"Eu sou cara de pau. Vou pegar carona com ele. Eu vou pedir, o não eu já tenho".
Numa chuvosa quinta-feira, o rubro-negro Arthur Mendonça, de 26 anos, foi à porta do Ninho do Urubu para tentar fotos e autógrafos de seus ídolos. Mal sabia ele que realizaria uma série de sonhos num intervalo de 12 dias.
Arthur por causa de Zico, o flamenguista teve a cara de pau necessária para quebrar a distância entre fã e ídolo. Prometeu a uma torcedora que estava em frente ao CT naquela quinta-feira que faria pedido inusitado ao novo técnico do Flamengo , àquela altura em seu terceiro dia de clube. Dito e feito:
- Era a segunda vez que eu ia (ao Ninho), e não parou muita gente. Pararam David Luiz, Éverton Ribeiro, Bruno Henrique, Wesley e o Tite. Só que quando o Tite parou já eram quase 20h. E eu falei :"às 20h eu vou embora até porque está começado a chuviscar".
- Eu até brinquei com uma menina, a única pessoa que estava comigo lá na porta do CT, e disse: "Se o Tite parar e for um dos últimos a saírem, eu sou cara de pau. Vou pegar carona com ele. Vou pedir, o não eu já tenho" .
O "sim" de Tite
O "não" que Arthur garantia já ter consigo ficou só no pensamento. Com jeitinho e educação, abordou Tite e o auxiliar Matheus Bachi a fim de encurtar os mais de 35 quilômetros que separam o Ninho do Urubu da Muzema, comunidade que fica localizada também na Zona Oeste do Rio de Janeiro.
Permissão concedida, e o rubro-negro, incrédulo, sentou no banco de trás.
- O Tite parou, foi super gentil e atencioso. Atendeu a mim e à menina que estava comigo. Eu disse: "Tite, com licença, você mora na Barra, não mora?". E ele respondeu que sim. O Matheus (filho do treinador) estava dirigindo, e o Tite, no carona.
- Eu expliquei que morava na Muzema, que fica bem distante do Ninho, e perguntei: "Seria muito abuso meu pedia uma carona a vocês"?. Ele respondeu: "Não, pode entrar". Eu nem acreditei quando entrei no carro junto com eles. Não sabia se ficava quieto ou conversava. Comecei a fazer algumas perguntas.
Papo de 15 minutos rende um presentão
Como Matheus Bachi tinha um compromisso no Recreio dos Bandeirantes, Arthur não pôde seguir até a Barra da Tijuca, mas os 15 minutos de carona foram suficientes para plantar uma sementinha que resultaria na impensável realização de sonhos 12 dias depois.
Revelou a Tite e Matheus que é grande fã de Gabigol e contou-lhes de uma tatuagem que tem na perna com a imagem do atacante segurando a taça da Libertadores de 2019. Perguntou ao treinador se ele teria como conseguir com alguém do Flamengo uma lembrança alusiva ao camisa 10.
- Dentro do carro, comentei essa situação com o Tite, e ele me disse que não poderia chegar diretamente no Gabriel. Ele pegou meu contato, anotou nome e sobrenome e disse que ia passar para o Fabinho, gerente de futebol.
Arthur desceu no Recreio dos Bandeirantes e, após uma fortíssima chuva, chamou um aplicativo de mototáxi e deslocou-se para a Muzema sem saber se teria alguma resposta nas semanas seguintes.
"Missão dada, missão cumprida"
Como tem alinhado todos os processos com Fabinho Soldado, Tite deu a missão ao gerente de futebol de conseguir a tal lembrança para Arthur. Fabinho pensou numa camisa oficial como presente ideal e pediu para Gabigol autografá-la e gravar um vídeo com dedicatória exclusiva.
Pedidos aceitos, e a surpresa veio na noite de sexta-feira, quando Arthur recebeu a convocação de um funcionário do Flamengo para ir buscar a camisa no CT. O convite veio acompanhado de uma mensagem do maior ídolo que tem dentro do Rubro-Negro.
- Ontem (sexta) em casa, às 19h, chega uma notificação de um número desconhecido. Era um rapaz do Flamengo falando que o Fabinho tinha coordenado a situação, mandou o vídeo do Gabigol me dando a camisa e me perguntou quando eu poderia buscar.
- Fiquei igual a uma criança em casa. Sou apaixonado pelo Flamengo , tenho duas tatuagens, essa com o Gabigol e o Jorge Jesus, e um CRF na panturrilha. Sempre foi um sonho muito grande conhecer o Gabigol, e sei que é difícil, ainda mais não sendo criança.
- Quantas pessoas não queriam ter esse privilégio de ter uma foto com o treinador que dirigiu a seleção brasileira por seis anos e que hoje está no Flamengo , um cara renomado e respeito? E, poxa, ganhar uma camisa assinada pelo Gabigol? Essa vai virar quadro.
O agradecimento e a lição
Arthur lançou mão de eufemismos para definir a "cara de pau" que deu certo. Falou em "resiliência" e "perseverança". Fato é que, despretensiosamente, foi ao Ninho em busca de pequenos sonhos e acabou realizando algo muito maior do que esperara.
- Lição que tiro parece meio clichê de se falar: se a gente tem um sonho e se a paixão como torcedor faz bem, corre atrás. Por causa da minha perseverança e resiliência, consegui uma carona com o técnico do Flamengo e um histórico técnico da seleção brasileira. Além da carona e da experiência, consegui, graças a ele (Tite), viabilizar um presente do maior ídolo que eu vi jogar no futebol. Essa é a lição que fica: de insistir nas coisas que deseja e ter sempre o pensamento positivo porque dá para chegar, sim.
Arthur fez questão de exaltar Tite e Matheus Bachi na questão das relações humanas, algo que vem sido exaltado por todos dentro do Ninho do Urubu.
- Queria agradecer ao Tite e ao Matheus. Foram sensacionais comigo. Se não fossem eles, eu não teria conseguido. Queria agradecer pelo trato que tiveram comigo como seres humanos e pelo caráter de ambos. Deram uma carona para um desconhecido, e isso para mim foi muito bacana porque eles não teriam por que fazer isso, mas me trataram bem o tempo todo.
- São pessoas que olham no olho da gente. Desejar um ótimo início de trabalho e que dure bastante tempo à frente do Flamengo . O lugar desse time é lá em cima. Buscar no ano que vem o tetra da Libertadores para nós. Vamos papar tudo, ainda tenho um fiozinho de esperança no Brasileiro, vamos ver se dá, mas é difícil. No ano que vem vamos para cima do Brasileiro e da Copa do Brasil, que ficou engasgada também. Obrigado, Tite - finalizou Arthur, auxiliar de produção de massa folhada numa empresa de salgadinhos.
Arthur dessa vez não voltou para casa de carrão e nem ao lado de figuras internacionais. Deixou o Ninho do Urubu de ônibus da linha 810 (Pontal/Taquara), mas cheio de autógrafos, duas camisas do Flamengo , e um sábado inesquecível para contar aos filhos e netos.
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