou com pé direito, ele disse. Não só pelo bom momento do Nova Iguaçu ou pela frieza na pequena área. Foi o calor no coração que lhe permitiu redescobrir o prazer de jogar futebol, com a superação de um momento ruim fora de campo.
Há três anos, Carlinhos recebeu a notícia de que sua mãe, Dona Nilda, sofria de câncer no crânio.
- Em determinado momento, para ir ao jogo eu tinha que desligar o celular com medo de alguma notícia. Quando você vê que pode perder a base, você desmonta - contou o jogador.
Foi necessário interromper por algumas vezes sua carreira e voltar ao interior de São Paulo, onde cresceu, para ajudar a cuidar dela. Dona Nilda teve de passar por uma cirurgia delicada no crânio e chegou a perder a visão. Isso não a impediu de acompanhar os passos do filho.
- Ela está ouvindo os jogos e meu pai passa os detalhes para ela.
A esperança de Carlinhos e de sua família voltou com a evolução do tratamento. A paz para jogar futebol, também. De certa forma, o bom momento do filho na carreira tem dado à Dona Nilma motivos para sorrir.
Antes de terminar a entrevista, o atacante fez um pedido ao repórter:
- Espero que essa matéria chegue nela. Fala que eu amo ela, é um prazer enorme ser filho dela. É uma pessoa que lutou por mim e meus irmãos. Graças a Deus ela está podendo ouvir. Espero que mais pra frente Deus cure ela e ela possa ver.
O momento do Nova Iguaçu não se resume à boa fase de Carlinhos. O atacante tem executado as boas chances criadas por um grupo que demonstra padrão de jogo sólido, transições rápidas e contundência para marcar. A equipe da Baixada Fluminense ocupa a terceira posição, com 11 pontos, e está à frente dos elencos milionários de Flamengo e Vasco.
Viralizaram nas redes sociais as imagens da construção do último gol na vitória por 2 a 0 sobre os reservas do Vasco. O lance começou na defesa, foi para a direita, voltou para a zaga, correu para a esquerda até cair nos pés de Bill, que acelerou, tabelou com Carlinhos e serviu a Lucas Campos, que marcou.
- Sequência difícil. A gente pegou quatro grandes em cinco jogos, então procuramos trabalhar bastante. Claro que não está nada definido ainda, mas está tudo muito bem encaminhado e a gente precisa manter, porque atingir o alto nível, qualquer um consegue, mas se manter é o mais difícil - disse Bill.
O atacante é outro que fez parte da formação na base de um grande clube, o Flamengo. Foi parceiro de Vinícius Jr. e Lincoln na linha de frente. Mas deu seus primeiros passos no futebol mesmo no Nova Iguaçu, aos 12 anos.
Do Rubro-Negro, o atacante se transferiu para o Dnipro, da Ucrânia, mas a guerra do país europeu com a Rússia, fez com que ele rodasse por outros clubes do Brasil, sem perder o vínculo com o Nova Iguaçu.
- O Nova Iguaçu é a nossa casa. Dentro dessa situação de guerra que a gente tá vivendo na Ucrânia, eu vim pra cá pra manter a minha forma física. Eu pedi ao presidente pra que pudesse me ajudar nessa situação. Eu estava precisando jogar, minutar e aparecer. Calhou também do clube precisar também. Esse casamento está dando certo.
Um dos trunfos do Nova Iguaçu é a capacidade de revelar jogadores, como o atacante Deivid, que se destacou pelo Corinthians e Santos. Ao todo, sete jogadores do atual elenco se desenvolveram na base do Nova Iguaçu. Lucas Campos, autor do gol descrito acima é outro que concluiu a formação na base do Botafogo e retornou recentemente ao Nova Iguaçu.
O time é comandado por outra prata da casa. O técnico Carlos Victor está há 32 anos no clube. Primeiro, foi jogador. Se aposentou do campo, assumiu a prancheta e passou por várias categorias da base até chegar ao time profissional. Teve idas e vindas, mas é um homem de confiança da direção do Nova Iguaçu.
O treinador se inspira em Bernardinho, o técnico bicampeão olímpico pela seleção brasileira de vôlei, para extrair o melhor de seus atletas. Descreve a maneira de seu time jogar como um “estilo Brasil”.
- Eu proponho que sejam responsáveis, prudentes e que sejam alegres, sem medo de errar, que tenham confiança de arriscar. Por isso talvez esteja essa repercussão, por acreditar, sem medo de ser feliz - afirmou.
Carlos Victor e seus jogadores estão felizes com o momento do time, mas pregam cautela. Afinal, ainda restam cinco rodadas até o fim da primeira fase do Carioca e a tabela está embolada. Em busca de manter a boa fase, o Nova Iguaçu enfrenta o Madureira, nesta quinta-feira, no Laranjão.