Ufa. Acabou. Finalmente, os Estaduais ficaram para trás. Agora, para Flamengo e Fluminense, basta entrar em campo no meio desta semana para decidir a vida na Libertadores e, a partir do próximo fim de semana, alternar as 38 rodadas do Brasileiro com os mata-matas das competições internacionais e da Copa do Brasil. Para Vasco e Botafogo, é só focar na Série B mais competitiva dos últimos anos. (Aviso 1: a abertura desta coluna contém ironia).
Na vida real, acabou, mas nunca fica mais tranquilo. Porque sempre há um campeonato a priorizar. E quem escolhe um se compromete com o sucesso nele sem ter de deixar de arcar com as consequências do fracasso no que foi abandonado. E ninguém, nem o milionário Flamengo, tem elenco para brigar pelo título em todas as competições — não sem pôr em risco a saúde física de seus jogadores e mental de seus treinadores.
O que chegou ao fim, na verdade, foi a primeira fase de questionamentos. Até o fim desta semana, todos os técnicos com a mistura explosiva de implicância da torcida e resultados aquém do esperado já terão sido demitidos, para que os clubes possam se adaptar ao novo limite do regulamento. Os que sobreviverem e os novos contratados terão de se adaptar a uma nova rotina de jogos toda quarta, todo domingo (e suas variantes). Além disso, claro, tentar explicar por que estão priorizando um ou outro — e não conseguir, se o resultado não acompanhar a justificativa. Enquanto isso, os auxiliares permanentes ficam no aquecimento, prontos para tirar o colete. (Aviso 2: esta não é mais uma coluna em defesa da tese de que treinadores de futebol formam uma categoria que deveria ser à prova de demissão).
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Esta é, sim, uma coluna sazonal. Porque todo ano chega uma hora em que a gente tem de discutir os Estaduais. O futebol brasileiro, que começou regional e foi se tornando nacional, tentou chegar a uma solução conciliatória que desafia o calendário: o ano continua tendo 52 semanas, mas nós quisemos importar o modelo europeu de campeonatos de pontos corridos com 20 clubes, injetar dinheiro na Copa do Brasil, participar da farra da Conmebol nas competições sul-americanas (que este ano nos apresentaram La Guaira, Guabirá, Always Ready e outros times que ainda não estavam prontos para sair do âmbito regional) e, claro, manter a tradição das rivalidades locais à custa de no mínimo 16 datas.
Sempre que penso nisso, me lembro do empregado da fazenda do pai de uma amiga, que veio de Minas para Copacabana pela primeira vez. Quando o patrão perguntou o que ele tinha achado, meu conterrâneo olhou para cima, viu os prédios de muitos andares; olhou para baixo, viu as ruas apertadas. E concluiu: "É, doutor... Não cabe!"
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A diferença é que em Copacabana ninguém é cobrado pelas escolhas que faz: ficar em casa, descer para a rua ou ir à praia? No futebol, discutimos com a maior naturalidade se o certo é optar por um ou outro campeonato. Mas não debatemos o sistema que obriga a soluções que não podem ser salomônicas: quarta ou domingo? Estadual ou Libertadores? Tem público para tudo; e o torcedor quer levantar todas as taças. O que falta é perna e saúde para quem tem de entrar em campo; e estabilidade no emprego para quem está à beira, tomando as decisões.